2 de agosto de 2025
Politica

Indústria automotiva vai rever investimentos de R$ 180 bi se governo aceitar pleito da BYD

A indústria automotiva brasileira vai rever a projeção de investimentos de R$ 180 bilhões se o governo Lula aceitar os pleitos da empresa chinesa BYD para reduzir tarifas de importação. A informação é do presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Igor Calvet, em entrevista exclusiva à Coluna do Estadão.

Em fevereiro, a BYD pediu ao governo a redução de imposto de importação dos kits SKD (Semi Knocked Down, ou literalmente semipronto) e CKD (Completely Knocked Down), de 5% para carros elétricos e 10% para híbridos. Hoje, as taxas estão em 20% para híbridos e 18% para elétricos. Os sistemas que trazem os carros quase prontos para o País serão usados na fábrica da BYD em Camaçari, na Bahia.

“Se mudar as regras do jogo, as empresas instaladas no País reavaliam, obviamente, todos os investimentos que foram anunciados”, afirmou Calvet. “Esses recursos (programados até 2030) são absolutamente importantes para o País, no sentido de agregar o valor à produção nacional, que não é uma mera montagem, não é um mero apertar parafusos”, complementou.

O pleito da BYD será avaliado pelo Comitê-Executivo de Gestão, da Câmara de Comércio Exterior (Camex), que reúne 11 ministérios. A reunião está prevista para o próximo dia 30, véspera do início do tarifaço anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.

“Isso ser feito em uma semana em que já se sabe que haverá uma confirmação ou não das tarifas dos Estados Unidos reforça um pouco mais negativamente (a preocupação). Nós estamos num jogo bastante atribulado. Por um lado o mercado americano que é muito importante para parte do setor automotivo brasileiro e, também, lidando com essas questões de importação que tanto nos aflige”, ressaltou.

Igor reclamou da “importação maciça” de veículos que já vêm ocorrendo no País. Disse que foram 228 mil emplacamentos somente neste ano. Destacou, ainda, que a indústria automotiva nacional já enfrenta queda de 6,5% na produção nos primeiros seis meses deste ano, redução de 10% na venda do varejo, na comparação com o ano passado, e fechou o mês passado com perda de 600 empregos.

“Então, nesse contexto, não quero crer que o governo decidirá contra a política industrial, portanto a favor de uma redução de alíquota de imposto para algo que vá desfavorecer a industrialização brasileira. Me parece contraditório com as políticas anunciadas pelo governo federal”, avaliou.

Nesta entrevista, ele ainda analisou o cenário de concorrência e considerou que os números de produção da indústria brasileira ficarão maquiados. “Você vai produzir no País algo que é só montar e você pode virar uma grande maquila – empresas maquiladoras que realizam a manufatura parcial, encaixe ou empacotamento de um bem sem que sejam as fabricantes originais”, concluiu.

Confira abaixo os principais trechos da entrevista

Igor Calvet, presidente da Anfavea, na sede da associação, em Brasília
Igor Calvet, presidente da Anfavea, na sede da associação, em Brasília

Revisão de investimentos

“Nós anunciamos investimentos da ordem de R$ 180 bilhões. Uma decisão que, eventualmente, diminua a alíquota dos impostos de importação, tal como pedido pela BYD, fará com que esses investimentos sejam revistos. Esses recursos são absolutamente importantes para o País, no sentido de agregar o valor à produção nacional, que não é uma mera montagem, não é um mero apertar parafusos. Ao mudar as regras do jogo, as empresas instaladas no País reavaliam, obviamente, todos os investimentos que foram anunciados. É uma grande mudança. Nos R$ 180 bilhões estão incluídos também a indústria de autopeças. Mais ou menos R$ 50 bilhões”.

Impacto da importação de elétricos e híbridos

“Nós tivemos, no último mês, uma queda de produção (nacional) na ordem de 6,5%. Na venda no varejo, nós caímos 10% em relação ao primeiro semestre do ano passado. Os produtos nacionais, inclusive os que usam biocombustíveis, caíram no mercado, enquanto as importações avançaram. Já tivemos o emplacamento de 228 mil automóveis importados só nos primeiros seis meses deste ano. Isso significa uma fábrica de porte médio para grande. Uma fábrica que emprega, em média, cinco mil trabalhadores.

Expectativa sobre a decisão

“Nesse contexto, de queda de produção, de queda no mercado no varejo dos automóveis nacionais, da entrada maciça de importações, não quero crer que o governo decidirá contra a política industrial, portanto a favor de uma redução de alíquota de imposto para algo que vá desfavorecer a industrialização brasileira. Me parece contraditório com as políticas anunciadas pelo governo federal. Não me parece apropriado não só para as montadoras e fabricantes nacionais, nem para os trabalhadores, muito menos para a indústria de autopeças”.

Impacto futuro (Se forem autorizadas as tarifas de 5 e 10%)

Na China o imposto para se fazer CKD e SKD é 15%. Então o pedido é inclusive de taxa menor do que é praticada na China. Essa redução é na ordem de dez pontos porcentuais. Imagina que os veículos estão sendo importados prontos a 25%. Quando vier SKD e CKD a 10 ou 5% vai haver uma expansão. Hoje já há emplacamento de 228 mil veículos. Então vamos ver uma expansão de uns 30% a mais desses veículos, sendo apenas parafusados no País. E terá queda de produção associada. Agora esses números são preliminares. Não vai ter autopeças associadas.

Produção nacional

No momento que isso for feito (a redução da tarifa e aumento do sistema SKD e CKD no Brasil), essa produção em largo volume será considerada produção nacional. E é muito difícil dizer isso, porque estaremos produzindo aqui, mas é produção de baixa sofisticação. Você vai produzir no País algo que é só montar e você pode virar uma grande maquila – empresas maquiladoras que realizam a manufatura parcial, encaixe ou empacotamento de um bem sem que sejam as fabricantes originais. É isso que não podemos deixar acontecer. Pode ter risco de aumentar a importação de kits também. Pode acontecer a pilhagem do mercado brasileiro com fachada de produção nacional. Haverá desequilíbrio concorrencial muito grande.

 

 

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