Da poltrona palaciana à cadeira gamer: relatos de Bolsonaro e sua prisão domiciliar
O capitão reformado Jair Messias Bolsonaro teve o privilégio de sentar, por quatro anos, na cadeira mais importante da República: feita de madeira e couro, ela fica atrás de uma uma ampla mesa no terceiro andar do Palácio do Planalto. Pouco mais de dois anos depois de pegar o avião presidencial para evitar passar a faixa para Lula, o ex-presidente se senta hoje numa cadeira bem mais comum, num sala sem toda a pompa e circunstância de um dos palácios desenhados por Oscar Niemeyer.
Na casa em que cumpre a prisão domiciliar determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, Bolsonaro usa uma cadeira projetada para jogadores de videogame, que faz conjunto com uma TV de mais de 60 polegadas, pregada na parede.
É nesse ambiente que o ex-presidente recebe suas visitas — que precisam pedir autorização ao ministro Moraes. O atendimento também não tem os requintes e mordomias dos palácios e gabinetes de Brasília. Quem traz a água e o café, muitas vezes, é a ex-primeira dama Michelle Bolsonaro. O tailleur e o terno deram lugar aos moletons esportivos para o ex-casal presidencial.
Quem já esteve por lá diz que é uma visão triste. “Ele, muitas vezes chora, tem crises de soluços sem parar, não se conforma com a situação e repete que não fez nada para merecer isso”, conta o ex-ministro da Casa Civil, senador Ciro Nogueira, presidente do PP, um dos poucos que já foram visitar o ex-presidente em sua casa, num condomínio fechado a poucos quilômetros dos palácios do Planalto e da Alvorada.

É difícil, para muitos, entender quando o ex-presidente diz para seus aliados que “não fez nada” que justifique sua atual situação. A história não é bem assim.
Bolsonaro, que está usando tornozeleira eletrônica, fez e muito. Inconformado por ver que perderia a reeleição, juntou um grupo – incluindo o general reformado Braga Netto, seu braço direito nas artimanhas e que encara atualmente outro tipo de prisão – e iniciou uma campanha. Foram idas e vindas, mentiras, trapaças, lorotas e difamações para preparar um golpe de Estado e impedir que Lula, vencedor da eleição, tomasse posse.
Mas o 8 de janeiro, o dia D, não deu certo. Agora, vários dos envolvidos cumprem mandados de prisão. Braga Netto está trancafiado há mais de seis meses em uma cela especial na 1ª Divisão do Exército, no Rio de Janeiro – sem perspectivas de voltar às areias de Copacabana para os jogos de vôlei com companheiros de turma.
Bolsonaro repete às visitas que “nunca fez mal a ninguém”. Entretanto, quem o vê percebe o medo que aumenta dia após dia com a aproximação do julgamento e a possibilidade de ser condenado. Porque mesmo que consiga direito à prisão domiciliar, não terá direito a praticamente nada, além das fronteiras das paredes da casa no Jardim Botânico da capital federal.
Segundo uma fonte ouvida pela coluna, Bolsonaro poderia ter ficado em uma casa bem melhor, que lhe foi oferecida por correligionários com um aluguel – que ele não pagaria, pois seria emprestada, de R$ 40 mil. Ele não quis. Preferiu ficar onde esta atualmente, também sem custos de aluguel.
A tristeza do ex-presidente também tem frutos na família. Quem esteve por lá garante que Bolsonaro não está nada feliz com o resultado das movimentações do filho Eduardo na terra de Donald Trump. Ver diversos setores da economia brasileira amargando tarifas de 50% não favorece ninguém e afasta seguidores, pondera o ex-presidente.
Para piorar a situação, Michelle poderá deslanchar sua carreira política e quem sabe até virar senadora. Carlos pensa em mudar seu endereço eleitoral do Rio para Santa Catarina e também concorrer ao Senado.
A estratégia que antes o entusiasmava, por que poderia ajudar a aprovar o impeachment de ministros do STF, agora o aborrece. Ele terá sua influência reduzida drasticamente na escolha e na campanha do candidato da direita. Mesmo que vença um dos candidatos que resolva apoiar.
Num passado já distante, uma das brincadeiras comuns entre crianças era fazer castelos de cartas. Bolsonaro – longe de ser uma criança e sabedor das consequências de seus atos – fez o seu. O castelo caiu.