STF encerra hoje prazo de recurso que abre caminho para prisão de Bolsonaro se tornar definitiva
A defesa do ex-presidente Jair Bolsonaro e de mais seis réus do núcleo central da trama golpista tem até o fim do dia desta segunda-feira, 24, para apresentar novos recursos no Supremo Tribunal Federal (STF). Com o fim do prazo, o processo fica apto a transitar em julgado, etapa que abre caminho para que o ministro Alexandre de Moraes transforme em definitiva as prisões preventivas do ex-presidente e do ex-ministro da Casa Civil Walter Braga Neto, detido desde dezembro de 2024, e determine a detenção dos demais condenados ainda esta semana.
A projeção é de criminalistas ouvidos pelo Estadão, que apontam como cenário mais provável uma decisão sobre o trânsito em julgado até sexta-feira. A avaliação leva em conta os prazos restantes do processo, os poucos instrumentos que ainda restam aos advogados do ex-presidente e, sobretudo, o padrão de celeridade adotado por Moraes no caso e a jurisprudência pacificada da Corte contra recursos meramente protelatórios, isto é, destinados apenas a atrasar o desfecho do processo.
O prazo começou a correr na última quarta-feira, após a publicação do acórdão da Primeira Turma que rejeitou os primeiros embargos de declaração de Bolsonaro. O documento oficializou a condenação por tentativa de golpe de Estado e manteve a pena de 27 anos e 3 meses de prisão.
Em paralelo aos recursos, Bolsonaro foi preso preventivamente no último sábado, 22, após violar a tornozeleira eletrônica usando um ferro de solda, fato admitido pelo próprio ex-presidente. Na decisão, Moraes apontou risco de fuga. A prisão preventiva, porém, não tem relação com a ação penal do golpe, mas decorre do inquérito que investiga a atuação do deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) junto a autoridades americanas para coagir o Supremo.

Criminalistas ressaltam, no entanto, que a prisão preventiva não interfere nos recursos porque se trata de processos distintos. Portanto, na ação penal do golpe, apontam eles, restam dois caminhos possíveis para as defesas e, a depender da estratégia adotada, o início do cumprimento da pena pode ser antecipado ou postergado.
Para o professor de Direito Penal da FGV-Rio, Thiago Bottino, um dos caminhos da defesa de Bolsonaro é apresentar novos embargos de declaração, os chamados “embargos dos embargos”. Nesse caso, o prazo é de cinco dias corridos. Como o último dia recaiu no domingo, o Código de Processo Penal determina que a contagem seja prorrogada para o dia útil seguinte, encerrando-se às 23h59 desta segunda-feira.
Bottino alerta, porém, que esse movimento pode ser interpretado como tentativa de atraso para execução da pena, o que poderia levar Moraes a rejeitar o recurso liminarmente e ordenar o trânsito em julgado já a partir de terça-feira. O professor lembra que o ministro já atuou assim em casos envolvendo Fernando Collor de Mello, Paulo Maluf e condenados pelos ataques de 8 de janeiro.
“Moraes pode rejeitar liminarmente, certificar o trânsito e mandar prender. Tem feito isso no mesmo dia ou no seguinte. Depois, com Bolsonaro já preso para execução da pena, ele pode submeter ao colegiado”, diz.
Por saber que esse caminho tende a ser visto como protelatório, a defesa liderada por Celso Vilardi pode optar por concentrar a estratégia nos embargos infringentes, recurso que pediria o reexame do caso. Nesse cenário, há duas possibilidades para esta segunda-feira: a defesa pode apresentar os infringentes imediatamente, já que não há ordem obrigatória entre os dois tipos de recurso, ou simplesmente não apresentar nada hoje e deixar o prazo correr até o fim da semana.
O prazo total para infringentes é de 15 dias. A contagem começou com a publicação do primeiro acórdão e foi interrompida pelos primeiros embargos, retomando na quarta-feira dia 18, vencendo na próxima sexta-feira, 28.
Mas há divergências entre especialistas sobre como Moraes deve agir. Para o criminalista Renato Vieira, se a defesa não apresentar embargos nesta segunda, Moraes terá de aguardar os dez dias corridos dos infringentes, cujo prazo termina na sexta-feira, 28. “O ministro precisa esperar, só depois poderá declarar o trânsito em julgado”, afirma.
Vieira também defende que decisões sobre recursos e execução da pena deveriam ser levadas à Primeira Turma, e não tomadas individualmente. “Em vez de decidir monocraticamente, ele deveria mandar para o colegiado”, diz.
Bottino concorda que, em tese, Moraes deveria aguardar o restante do prazo dos infringentes, mas pondera que na prática o ministro não tem considerado esse prazo quando o recurso é manifestamente inadmissível, como ocorre quando não há dois votos pela absolvição. O requisito é exigido pela jurisprudência do Supremo e, no caso de Bolsonaro, apenas Luiz Fux apresentou voto divergente.
O criminalista lembra que o regimento do STF não define o número de votos divergentes necessário para que as Turmas analisem embargos infringentes, o que abre margem para Moraes decidir já a partir de terça, 25, em diante. “Fica de um lado o regimento, de outro a jurisprudência. Eu adotaria a posição mais legalista e esperaria o prazo”, afirma.
Seguindo essa lógica, na última sexta-feira, 21, a defesa protocolou um documento sinalizando que pretende apresentar embargos infringentes, mesmo com a jurisprudência contrária. O gesto tenta impedir que o trânsito em julgado seja declarado já na terça-feira, além de registrar pedido para que Bolsonaro cumpra prisão domiciliar caso a execução seja determinada. Moraes rejeitou o pedido de domiciliar após a decretação da prisão preventiva.
Já o criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, vê o cenário de forma oposta. Para ele, Moraes não precisa aguardar o prazo dos infringentes, o que lhe permitiria declarar o trânsito em julgado já nesta segunda-feira.“Os embargos infringentes não cabem. Se algum advogado entrar, será um erro grosseiro. Moraes não precisa esperar esse prazo”, afirma.
Tanto Kakay quanto Bottino avaliam que Moraes tende a tratar esta segunda-feira como o último dia útil antes de declarar o trânsito em julgado, movimento que deixaria Bolsonaro a um passo da prisão definitiva.
Ambos os criminalistas afirmam ainda que, certificado o trânsito, a prisão preventiva decretada no sábado deverá ser substituída pela execução da pena em regime fechado, cujo local será definido pelo ministro.
Além de Bolsonaro, também podem recorrer o deputado federal e ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) Alexandre Ramagem; o ex-ministro da Defesa e ex-chefe da Casa Civil Walter Braga Netto; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier Santos; o ex-ministro da Justiça Anderson Torres; o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) Augusto Heleno; e o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira.
