3 de agosto de 2025
Politica

Líder da campanha global para aprovação da Magnitsky critica punição a Moraes: ‘Momento vergonhoso’

NOVA YORK – O ativista político William Browder vê ‘uso indevido’ da Lei Magnitsky aplicada ao ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Na sua avaliação, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se valeu da legislação para solucionar questões políticas. “Isso se trata de resolver questões políticas para Donald Trump e não tem nada a ver com alegações de abuso de direitos humanos”, disse Browder, em entrevista exclusiva ao Estadão/Broadcast. Ele também chamou a situação de “momento vergonhoso”.

Browder ficou conhecido por sua campanha global para a aprovação da Lei Magnitsky nos EUA. O britânico, nascido em território americano, foi o maior investidor estrangeiro na Rússia até 2005, quando foi considerado uma ‘ameaça nacional’.

Em 2008, o seu advogado, Sergei Magnitsky, descobriu uma fraude cometida por funcionários do governo russo que envolvia o roubo de US$ 230 milhões em impostos estaduais. Posteriormente, ele foi preso, torturado e morto em uma cadeia na Rússia. De lá para cá, Browder começou uma batalha global para que os países adotassem a Lei Magnitsky. Hoje, Canadá, Reino Unido, os países bálticos, a União Europeia e, mais recentemente, a Austrália têm suas próprias versões. E ele segue tentando ampliar o leque em nações como Nova Zelândia e Japão.

O ativismo fez Browder deixar o mundo dos negócios há cerca de dez anos. O seu fundo global chegou a deter uma fatia de quase 10% investida no Brasil. Todos os recursos estavam aplicados na Telemar, antigo nome da operadora Oi. Browder também foi sócio de Edmond Safra, da família dona do banco que leva o mesmo nome. Ele diz que hoje não conduz mais negócios em nenhum país. “Agora sou um ativista político em tempo integral”, afirma.

William Browder, ativista político e líder da campanha global pela Lei Magnitsky, critica uso da legislação contra Alexandre de Moraes
William Browder, ativista político e líder da campanha global pela Lei Magnitsky, critica uso da legislação contra Alexandre de Moraes

Neste momento, está começando a escrever o seu terceiro livro. E a obra deve ter um espaço para discorrer sobre a aplicação da Lei Magnitsky em Moraes. “É um momento vergonhoso que preciso discutir, com certeza”, diz. Veja abaixo, os principais trechos da entrevista:

Você disse que passou anos lutando para que a Lei Magnitsky fosse aprovada para acabar com a impunidade contra abusadores graves de direitos humanos e cleptocratas e que o Alexandre de Moraes não se enquadra em nenhuma dessas categorias. Por quê?

Bem, eu não sou especialista no ministro Alexandre de Moraes ou na situação política brasileira, mas é óbvio, de onde estou, que isso se trata de resolver questões políticas para Donald Trump e não tem nada a ver com alegações de abuso de direitos humanos. Em outras palavras, não li em lugar nenhum que Moraes esteve envolvido em tortura ou autorizou tortura, e não estou ciente de nenhuma alegação de que ele seja bilionário por causa de subornos judiciais. Ninguém está dizendo nenhuma dessas duas coisas, e essas são as bases pelas quais as pessoas são sancionadas sob a Lei Magnitsky. Isso é obviamente um uso indevido da Lei Magnitsky para resolver questões políticas, não está no espírito da legislação.

A aplicação da Lei Magnitsky em um ministro brasileiro é uma história para um novo livro?

Estou começando a escrever meu terceiro livro e tenho certeza de que vou abordar essa questão nele. Não posso imaginar que não apareceria. É um momento vergonhoso que preciso discutir, com certeza.

Que impacto este caso pode ter na Lei Magnitsky?

Não acho que isso tenha qualquer impacto na Lei Magnitsky. No final das contas, Donald Trump está usando todos os tipos de legislação para os propósitos errados. A base pela qual ele está aplicando tarifas é o uso indevido da Lei de Poderes de Emergência Internacional. A base pela qual ele está prendendo imigrantes é a Lei de Inimigos Estrangeiros. Toda legislação deve ser usada de forma responsável e no espírito para o qual foi criada. E este é apenas mais um exemplo de uso indevido de uma boa legislação para propósitos ulteriores.

O presidente Trump está colocando a democracia americana em risco?

Esta é uma questão muito mais ampla. O presidente Trump está abusando das leis dos EUA para seus próprios propósitos políticos e, claro, isso é muito frustrante para muitos americanos que querem que os Estados Unidos sejam um país de estado de direito. Acho que ele está colocando o estado de direito em risco ao abusar das leis de forma tão flagrante.

A aplicação da Lei Magnitsky ao ministro Alexandre de Moraes poderia ter impactos nos bancos no Brasil, no sistema financeiro brasileiro?

Duvido muito. Muitas pessoas, por exemplo, foram sancionadas. Então, deixe-me dar um exemplo. Há muitos russos que estão na lista de sanções dos EUA, que estão comprando propriedades e com conta bancária em Dubai, e o sistema financeiro de Dubai está indo muito bem. Não acho que haja qualquer risco para o sistema financeiro brasileiro por conta disso.

Nesta semana, senadores brasileiros viajaram a Washington para apaziguar as relações com os EUA após as tarifas de Trump. Senadores americanos alertaram que o Brasil poderia sofrer novas sanções dos EUA devido aos seus laços com a Rússia – no petróleo, por exemplo, enquanto eles se preparam para votar uma lei com esse intuito. Este é o caminho para parar a guerra?

Estão confundindo duas questões muito opostas. O Brasil não deveria estar ajudando a Rússia em sua guerra na Ucrânia e, ao comprar petróleo russo, está fazendo isso. O Brasil merece ser punido por ajudar (o presidente da Rússia, Vladimir) Putin. Isso é uma coisa totalmente diferente, e é totalmente legítimo. A sanção de um ministro que está atacando um amigo de Trump é um uso ilegítimo de sanções.

Mas no caso dos fertilizantes, o Brasil depende da Rússia…

Browder: Bem, pelo que sei, as empresas russas de fertilizantes não estão sancionadas, mas as empresas russas de petróleo estão, e essas sanções estão relacionadas ao petróleo russo. Não ouvi nada sobre fertilizantes.

A guerra entre a Rússia e a Ucrânia dura mais de três anos. O presidente Trump deu ao presidente Putin 10 dias para acabar com a guerra, e ele tem conseguido tudo o que quer. Trump será capaz de acabar com a guerra? Qual é a sua opinião?

Tenho ficado muito frustrado com Trump desde que ele assumiu o poder, porque ele afirmou que queria acabar com a guerra e fez vários ultimatos a Putin para acabar com a guerra. Ele fez cinco ultimatos e não os cumpriu. Então, até eu vê-lo realmente cumprir, não acho que ele acabará com a guerra, mas talvez agora seja o momento em que ele finalmente perca a paciência. Difícil dizer, acho que temos que esperar para ver.

Os países têm dado a Trump o que ele quer, como vimos no acordo com a União Europeia, o Brasil parece que não. Por quê?

Acho que o Brasil está realmente entre a cruz e a espada, porque o que Trump está pedindo, basicamente, é um perdão para o ex-presidente Jair Bolsonaro, que está passando por um processo legal legítimo. E Trump destruir completamente as relações comerciais com o Brasil por causa de sua amizade com Bolsonaro é um completo abuso de poder e um uso indevido das tarifas.

O Brasil tem surpreendido em termos de crescimento, mesmo com as taxas de juros mais altas do mundo. Qual é a sua opinião sobre a economia brasileira?

O Brasil é o país do futuro, e sempre será.

Por quê?

Acho que é por causa da má gestão econômica, corrupção, políticas populistas, há uma série de questões diferentes no Brasil. Não sou especialista no Brasil, mas, à distância, parece haver muitos problemas que o tornam um país do futuro, e não um país do presente.

No passado, o senhor destacou, em uma entrevista para nós, a base de recursos naturais no Brasil. Os Estados Unidos estão de olho nos minerais críticos do Brasil, e também de outros países. Como essa questão pode estar na mesa de negociações entre os EUA e o Brasil?

Do ponto de vista estratégico, Trump quer esses minerais e não quer que a China tenha domínio sobre os EUA, então isso pode ser um bom ponto de alavancagem para o Brasil.

 

 

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