23 de novembro de 2025
Politica

O ESG, sua ancestralidade e o legado de Kofi Annan ao carnaval como força de impacto global

Novembro é o mês em que o mundo se volta para compromissos climáticos — com a realização da COP30 — e o Brasil mergulha na agenda da Consciência Negra. É justamente nesse cruzamento simbólico que se revela uma verdade: o ESG, assim como o futuro, é ancestral.

Isso porque, embora o acrônimo ESG tenha ganhado relevância global apenas a partir de 2004, uma das hipóteses mais aceitas por analistas do mercado financeiro e executivos C-level é a de que Kofi Annan, diplomata ganês, primeiro homem negro a chefiar a ONU, tenha desafiado 50 CEOs de grandes instituições financeiras a encontrar soluções para integrar os fatores socioambientais e de governança às decisões de investimento. O que resultou na no relatório “Who Cares Wins” (ganha quem se importa) de 2005 que impulsionou investidores a considerar critérios para obter melhores resultados a longo prazo e tornar o mercado financeiro mais sustentável. Mais do que isso: Annan não só impulsionou a pauta de sustentabilidade corporativa, como também reconheceu o carnaval como uma das maiores indústrias criativas do planeta, destacando sua potência coletiva, sua capacidade de gerar riqueza, sua força como expressão da diáspora africana, patrimônio imaterial brasileiro.

Esse reconhecimento não é trivial. Ele revela que a lógica ESG — ambiental, social e de governança — encontra raízes profundas nas epistemologias africanas, que sempre valorizaram a interdependência, o cuidado comunitário, a sustentabilidade territorial e a responsabilidade compartilhada.

A COP30 aprofunda, neste ano, discussões que não podem mais ser tratadas como periféricas, entre elas, o racismo ambiental. Ele se manifesta quando populações negras, periféricas, ribeirinhas e indígenas sofrem de forma desproporcional os efeitos da degradação ambiental, das mudanças climáticas, da ausência de infraestrutura e das políticas públicas insuficientes.

Discutir racismo ambiental numa COP realizada no Brasil — país onde a lógica de desigualdade territorial é historicamente racializada — é reconhecer que não existe transição climática justa sem justiça social. E esse é, justamente, o sustentáculo do “S” do ESG, onde centralidade comunitária, inclusão, diversidade e reparação são pilares fundamentais.

Neste contexto, o carnaval brasileiro reconhecido internacionalmente — inclusive por Kofi Annan — como indústria criativa de escala global, expressa de forma concreta a força econômica, cultural e social das matrizes afro-brasileiras.Trata-se de um setor que movimenta bilhões todos os anos, impulsionando turismo, hotelaria, transporte, moda, gastronomia, tecnologia, entretenimento e comunicação. Em cidades como Salvador, Recife, São Paulo e Rio de Janeiro, o período carnavalesco é o principal motor econômico e o maior atrativo turístico do calendário.

Mais do que isso: o carnaval é um dos maiores produtos de exportação cultural do Brasil. Seus ritmos, estéticas e narrativas atravessam fronteiras e influenciam desfiles internacionais, festivais, academias de samba no exterior, produções audiovisuais e cadeias criativas que se inspiram em sua potência.

Para além dos grandes desfiles, existe o carnaval de rua, de bairro, feito por redes comunitárias, costureiras, artesãos, músicos, pequenos empreendedores, ambulantes e moradores. Esse carnaval de escala humana: ativa economias locais; fortalece territórios; distribui renda; cria redes de cuidado; favorece a circulação interna de recursos; gera impacto global a partir de dinâmicas locais. É a prática social do ESG antes de existir o nome — uma governança viva, comunitária, participativa e ancestral. É, também, um antídoto às desigualdades territoriais que se manifestam no racismo ambiental. O fortalecimento dessas economias criativas periféricas é parte essencial da construção de cidades mais justas, resilientes e sustentáveis — uma pauta que dialoga diretamente com o que está sendo debatido na COP30.

Conectar Kofi Annan ao surgimento do termo ESG; reconhecer seu papel ao legitimar o carnaval como indústria criativa global; trazer para a centralidade da COP30 o debate sobre racismo ambiental; e evidenciar a força socioeconômica do carnaval de bairros significa afirmar que: não existe sustentabilidade sem ancestralidade.E que o legado africano, como berço da humanidade, gênese presente na criação de sistemas comunitários, harmonia com a natureza e práticas de governança coletiva — é a base do que o mundo contemporâneo tenta, agora, reconstruir. O Brasil, por meio do carnaval e de sua pulsante economia criativa afro-brasileira, tem muito a ensinar ao mundo sobre impacto, sustentabilidade e futuro, ao mesmo tempo que tem muito a aprender.

 

 

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