23 de dezembro de 2025
Politica

Um presidente que lê

De quem estou falando? De Washington Luís Pereira de Souza, (1869-1957), advogado, historiador e político que foi o 13º Presidente do Brasil e o último da chamada “República Velha”. Também fora o 18º Presidente do Estado de São Paulo, pois essa a denominação atribuída a quem hoje exerce o governo local e 3º Prefeito da capital paulista. Era o “paulista de Macaé”, pois nascera no Rio de Janeiro. Homem culto, preparado, e, portanto, nada estranho tenha sido injustiçado.

Mas a circunstância de ser leitor inveterado é narrada por Humberto de Campos em seu “Diário Secreto”. Natural do Maranhão, o escritor foi encarregado pelo presidente de seu Estado a fazer chegar às mãos do Presidente da República uma caixa com ouro em pepitas e em pó, proveniente do município de Turi-Açu. Humberto aproveitou e incluiu no pacote um exemplar de seu livro “O Brasil Anedótico”.

Quarenta e oito horas depois, recebia gentilíssima carta do Presidente, confessando já ter lido o livro quando lhe chegou às mãos o exemplar oferecido. E comunicava isso com grande satisfação.

A confissão confirmou a notícia, diversas vezes transmitida a Humberto, de que o Presidente da República de então, era um dos seus mais persistentes leitores. Isso já fora contado ao escritor por um oficial de gabinete de Washington Luís durante o governo paulista. Pois um dia, vindo ao Rio, Jairo procura Humberto e o intima:

– “Você precisa me dar uma coleção dos seus livros, com dedicatória. Sabe para quem é? É para Washington Luís, que vai ficar contentíssimo. Imagine você que ele foi à minha casa, e levou-me todos os livros seus. Agora eu lhe levo a coleção, e ele me devolve os meus!”.

Pouco depois, Humberto de Campos estava na Câmara Federal e alguém indagou: – “Conheces o Valois?”. Era Monsenhor Valois de Castro, deputado por São Paulo. Humberto é preciso ao descrevê-lo: – “Embainhado na sua batina orlada de roxo, era o tipo de um desses vigários de freguesia rica, a fisionomia enérgica e alegre, a testa inteligente, cabelo grisalho lançado para trás. Mais alto do que baixo, denunciava robustez física. O tipo, enfim, de um daqueles cardeais políticos dos séculos XVI e XVI, prontos a subjugar um povo ou a lançar à fogueira alguns milhares de infiéis”.

O Monsenhor logo abraçou Humberto e disse que era desejo seu conhecer pessoalmente o escritor. E contou a ele como foi que tomou contato com o seu primeiro livro:

– “Foi nos Campos Elíseos. Eu tinha ido visitar o Washington, e fui entrando para o gabinete dele. No gabinete não havia ninguém. Em cima da mesa vi um livro com uma faca dentro, e que estava sendo aberto. Era o “Tonel de Diógenes”. Li o primeiro conto, e ia ler o segundo, quando ouvi os passos de Washington, que vinha do interior do Palácio. Pus o livro no lugar, direitinho. Era o Washington mesmo que o estava lendo. Assim, porém, que cheguei à rua, fui à primeira livraria e comprei-o. e nunca mais perdi um só de seus livros”.

Humberto de Campos contava, ainda, que foi o primeiro Presidente da República a se fazer representar numa posse. Exatamente a posse dele, Humberto, na Academia Brasileira de Letras. Fê-lo por intermédio de seu líder, Carlos de Campos. Oportunidade em que encaminhou carta de algumas páginas.

A propósito, Humberto de Campos não hesita em se vangloriar de sua produção. Narra que o livro de Georges Normandy sobre Maupassant encontrou um conselho que o escritor francês recebeu de um membro da Academia Francesa de Medicina. Dizia que Maupassant havia publicado vinte e sete livros em dez anos. Trabalho que consumiu seu corpo. Este se vinga depois, imobilizando a atividade cerebral. É preciso um longo e completo repouso.

Humberto fala que o total da obra de Maupassant não passou de 5.300 páginas, escritas em dez anos. Entre 1917 e 1927, ele Humberto publicara dezesseis volumes, num total de 5.533 páginas. Só que sua produção não reunida em livro foi o triplo desse total. Embora se considerando menor do que Maupassant, conclui que “o trabalho cerebral é o mesmo. Tanto cansa o tear que tece o fio de seda, como o que trabalha com o fio de algodão”. Ambos escreveram, foram celebrados e, igualmente, lançados ao ostracismo. Vale a pena relê-los.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *