15 de agosto de 2025
Politica

Agosto Lilás: entenda como o STF pode pôr um fim a uma omissão histórica do Estado

O Agosto Lilás, mês dedicado à conscientização e ao enfrentamento da violência doméstica e familiar contra a mulher, é um mês simbólico de reflexão sobre as causas estruturais dessa violência, seus impactos sociais, econômicos e laborais, e a urgência de ações coordenadas para preveni-la, enfrentá-la e erradicá-la, para que o setor público e o privado reflitam sobre seu papel na prevenção e no combate a essa grave violação de direitos humanos.

Para as empresas, acompanhar e se alinhar aos avanços dessa pauta não é apenas uma questão de responsabilidade social, mas de conformidade com compromissos nacionais e internacionais assumidos pelo Brasil e de promoção de um ambiente de trabalho mais seguro, saudável e produtivo.

No contexto dessa campanha, lembramos da Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.º 1242, que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) e discute a omissão histórica do Estado no enfrentamento à violência contra as mulheres.

Se os pedidos feitos na APDF n.º 1242 forem julgados procedentes, será reconhecido o estado de coisas inconstitucional no âmbito do Estado Federal Brasileiro, caracterizado pela violação massiva a direitos fundamentais das mulheres vítimas de violência doméstica. Em assim sendo, espera-se que haja o fortalecimento das políticas públicas e do sistema de proteção contra a violência doméstica e familiar no Brasil, a fim de se brecar o recorrente e significativo aumento dos índices de feminicídios e demais violências contra as mulheres.

Nesse sentido, vale lembrar que no ano de 2022 foram registrados 3.934 homicídios contra mulheres e 1.455 feminicídios. Em 2023, contabilizou-se 3.930 mulheres vítimas de homicídios e 1.467 de feminícidio[1]. Já em 2024, foram registrados 1.459 casos de feminicídios[2], mesmo ano em que a Justiça brasileira julgou 10.991 processos de feminicídio[3].

Trata-se de um quadro sistemático, alimentado pelo machismo, patriarcalismo, omissão histórica do Estado e pela fragmentação das políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica e familiar contra as mulheres.

Seus efeitos se estendem, inclusive, ao mundo do trabalho, comprometendo o exercício do direito fundamental ao trabalho digno e seguro, já que mulheres em situação de violência, não raramente, enfrentam a perda do emprego ou a necessidade de afastamento para garantir sua integridade física e psicológica, seja para fugir do agressor, seja para cuidar de questões judiciais e familiares decorrentes da violência sofrida. Tudo isso pode ocasionar baixa produtividade, sofrimento psicológico, baixa autoestima, bem como prejudicar a assiduidade e a pontualidade no trabalho.

A ausência de políticas de acolhimento e proteção leva à estigmatização dessas trabalhadoras, reforçando ciclos de exclusão e vulnerabilidade econômica. Nesse ponto, vale destacar que 66% das mulheres sem renda ou com renda insuficiente afirmaram ter sofrido violência doméstica, entre elas, 39% não possuem renda suficiente para se manter, e 27% não têm fonte de renda[4].

Em razão disso, a ADPF n.º 1242 se mostra bastante relevante, pois exige a implementação de um plano nacional integrado, com metas mensuráveis, financiamento adequado e supervisão contínua, capaz de articular as ações entre os entes federativos e assegurar a oferta de serviços essenciais de acolhimento, proteção e atendimento às mulheres em situação de violência.

O que é essencial, pois, ao fortalecer a coordenação entre os entes federativos, cria-se um ambiente mais propício para que outros atores, como empresas e organizações da sociedade civil, também alinhem suas práticas aos compromissos assumidos pelo Brasil perante organismos internacionais, num fortalecimento que pode favorecer, de forma indireta mas concreta, a adoção de medidas complementares no setor privado, como licenças remuneradas para vítimas, programas de reinserção no mercado de trabalho, protocolos empresariais de proteção e ações educativas voltadas a empregadores e equipes.

Percebe-se, portanto, que a ação pode ter o efeito de irradiação normativa e prática, capaz de ampliar o alcance das políticas públicas e contribuir para a autonomia econômica das mulheres, rompendo com a lógica de dependência que sustenta o ciclo da violência.

Dessa forma, não há dúvidas de que a procedência da referida ADPF e a adoção imediata do plano nacional proposto, com medidas concretas, prazos definidos e controle social, são um instrumento potente para assegurar a plena efetividade dos mecanismos de prevenção, proteção e combate à violência doméstica e familiar contra a mulher, garantindo melhores condições de trabalho para as mulheres.

Diante disso, entendemos que é impossível combater a violência doméstica, a desigualdade de gênero no mercado de trabalho e a pobreza do país sem a efetividade da Lei Maria da Penha. E, para o setor empresarial, acompanhar e incorporar essas diretrizes é, além de uma boa prática, um passo estratégico para construir ambientes de trabalho capazes de proteger talentos, reduzir passivos e reforçar a imagem institucional.

[1] AGÊNCIA PATRÍCIA GALVÃO. 18 Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024. Disponível em: https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/dados-e-fontes/pesquisa/18o-anuario-brasileiro-de-se guranca-publica-fbsp-2024/ Acesso em: agosto. 2025.

[2] CNN. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/feminicidio-quatro-mulheres-sao-assassinadas-por-dia-no-brasil/ Acesso em: agosto. 2025.

[3] CNJ. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/novo-painel-da-violencia-contra-a-mulher-e-lancado-durante-sessao-ordinaria-do-cnj/ Acesso em: agosto. 2025.

[4] Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher Negra. Senado Federal. 2024. Disponível em: https://www.senado.leg.br/institucional/datasenado/relatorio_online/pesquisa_violencia_mulheres_negras/2024/interativo.html Acesso em: Agosto 2025.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *