18 de novembro de 2025
Politica

Direito e responsabilidade climática na Amazônia: uma perspectiva judicial para a COP-30

A COP30, realizada em Belém, recoloca a Amazônia no centro do debate climático e exige que o direito deixe de ocupar função meramente declaratória. A dimensão ambiental da crise pede respostas estatais baseadas em normas claras, indicadores verificáveis e mecanismos de responsabilização compatíveis com a escala do dano ecológico.

Os dados de monitoramento, como os do INPE (Prodes), que apontam 5.796 km² de perda de floresta primária no ciclo mais recente, devem ser tratados como evidências jurídicas. Mesmo diante de oscilações percentuais, o volume de degradação permanece elevado. Por isso, metas climáticas precisam ser formuladas com prazos, métricas satelitais e verificações independentes, para que deixem de ser intenções políticas e se tornem obrigações legalmente exigíveis.

Nesse cenário, dois instrumentos internacionais oferecem balizas essenciais. O primeiro é o Consentimento Livre, Prévio e Informado (FPIC), previsto na Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas, que impõe ao Estado e a terceiros o dever de consultar comunidades afetadas antes de projetos que atinjam territórios tradicionais. Não se trata de protocolo simbólico, mas de garantia procedimental e material, que deve integrar licenças ambientais, contratos e financiamentos.

O segundo é o Acordo de Escazú, voltado à democracia ambiental — acesso à informação, participação pública e acesso à justiça. Sua implementação na região amazônica é decisiva para fortalecer transparência e proteger defensores ambientais, reduzindo arbitrariedades sustentadas pela opacidade decisória. Políticas climáticas só terão eficácia se forem juridicamente executáveis.

A experiência recente de fiscalização demonstra que o enforcement é possível quando se combinam tecnologia, inteligência integrada e vontade política. Operações que vinculam concessão de crédito à conformidade ambiental, bloqueiam financiamentos irregulares e aplicam multas robustas mostram que o Estado pode intervir diretamente na cadeia econômica que sustenta o desmatamento ilegal. Esses precedentes devem inspirar modelos multilaterais que articulem due diligence, condicionantes econômicos e métricas claras de resultado ambiental.

Também ganha espaço o movimento jurídico internacional que reconhece direitos da Natureza. Experiências que atribuem personalidade jurídica a rios e florestas demonstram que o ordenamento pode ampliar instrumentos de tutela ecológica sem substituir a responsabilização humana. Trata-se de reforçar a proteção material do ecossistema e viabilizar medidas reparatórias e cautelares com foco em restauração.

Para que a ambição climática se converta em norma interna efetiva, é preciso estabelecer obrigações de clareza e mensurabilidade: avaliações de impacto vinculantes, participação real das comunidades, monitoramento independente, condicionamento de financiamentos à conformidade socioambiental e fundos de restauração provenientes de multas. Prevenção, responsabilização e reparação devem operar como um único sistema.

Cabe ao Judiciário formular padrões interpretativos que deem previsibilidade ao direito ambiental: testes de proporcionalidade ecológica, critérios de valoração do dano, parâmetros mínimos para planos de restauração e revisão de concessões. Essa tarefa exige integração com a ciência, instituições multilaterais e povos indígenas, para que a COP30 não se limite à retórica, mas produza arcabouço normativo consistente.

Assino esta reflexão com a convicção de que o direito é instrumento de proteção intergeracional. Preservar a Amazônia como patrimônio natural e humano depende de transformar compromissos climáticos em obrigações exigíveis, dotadas de mecanismos reais de verificação e reparação.

 

 

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