3 de agosto de 2025
Politica

Sinais, vieses e escaladas: é a Psicologia, estúpido!

Ficou famosa a frase de assessor político norte-americano dizendo que é a Economia que define o voto (“é a Economia, estúpido!). No entanto, isso não parece o caso da recente polêmica entre o Brasil e os EUA. Decisões recentes de Washington indicam que o conflito comercial com o Brasil é, antes de tudo, político-perceptivo. Christopher Garman (Eurasia Group) afirma que Donald Trump “se enxerga no drama” de Jair Bolsonaro e lê atos do Supremo como parte de uma escalada política, o que reduz as chances de alívio no curto prazo. Lourival Sant’Anna sustenta linha semelhante: o maior erro seria o entrincheiramento. O caminho é diplomacia ativa, coordenação fina com empresas nos EUA e coalizões bipartidária. E, sobretudo, atenção às percepções subjetivas dos envolvidos; é dela que dependem as interpretações sobre textos decisórios judiciais.

O que as Neurociências explicam sobre a mente?

Pinker, um dos mais importantes neurocientistas da atualidade, ensina que a política é um dos campos de maior incidência de vieses comportamentais (ou seja, aquela parte do cérebro responsável por decisões intuitivas, rápidas). Cass Sunstein trouxe esses ensinamentos para o Direito em sua obra Nudge.

Todavia, muitos juristas brasileiros focam sua análise na dogmática jurídica (com vieses políticos, na maior parte das vezes, diga-se de passagem): a consistência teórico-jurídica das decisões do STF envolvendo o ex presidente Bolsonaro. O problema, aqui, é como os textos (sinais emitidos pelo STF) são percebidos e interpretados pelo governo norte-americano. Em cenários polarizados, vieses como identificação moral tribal, heurística do afeto e viés de confirmação distorcem a leitura de fatos: envolvidos na disputa política selecionam evidências que reforcem percepções e posicionamentos prévios. Se Trump se identifica com Bolsonaro, como dizem especialistas, ele tende a perceber e reinterpretar medidas judiciais (ordens a plataformas, bloqueios de contas, restrições cautelares) como provas de perseguição, mesmo quando, eventualmente, amparadas em uma racionalidade jurídica. Esse mapeamento perceptivo é o que aciona respostas decisórias.

Não vamos esquecer inclusive que foi a esquerda brasileira quem trabalhou anos (durante os tempos de Lava Jato) contra a legitimidade das cortes brasileiras, inclusive do STF. Então nem se pode culpar o Poder Executivo norte-americano pelo ruído comunicacional.

Teoria dos jogos: evitar sinais de confronto

A maioria dos ministros do STF reconhece que a política foi judicializada e que parte de toda a vida dos brasileiros passa pelo Poder Judiciário. Nesse cenário, não há mais como trabalhar apenas com a teoria jurídica lógico-formal e não há mais como separar, no plano da realidade empírica, pelo menos na percepção das pessoas sem formação jurídica, entre política e Direito. Então é preciso que juristas ampliem horizontes e sua caixa de ferramentas como é o caso da teoria dos jogos, da Psicologia e das Neurociências.

No curto prazo, assim, importa reduzir incentivos à escalada. Em jogos repetidos, sinais ruidosos geram ciclos de retaliação. Minimizar sinais públicos de punição política e maximizar sinais procedimentais de devido processo legal diminui o payoff doméstico da escalada americana e abre espaço para exclusões na implementação ou na futura migração da medida para um trilho Section 301.

O que o STF e o Executivo podem fazer

  1. Sinal procedimental, não punitivo. Reforçar publicamente que decisões sensíveis seguirão parâmetros de devido processo, acesso da defesa aos autos, motivação densa e proporcionalidade. Evitar, quando possível, medidas que possam ser lidas como punição extraprocessual aos olhos de um agente político estrangeiro como medidas cautelares de ofício.
  2. Separação de arenas. Desacoplar contencioso criminal de embates de comunicação. Comunicar em inglês notas técnicas que expliquem a base jurídica das decisões, com benchmarks comparados, reduzindo espaço para leituras de viés político.
  3. Evitar gatilhos de escalada. Medidas com alto custo simbólico internacional (p.ex., ordens amplas a plataformas ou congelamentos percebidos como coletivos) devem ser estritamente justificadas, com escopo limitado, prazo e possibilidade de recorrer explícitos. Isso reduz o payoff político da escalada nos EUA.
  4. Humildade republicana e cuidado com próprios vieses: o STF deve estar também preparado para receber críticas por eventuais excessos vindo de setores e segmentos da sociedade.

Conclusão: decidir bem é decidir prevendo reações

A Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (a lei que regula a aplicação do Direito no país) exige que decisões dos magistrados considerem consequências práticas. Num ambiente em que percepções e vieses pesam mais que silogismos embasados em dogmática, Psicologia, Neurociências e teoria dos jogos oferecem melhores lentes para prever reações e minimizar danos.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *