30 de dezembro de 2025
Politica

O Brasil que mata suas mulheres

O Brasil atravessou 2025 anestesiado diante de uma sucessão de crimes de violência extrema contra mulheres que ultrapassam qualquer limite de humanidade. O ano já se inscreve na história não apenas por estatísticas alarmantes, mas por rostos e nomes mulheres cujas vidas foram interrompidas pela forma mais crua de ódio de gênero. A sequência de casos expõe um colapso coletivo: das instituições, das políticas públicas e de uma cultura que ainda insiste em normalizar a violência como “conflito de relacionamento”.

Não foram homicídios comuns. Foram atos de crueldade e tortura cometidos quase sempre por quem dizia amar. Cada crime escancarou não só a brutalidade do agressor, mas as falhas reiteradas da sociedade e do Estado em interromper ciclos de violência conhecidos, previsíveis e, portanto, evitáveis.

Os feminicídios e crimes violentos deste ano não surgiram do nada. Eles foram anunciados. Com sinais claros, ameaças, descumprimento de medidas protetivas que, se enfrentados com prioridade, poderiam ter sido interrompidos. A violência contra a mulher não é inevitável. Ela é previsível. E, justamente por isso, é inadmissível.

Do ponto de vista técnico, a violência de gênero segue um roteiro conhecido. A ciência criminológica e a experiência policial são claras: não existe feminicídio “repentino”. Ele é anunciado. Ele deixa rastros. Ele avisa. Ignorá-lo é escolha cultural e falha institucional.

Os dados oficiais não deixam margem a dúvidas. Segundo o Mapa Nacional da Violência de Gênero, elaborado pelo Observatório da Mulher Contra a Violência, vinculado ao Senado Federal, 718 feminicídios foram registrados entre janeiro e junho de 2025 uma média de quatro mulheres mortas por dia por razões de gênero. No mesmo período, contabilizaram-se 33.999 estupros contra mulheres, o que equivale a cerca de 187 por dia.

Os crimes mais cruéis do ano também revelam outro dado alarmante: a naturalização social da violência contra a mulher. Persistem comentários que questionam a conduta da vítima, relativizam a agressão ou buscam explicações passionais para atos de barbárie. Essa narrativa além de distorcer a realidade, ela mata.

É preciso dizer com clareza: enfrentar a violência contra a mulher exige mudança cultural, mas também decisão política e técnica. Exige investimento em polícia judiciária estruturada, investigação célere e responsabilização efetiva. Exige tratar o descumprimento de medidas protetivas como sinal máximo de alerta, e não como detalhe processual.

O Brasil precisa decidir se continuará reagindo apenas depois do corpo no chão amputado, executado ou se terá coragem institucional para agir antes do último ataque.

Quatro mulheres mortas por dia. Cento e oitenta e sete estupradas. Este é o retrato de um país que falhou com elas. Falhar de novo não é opção.

 

 

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