Sem marca no Lula 3, Sidônio aposta no ‘inimigo comum’ para garantir PT no 2º turno
O governo Lula 3 não tem uma marca, está com a popularidade chegando ao fundo do poço e, até duas semanas atrás, nem sequer conseguia unir a própria militância ou o discurso de seus ministros. Diante desse cenário, alguns governistas já levantavam o seguinte alerta nos bastidores: se o quadro de apatia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva continuasse, bastaria mais uma crise com impacto popular — a exemplo do Pix e do INSS — para ameaçar a presença do PT no segundo turno em 2026.
Eis que, encerrando o semestre, o Congresso deu um discurso de presente ao presidente Lula. A forma como Câmara e Senado conduziram a crise sobre o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) deu ao petista a chance de reeditar o “nós contra eles”, e que será entoado à exaustão pelo PT, independentemente de quem assumir a presidência do PT agora.
Marqueteiro da campanha vitoriosa de 2022, o atual ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência, Sidônio Palmeira, alinhou o discurso com o partido do presidente Lula e, juntos, eles encontraram o “inimigo comum” – bancos, bilionários e bets.
“Se a gente pensar, por exemplo, Fernando Henrique I e II, tem o controle da hiperinflação e tem a estabilidade econômica. O Lula I e II tem a questão da diminuição da pobreza, o incremento da classe média e a consolidação dos programas sociais. O Lula 3 não tem uma marca para chamar de sua. Então, esse novo BBB é uma marca que pode pegar e consegue mobilizar a militância”, avalia Rodrigo Prando, cientista político e professor de Sociologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Pelo ranço histórico do PT, inicialmente integrantes da sigla entoaram o “pobres X ricos”. Mas essa expressão também precisou ser “resignificada”, segundo explicou um petista à Coluna do Estadão. “Ninguém gosta de ser pobre, não temos que reforçar isso”, observou. A conclusão, então, foi de que o foco deveria ser o combate à injustiça tributária, para que todos possam progredir.
Giuliano Salvarani, cientista político e professor de Comunicação, Marketing e Política da ESPM, considera que o ajuste na expressão era mesmo necessário. “Muitos eleitores de baixa renda não se enxergam mais como ‘pobres’, mas como trabalhadores, pais de família, empreendedores informais etc. Ou seja, o termo ‘pobre’ pode ser percebido como desatualizado e assim não mobiliza”, explica à Coluna do Estadão.
A atualização do discurso ficou evidente. “É justo Bancos, Bets e Bilionários (BBB) não quererem pagar imposto?”, perguntou Sidônio, numa referência aos vídeos divulgados pelo PT em defesa da taxação BBB. “Não se trata de pobres contra ricos. A classe média também paga imposto alto. É 99% contra 1%”, disse ele à Coluna da Vera Rosa, indicando a nova estratégia de comunicação.
“Esse ajuste que o Sidônio promoveu na comunicação tem um histórico. O PT é uma fábrica de narrativas. Já construiu várias camadas dessa polarização. Sudeste contra Nordeste, ricos e pobres, PT e PSDB, em síntese, nós contra eles. O discurso polarizador simplifica, mas é um discurso que agrega, que dá força, que dá coesão à militância”, analisa Rodrigo Prando.
Para o cientista político, BBB é um termo que também mostra a formação dos interesses dentro do Congresso. ”Lula, muitas vezes, faz uma inflexão mais ao centro, mas este centro me parece ser, muitas vezes, antipetista por excelência. Então, com o BBB ele vai conseguir, pelo menos, a força de uma militância histórica que sempre lhe deu votos para ir para o segundo turno”, concluiu Prando.
Já o cientista político Giuliano Salvarani é mais reticente sobre a chance de sucesso da investida de comunicação do governo. “BBB, pra mim, é bom, bonito e barato. Ou Big Brother Brasil. Até explicar que se referem a taxar ‘bilionários, bancos e bets’, esse novo signo já perdeu a atenção. Não é Sidônio que tem a responsabilidade de entender que o governo está perdido, tentando se posicionar, ora com o centro, ora para a agenda da esquerda. O que pega mesmo é a vida melhorar e explicar para as pessoas como vai fazer isso”, conclui.
No entanto, enquanto não há sinal de essa melhora ocorrer, o que o governo Lula aposta é numa salvação via “São Sidônio”, que rapidamente encomendou novas peças à agência de publicidade contratada para campanhas nas redes sociais. (Veja o post mais abaixo).
Uma postagem nas redes sociais do governo afirmava: “Nesse cabo de guerra, o Governo Federal tem lado: o da classe média e do povo trabalhador que movem o nosso país. Nós queremos equilibrar as contas corrigindo injustiças, combatendo privilégios e poupando quem trabalha e faz o Brasil crescer”. O texto seguido de uma uma imagem de cabo de guerra – de um lado avanço, do outro, retrocesso.
Nesse cabo de guerra, o Governo Federal tem lado: o lado da classe média e do povo trabalhador que movem o nosso país. ➡️
Nós queremos equilibrar as contas corrigindo injustiças, combatendo privilégios e poupando quem trabalha e faz o Brasil crescer. 🇧🇷
— Governo do Brasil (@govbr) July 1, 2025
O marqueteiro que, nos últimos seis meses, passou a maior parte do tempo apagando incêndios, com as crises do Pix e do INSS, além das frases desastrosas do presidente Lula – que foram do contexto internacional a situações machistas – agora tem um mote de campanha para explorar, ainda que não seja nenhum programa de fato da atual gestão.
