12 de julho de 2025
Politica

Cúpula do Brics mostra dificuldade de injetar ânimo em clube diluído por ditaduras

Antes de mais nada, cabe refutar o mito de que a ênfase dada pela diplomacia brasileira ao Brics, bloco de cooperação de países em desenvolvimento, não passa de uma insistência ideológica lulopetista sem conexão com os reais interesses nacionais. Sim, o grupo foi criado em 2009, no segundo mandato presidencial de Lula, inicialmente reunindo apenas China, Brasil, Rússia e Índia, aos quais se somou posteriormente a África do Sul. Mas nem o governo de Michel Temer (2016-2018), nem o de Jair Bolsonaro (2019-2022), viraram as costas para o Brics. Ambos reconheceram os benefícios que o Brasil colhia ao participar de forma ativa das atividades do grupo, tanto pelo lado econômico quanto pela oportunidade de exercer uma liderança política ao lado de potências emergentes como a China e a Índia.

Bolsonaro, normalmente avesso a instâncias multilaterais, ainda mais aquelas voltadas para o chamado “Sul Global”, citou explicitamente a importância do Brics em seu programa de governo na campanha de reeleição de 2022.

O presidente Lula recebe as autoridades do Brics para foto oficial no Rio de Janeiro.
O presidente Lula recebe as autoridades do Brics para foto oficial no Rio de Janeiro.

O bloco continua sendo relevante para a política externa brasileira, e assim seria mesmo que o Palácio do Planalto fosse ocupado por um presidente de outro grupo político, mas os desafios agora são maiores e os ganhos para a nossa diplomacia, menos evidentes. Há dois motivos para isso. O primeiro é a expansão do número de países que compõem o Brics, algo que se deu principalmente por pressão da China, mas que o Brasil deixou acontecer. Em 2024, tornaram-se membros plenos o Egito, os Emirados Árabes Unidos, a Arábia Saudita, o Irã, a Etiópia e a Indonésia. Com isso, os regimes autoritários tornaram-se maioria absoluta no bloco (antes a proporção era de três democracias para duas ditaduras). O segundo motivo é o fato de alguns dos integrantes do Brics estarem no centro das principais encrencas geopolíticas da atualidade: a Guerra na Ucrânia e o conflito Israel-Hamas-Irã.

Esses dois fatores combinados diluem o poder relativo do Brasil no bloco, dificultam a obtenção de consensos e drenam as atenções que deveriam estar concentradas na cooperação econômica entre os países. A legitimidade do grupo como contraponto ao domínio dos Estados Unidos e da Europa em grandes decisões, em especial no âmbito do sistema financeiro global, fica enfraquecida. A cúpula do Brics que se encerra nesta segunda-feira, 7, no Brasil é uma demonstração do desafio que é obter avanços em uma instância multilateral em expansão, com interesses cada vez mais diversos.

A negociação para a elaboração do comunicado conjunto dos líderes do bloco resultou em uma condenação aos ataques dos Estados Unidos e de Israel (sem menção direta a esses países) contra o Irã, país que trabalhava nas sombras para desenvolver ilegalmente a tecnologia da bomba atômica. Além disso, foi preciso pisar em ovos para defender a solução de dois Estados, Israel e Palestina, para o conflito no Oriente Médio, com uma linguagem que fosse aceita pelo Irã, que rejeita o direito do primeiro de existir. O texto também precisou equilibrar interesses divergentes de Egito e Etiópia, de um lado, e África do Sul, do outro, na questão da reforma do Conselho de Segurança da ONU. Para completar, Vladimir Putin, ditador da Rússia, um dos países fundadores do Brics, não pode vir ao Brasil porque poderia ser preso e deportado para o Tribunal Penal Internacional, em Haia, onde é acusado de crime de guerra na Ucrânia.

Para injetar um pouco de ânimo em uma cúpula esvaziada (Xi Jinping, ditador da China, também não veio, assim como outros líderes de países-membros e convidados), procurou-se explorar em alguns discursos as críticas à guerra tarifária de Donald Trump, presidente dos Estados Unidos, e a necessidade de reduzir a dependência do dólar no comércio mundial. Trump havia dito, em fevereiro, que o Brics morreu depois que ele ameaçou punir, com tarifas de importação, os países que procurassem reduzir o domínio global do dólar. Exagero, claro. Mas tentar fortalecer, pelo antagonismo com os Estados Unidos, um clube de países diluído por ditaduras, algumas inimigas dos americanos (Irã, Rússia), mas outras aliadas de Washington (Emirados Árabes e Arábia Saudita), não parece uma estratégia com muito futuro.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *