COP-30: governo Lula já pagou R$ 350 milhões a entidade que ofereceu cargo a Janja
O governo Lula já pagou R$ 350 milhões dos R$ 530 milhões previstos à Organização dos Estados Ibero-Americanos (OEI) na produção da Conferência do Clima das Nações Unidas (COP-30), em Belém. O repasse equivale a 66% do valor firmado nos contratos, que incluem desde a preparação até a cobertura jornalística do evento. Os dados são da Controladoria-Geral da União (CGU). Não há previsão de multa ou punição por falhas na organização da conferência, que teve incêndio, alagamento e calor excessivo, entre outros problemas de infraestrutura.
Procurada, a Casa Civil disse monitorar “eventuais falhas” na conferência que, “em regra, estão sendo rapidamente saneadas”. A OEI afirmou que “a COP-30 tem sido uma edição histórica, registrando recordes de delegações e em número de visitantes”. Leia os comunicados ao fim da reportagem. A Organização das Nações Unidas (ONU) já havia alertado, uma semana antes, para a necessidade de “reparações urgentes” nas instalações da COP-30.
A OEI é próxima de quadros do PT e da primeira-dama Rosângela da Silva, a Janja, a quem chegou a oferecer cargo. Na COP-30, o maior contrato do governo com a entidade, para custear a montagem do evento, soma R$ 478 milhões.
Como informou a Coluna do Estadão, o contrato mais recente da gestão petista com a organização foi assinado pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC), estatal de notícias do governo. O acordo de cooperação recebeu um aditivo no último dia 7, às vésperas da COP, e chegou ao montante de R$ 27,9 milhões.
Não houve licitações. Como a OEI é uma entidade internacional de direito público, não precisa seguir a Lei de Licitações brasileira. A EBC disse que o acordo segue valores de mercado, enquanto a OEI afirmou seguir padrões internacionais de governança.
Contrato não prevê punições por descumprimento
O principal contrato do governo com a OEI para a COP, de R$ 478 milhões, não menciona punições ou multas em caso de descumprimento do acordo. É possível rescindir o documento em caso de “impossibilidade de execução do projeto por caso fortuito ou força maior”. Essa condição quando a verba é usada “em desacordo com o objetivo” do contrato, entre outros itens.
Fogo na área restrita da COP-30
Na última quinta-feira, 20, houve um incêndio na Zona Azul da COP, área restrita a autoridades. O fogo causou correria e 21 pessoas receberam atendimento médico, sendo 19 por inalação de fumaça e duas por crise de ansiedade. O local foi esvaziado, o que atrasou as negociações entre os países na reta final da conferência internacional.
Uma semana antes, ONU alertou para riscos de exposição elétrica
Uma semana antes do fogo, a ONU havia alertado para a necessidade de “reparos urgentes” nas instalações da COP-30. “Essas questões criaram considerável desconforto e preocupação reputacional para delegações e participantes”, afirmou o chefe da UNFCCC (braço de clima da ONU), Simon Stiell. Ele citou portas quebradas, falhas no ar-condicionado e alagamentos. Os participantes também reclamaram da falta de comida no evento.
“Durante episódios recentes de chuva forte, várias áreas do local sofreram inundação significativa. A água penetrou pelo teto e luminárias, criando não apenas interrupção, mas também potenciais riscos de segurança devido à exposição elétrica”, apontou a carta, ressaltando a conhecida alta frequência de chuvas em Belém.
Na oportunidade, o governo brasileiro disse que não houve alagamento, mas “ocorrências localizadas, como goteiras”. “Vazamentos foram causados por rompimento de calhas no Media Center e Posto de Saúde 2, que já foram prontamente reparados, com substituição e vedação das estruturas”.
Entidade bateu recorde em contratos no governo Lula
A organização já fechou pelo menos R$ 710 milhões em acordos de cooperação no governo Lula, valor 800% maior do que na gestão Bolsonaro, como mostrou o Estadão.
A OEI se apresenta como “a maior organização multilateral de cooperação entre os países ibero-americanos de língua espanhola”. Atua no Brasil há duas décadas, desde o primeiro governo Lula, com eventos, projetos sociais, consultorias e ações educativas, mas bateu recordes no atual mandato do petista. Dois decretos do presidente permitiram que a empresa aumentasse sua arrecadação direta sobre os contratos.
As parcerias são concentradas em pastas e órgãos controlados pelo PT, como a Casa Civil, a Secretaria-Geral da Presidência e os Ministérios da Educação e da Igualdade Racial.
Dos R$ 710 milhões em contratos firmados com 19 órgãos da atual gestão até abril passado, R$ 629 milhões, quase 90%, estão sob o guarda-chuva de ministros e dirigentes petistas. No governo Bolsonaro, por outro lado, a OEI fechou R$ 78,9 milhões em contratos.
OEI ofereceu cargo a Janja
No início de 2023, o governo Lula articulou a nomeação de Janja para um cargo na OEI. Em abril daquele ano, a entidade anunciou a criação da Rede Ibero-Americana para a Inclusão e a Igualdade, que seria coordenada pela primeira-dama brasileira.
A socióloga participou da cerimônia na sede da organização, na Espanha, e posou para foto ao lado do secretário-geral da entidade, Mariano Jabonero, mas nunca desempenhou efetivamente qualquer papel no cargo, devido a um recuo do governo.
Leia o comunicado da Casa Civil
“A equipe responsável pela logística da Conferência, em parceria com a UNFCCC e com as empresas responsáveis pela prestação do serviço, monitoram eventuais falhas que, em regra, estão sendo rapidamente saneadas. Da mesma forma, os fornecedores estão sendo notificados a atuar tempestivamente sobre problemas identificados e, em casos específicos, a adotar, às suas custas, medidas compensatórias. Eventuais descumprimentos contratuais, caso identificados, serão tratados na forma prevista nos procedimentos aplicáveis, podendo, inclusive, serem objeto de aplicação de sanções.”
Leia o comunicado da OEI
“Com relação ao incidente ocorrido em 20/11 na Zona Azul da COP30, em Belém, onde um incêndio atingiu um dos pavilhões, a OEI informa que acompanha a apuração desde os primeiros momentos e aguarda o resultado oficial das autoridades responsáveis, que determinará as causas do ocorrido. O fogo foi controlado em apenas seis minutos pelo Corpo de Bombeiros, com a imediata adoção dos protocolos de segurança, e em cerca de seis horas as atividades já estavam totalmente normalizadas. A rápida resposta ao incidente demonstra a eficiência da organização e a capacidade operacional estruturada para um evento desta magnitude. A OEI reafirma que a COP30 tem sido uma edição histórica, registrando recordes de delegações e em número de visitantes (quase 260 mil apenas na Green Zone), o que representa mais que o dobro em relação à conferência anterior.”
