31 de julho de 2025
Politica

Bolsonarismo paulista rejeita candidatura de Ricardo Nunes ao governo de São Paulo

A candidatura de Ricardo Nunes (MDB) ao governo de São Paulo enfrenta forte resistência do bolsonarismo paulista, que, em sua maioria, descarta apoiar outra empreitada eleitoral do prefeito. Para o grupo, o apoio à reeleição do emedebista no ano passado custou caro ao campo, sobretudo pela presença do ex-coach Pablo Marçal (PRTB) na disputa — nome com apelo ideológico e identificação com eleitorado de Jair Bolsonaro (PL). Agora, aliados do ex-presidente defendem que a eventual sucessão de Tarcísio de Freitas (Republicanos) seja disputada por um nome com identidade clara com a direita. Procurado, Nunes afirmou que pretende cumprir os quatro anos de mandato. Disse ainda que estão “atacando o lado errado” e que continua “focado em resultado”.

Embora negue publicamente, Nunes já se movimenta nos bastidores para disputar o Palácio dos Bandeirantes, ainda que o plano esteja atrelado à candidatura presidencial de Tarcísio, que segue incerta. Nos corredores do Edifício Matarazzo — sede do Poder Executivo paulistano — o projeto eleitoral do emedebista é tratado abertamente, o que tem irritado bolsonaristas, que insistem no discurso de que Bolsonaro será candidato e Tarcísio disputará a reeleição para o governo estadual.

Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apoiou a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) em São Paulo
Ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) apoiou a reeleição de Ricardo Nunes (MDB) em São Paulo

A tensão entre Nunes e os bolsonaristas cresceu após o secretário municipal de Segurança Urbana, Orlando Morando, divulgar em uma rede social uma pesquisa em que o prefeito aparece liderando a corrida pelo governo paulista. Na legenda, Morando escreveu: “Tarcísio de Freitas presidente e Ricardo Nunes governador”. Nunes diz que não foi consultado sobre a publicação e que não endossa o conteúdo, mas outros aliados seus compartilharam posts semelhantes.

“O que mais me incomoda é ver pessoas que foram apoiadas pelo presidente Bolsonaro e pelo governador Tarcísio — e isso não se limita ao Nunes — colocando a carroça na frente dos bois”, afirma o deputado estadual Lucas Bove (PL), um dos bolsonaristas mais próximos do ex-presidente na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). “O Nunes teve uma eleição difícil. Acredito que ele tem um compromisso com a cidade e deveria ficar os quatro anos do mandato. Todos nós nos envolvemos na campanha dele e esperamos, no mínimo, que ele aguarde a decisão do presidente Bolsonaro antes de se lançar como candidato ao governo.”

Embora reafirme que não trabalha hoje com a possibilidade de Tarcísio ser candidato à Presidência, Bove entende que a eventual sucessão do governador passa pelo crivo do Partido Liberal, dono das maiores bancadas da Câmara dos Deputados e da Assembleia paulista.

“Na composição de 2022, abrimos mão da candidatura ao governo de São Paulo para apoiar o Tarcísio, que se filiou ao Republicanos em comum acordo com o presidente Bolsonaro. Na situação hipotética de Tarcísio ser alçado à disputa nacional no ano que vem, o PL precisa ter candidato próprio em São Paulo e ser protagonista”, declara o deputado.

Bove acredita que Nunes terá dificuldade para tirar a candidatura estadual do papel. Não só pela resistência do bolsonarismo, mas por conta do vice-prefeito Ricardo Mello Araújo (PL), que assumiria a gestão municipal em seu lugar. “Muita gente não quer alguém com o perfil do Mello no comando da Prefeitura. É um perfil que a política não gosta.”

Também integrante da bancada bolsonarista da Alesp, o deputado Tenente Coimbra (PL) engrossa a lista dos que rejeitam Nunes na corrida pelo governo paulista. Assim como Bove, ele critica a movimentação precoce do prefeito e diz que falta a Nunes um posicionamento mais incisivo em relação à situação de Bolsonaro, que passou a usar tornozeleira eletrônica por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

“Quem quer o capital político da direita tem que se posicionar sobre essa perseguição política travestida de jurídica. A direita quer pessoas com posicionamento, atitude, e o Nunes só fala nas entrelinhas. Para mim, não é o candidato ideal. Respeito o trabalho dele, mas precisamos de alguém com posicionamento. Um nome que tem capacidade e capital político é o Guilherme Derrite (secretário de Segurança Pública do Tarcísio)”, diz o deputado.

Nunes criticou a ação da Polícia Federal contra o ex-presidente e a imposição de medidas cautelares pelo STF. “Eu sempre digo: todo remédio, quando exagerado, em vez de curar, faz mal. A gente tem que ter equilíbrio, calma. Não acompanho o processo, não sei os detalhes, mas deixo minha solidariedade ao presidente Jair Bolsonaro”, afirmou o prefeito, no dia da operação da PF contra o ex-presidente.

Outros bolsonaristas ouvidos reservadamente pelo Estadão reclamam que o prefeito não tem recebido aliados do grupo nem dado espaço para nomes ligados ao bolsonarismo na gestão.

Procurado, Nunes disse que “estão atacando o lado errado”. “Atacar aliados só reforça o discurso da esquerda. Espaço não se exige, se conquista com trabalho. Eu sigo focado em resultado. Quem quiser somar, que venha para construção, não para confusão”, afirmou o prefeito em nota.

Para o presidente do PL na cidade de São Paulo, vereador Isac Felix, o partido já foi contemplado com dois espaços na gestão: Luiz Fernando Machado, ex-prefeito de Jundiaí, na Secretaria de Desestatização e Parcerias; e Rodrigo Ashiuchi, ex-prefeito de Suzano, na Secretaria do Verde e do Meio Ambiente. Ambos são da Grande São Paulo e, à época das nomeações, a escolha foi interpretada também como parte de uma estratégia de Nunes com foco nas eleições de 2026. O parlamentar, que faz parte do “PL raiz”, minimizou as críticas sobre falta de espaço na Prefeitura, afirmando ser normal haver disputa quando há um grande número de partidos na coligação.

Mas nem todos os bolsonaristas se opõem à candidatura de Nunes. O deputado estadual Danilo Campetti (Republicanos), que assumiu o mandato na Alesp após uma articulação que envolveu o próprio prefeito e o governador, afirma que seguirá a orientação de Bolsonaro e Tarcísio no ano que vem.

“Nosso candidato à Presidência, mesmo inelegível, continua sendo o Bolsonaro. Também defendemos a candidatura do Tarcísio à reeleição. Qualquer outro cenário vai seguir as diretrizes estabelecidas por eles. Não tenho resistência a nenhum dos candidatos que eles possam indicar. Vamos trabalhar por quem eles quiserem”, afirma Campetti. “Se eventualmente o governador for candidato à Presidência e Bolsonaro e ele indicarem o Ricardo, vamos trabalhar por ele. Há outros cenários possíveis — como André do Prado ou (Gilberto) Kassab.”

Uma preocupação recorrente entre bolsonaristas é que, com Nunes como candidato ao governo, se repita o que ocorreu na eleição municipal do ano passado com Marçal: um nome mais identificado com a direita acabe concentrando os votos ideológicos. Por outro lado, o fato de a Prefeitura ficar nas mãos do bolsonarismo, caso Nunes vença, é visto como uma vantagem.

Aliados apontam visibilidade como trunfo

Aliados de Nunes minimizam a resistência entre bolsonaristas e dizem que o prefeito continua sendo o nome favorito para suceder Tarcísio — sobretudo por já ocupar o cargo de chefe do Executivo paulistano e ser amplamente conhecido na capital. Essa visibilidade, argumentam, é uma vantagem em relação a outros nomes cotados, como o vice-governador Felício Ramuth (PSD) e o presidente da Assembleia Legislativa, André do Prado, que ainda são desconhecidos do eleitorado.

Correligionários do prefeito costumam repetir que, caso Tarcísio dispute a Presidência, precisará abrir ao menos 20 pontos de vantagem no Estado de São Paulo sobre Lula (PT) para compensar o favoritismo do petista no Nordeste. Nesse cenário, dizem que apenas um candidato forte da direita ao governo paulista poderia garantir esse desempenho, e Nunes seria esse nome — não só por já ser conhecido, mas por ter chance real de vencer na capital, onde a direita perdeu nas últimas duas eleições para o governo do Estado.

Para o cientista político Elias Tavares, Nunes saiu fortalecido da eleição do ano passado, mas sua candidatura ao governo paulista dependerá menos do cargo que ocupa e mais da bênção de Tarcísio e da adesão orgânica do bolsonarismo.

“Nunes reúne vantagens importantes: aparece à frente nas primeiras pesquisas, tem apoio de um partido tradicional, o MDB, e conta com um trunfo estratégico pouco debatido: seu vice, o coronel Mello Araújo, que assumiria a Prefeitura caso ele renuncie para disputar o governo. Na prática, a direita manteria o controle da capital, mesmo sem vencer diretamente. Logo, se Nunes deixar o cargo, São Paulo passa automaticamente para as mãos do bolsonarismo, o que pode ser decisivo para pacificar a base conservadora em torno da sua candidatura.”

Segundo Tavares, também deve pesar a forma como a população reagirá a uma eventual renúncia do prefeito. “Historicamente, nem todo prefeito da capital que tentou o Palácio dos Bandeirantes venceu. Há um incômodo crescente no eleitorado com prefeitos que abandonam o cargo antes da metade do mandato.”

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