14 de novembro de 2025
Politica

Ministério das Comunicações cancela renovação da licença de rádio que faz oposição a Alcolumbre

BRASÍLIA – O Ministério das Comunicações revogou a renovação da licença de radiodifusão da Fundação Cultural e Assistencial Água Viva, sediada no Amapá. A entidade é controlada por adversários locais do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), que indicou Frederico de Siqueira Filho para o comando da pasta.

Desde 2016, a emissora pleiteava a renovação da outorga, que lhe garantiria direito a operar até maio do ano que vem. O ministério passou anos sem tomar uma decisão, enquanto a rádio operava em situação precária. Em fevereiro do ano passado, a pasta finalmente renovou, mas o ato foi anulado nesta semana.

Rádio que faz críticas ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, perde renovação no Ministério das Comunicações
Rádio que faz críticas ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, perde renovação no Ministério das Comunicações

A justificativa é de que a pasta já decidiu pela cassação da licença. Essa questão, no entanto, está em disputa na Justiça Federal de Brasília, que precisa confirmar se a sanção contra a emissora seguiu princípios legais e da Constituição.

Procurado, o ministério disse que a entidade “foi flagrada diversas vezes executando programação irregular”.

Alcolumbre afirmou, por meio de nota, que não exerce qualquer participação ou influência na decisão. “A medida é de competência exclusiva do Ministério das Comunicações, que conduz o processo com base em critérios técnicos e dentro dos trâmites legais. Qualquer tentativa de associar o presidente do Senado à decisão administrativa é equivocada e sem fundamento”, diz manifestação da assessoria de Alcolumbre.

A Forte FM, como é conhecida a rádio, faz oposição a Alcolumbre e ao governador do Estado, Clécio Luis, seu aliado. O controlador da rádio é o ex-deputado federal Valdenor Guedes, derrotado por Alcolumbre na eleição para senador em 2022 e aliado de Furlan.

A emissora tinha autorização para operar somente na capital, Macapá, uma ilha de poder da oposição ao parlamentar. O prefeito da cidade, Antônio Furlan (MDB), foi reeleito em primeiro turno com 85% dos votos e frustrou as pretensões de Josiel Alcolumbre, irmão do senador, que desistiu de concorrer ainda na pré-campanha.

Conforme revelou o Estadão, o ministério já havia determinado a retirada do ar da estação em maio, quando concluiu processo administrativo para puni-la por promover “proselitismo político” e descumprir normas da outorga ao transmitir propagandas e conteúdos religiosos, em vez de programação educativa.

Mas pela legislação, a efetivação da medida depende de decisão judicial. Em setembro, a juíza Pollyanna Kelly Maciel Medeiros Martins Alves, da 1ª Vara Federal Cível do Distrito Federal, negou liminar proposta pela pasta para antecipar a derrubada da rádio e sustentou que precisava de tempo para analisar a validade da sanção à luz da Constituição.

“A veiculação de músicas, desde que inserida em contexto educativo ou cultural apropriado, pode perfeitamente integrar programação educativo-cultural. Do mesmo modo, programas de conteúdo religioso podem assumir caráter educativo quando voltados à formação moral e cívica da população, conforme previsão do próprio artigo 67 do Regulamento dos Serviços de Radiodifusão”, defendeu a magistrada.

Ela também citou prejuízo que seria causado à população ao se interromper a veiculação de informações de interesse público. “A natureza do dano potencial – privação do acesso à informação e ao entretenimento – assume caráter extrapatrimonial de difícil mensuração e reparação.”

Controladores da rádio afirmam que, na prática a medida os coloca na ilegalidade e pode antecipar as consequências de uma decisão judicial que ainda não foi proferida e que poderia ser desfavorável à pasta.

Em nota, o ministério disse que, apesar da revogação, o processo de renovação continua sob análise.

“A rádio Forte FM pode continuar funcionando pois, de acordo com a legislação brasileira, a outorga continua válida, mesmo fora do prazo, enquanto não é analisado o mérito de um pedido de renovação. A emissora está nessa situação desde 2016.”

No processo em que tenta reverter a sanção, o controlador da Forte FM aponta para tentativa de censura e cita uma sentença anterior que considerou as ações do ministério contra a rádio “um entrave não apenas à livre manifestação do pensamento, mas também à veiculação de informações relevantes para a coletividade”.

Em fevereiro, ele havia conseguido autorização para manter a programação no ar até maio do ano que vem. Segundo a Coordenação de Fiscalização e Monitoramento de Serviços de Radiodifusão do Ministério das Comunicações, a Forte FM se valeu de uma licença restrita a conteúdos de cunho educativo para levar ao ar programação comercial, anúncios publicitários e “proselitismo político” em favor do prefeito.

Uma nota técnica anexada ao processo afirma que os noticiários Forte Notícias e Fala Comunidade, transmitidos diariamente das 7h às 9h e das 17h às 19h, contém “destaque ao prefeito municipal, com exaltações pessoais e realizações”, em vez de informes jornalísticos.

Nota técnica do Ministério das Comunicações cita
Nota técnica do Ministério das Comunicações cita “proselitismo político” como uma das irregularidades cometidas pela rádio Forte FM.

Para sustentar a alegação, o órgão anexou ao processo a transcrição de trecho da programação em que um locutor elogia Furlan ao divulgar a inauguração de uma ponte pelo poder público local.

O restante da grade da Forte FM abarca músicas, cultos evangélicos e um programa realizado em parceria com a Faculdade de Ciências da Amazônia, instituição privada de ensino. Nada disso, segundo o Ministério das Comunicações, se qualifica como programação educativa, definida pela pasta como “transmissão de aulas, conferências, palestras e debates”.

A juíza que analisa o caso considera que a leitura da pasta é controversa e pode ser contestada. Na decisão em que negou a cassação liminar da rádio, ela aponta ainda para a possibilidade de corrigir eventuais desvios em relação da norma em vez de retirar a programação do ar.

“A determinação de adequação progressiva da programação, com estabelecimento de metas e prazos específicos, constitui medida menos restritiva que alcança a mesma finalidade sem comprometer a continuidade do serviço e sem ferir de morte a empresa (pessoa jurídica) e pondo em risco a subsistência de seus empregados e colaboradores”, diz na decisão.

 

 

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