Lula surfa na culpa de Bolsonaro por tarifa de Trump, mas será cobrado por colocar lenha na fogueira
Surfando no presente político que ganhou com a imposição de tarifas de 50% ao País após campanha da família do ex-presidente Jair Bolsonaro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já deveria ter percebido que essa muleta não durará muito tempo. Sentado na cadeira de chefe de Estado e de governo, há uma semana do início da tarifa, cabe a ele resolver a pendenga que o antecessor ajudou a criar. E isso só será possível se ele abandonar o discurso político e partir para uma negociação da parte que é possível tratar com os americanos.
É evidente que a tarefa é difícil. Sobretudo pelo fato de que parte dos pontos colocados até aqui pela gestão Trump é inegociável. Não cabe qualquer interferência no Judiciário para salvar Jair Bolsonaro. Isso não está em discussão. Até aí, o discurso de soberania vai bem. Mas há o que tratar, como as tarifas que o Brasil cobra de produtos americanos que, em média, são mais altas do que as que o parceiro comercial historicamente nos cobrou. Eis um debate legítimo que, se não servir para derrubar as tarifas previstas para entrar em vigor no dia 1º, serviria para evitar que a situação se agrave ou mesmo para ganhar mais tempo para conversar. Outros países, como o Japão, as Filipinas e a Indonésia, conseguiram acordos nos últimos dias.

Até aqui, porém, Lula tem optado pelo caminho do confronto. Em discursos e entrevistas, em vez de demonstrar espaço para conversar, desanca Trump e o governo americano sempre que possível, para alimentar o discurso da soberania que lhe garantiu os primeiros bons números em pesquisas depois de muito tempo. Dizer, como afirmou em entrevista à CNN americana, que Trump seria preso se fizesse no Brasil o que fez no Capitólio e que o presidente dos EUA quer ser imperador do mundo, não abrirá qualquer caminho para o diálogo. E de nada adiantará colocar o vice Geraldo Alckmin para negociar ou criar um comitê de empresários para fazê-lo se as provocações continuarem.
O governo parece contar com modestos efeitos positivos iniciais da tarifa, com uma maior disponibilidade de produtos no mercado interno e a queda da inflação, o que seria precioso para a disputa eleitoral de 2026. Mas, como se sabe, os efeitos negativos que virão em seguida tendem a ser devastadores, sobretudo com a perda de postos de trabalho e capacidade de investimento das empresas exportadoras brasileiras, incluindo importantes setores do agronegócio.
É engano do presidente achar que qualquer efeito negativo poderá ser indefinidamente colocado nas costas de Bolsonaro. É claro que ele e a família serão lembrados como responsáveis diretos, ainda mais com parlamentares do PL estendendo bandeira de Trump no Congresso e com Eduardo e seus aliados bradando aos quatro ventos que têm participação direta nas sanções americanas. Mas, com o tempo, o eleitor vai questionar quem está sentado na cadeira sobre o que está fazendo para resolver o problema. Principalmente se as sanções piorarem.