Mãos que cuidam
Em um cenário hospitalar marcado por máquinas, protocolos e diagnósticos, um gesto simples tem revelado um poder silencioso, porém profundo: o toque. Desde 2003, a prática da massoterapia hospitalar voluntária tem transformado a rotina de pacientes internados e profissionais da saúde em diversas instituições do Brasil.
Em 2012, os atendimentos foram iniciados no Instituto de Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo, com a massoterapeuta Rosana Ades, pioneira na adaptação de um modelo norte-americano de massagem para o ambiente hospitalar, inspirado nos estudos da especialista Gayle MacDonald. Ao lado da médica infectologista Dra. Glória Brunetti, idealizadora do Voluntariado Emílio Ribas (VER), Rosana iniciou o projeto “Mãos que Cuidam”, oferecendo conforto físico e emocional a pacientes fragilizados por tratamentos invasivos, dores crônicas e a solidão. A técnica utilizada, baseada em toques leves e atenção plena, demonstrou benefícios como alívio da dor, redução da ansiedade, melhora do sono e resgate da dignidade. “O toque é uma linguagem universal. Ele rompe o isolamento emocional e nos lembra que, mesmo em meio à dor, ainda é possível sentir cuidado”, afirma Rosana. O projeto segue ativo, agora conduzido por Mônica Ungar, que destaca os aprendizados mútuos entre paciente e profissional. “A vivência no hospital exige do terapeuta uma escuta sensível e olhar atento à pele, aos acessos, ao emocional. É uma experiência de entrega”, relata.
Em 2012, a fisioterapeuta Vilma Natividade liderou o projeto “Doutores da Beleza” no setor de queimados do Hospital Municipal Dr. Cármino Caricchio, em São Paulo. Ali, técnicas suaves como a calatonia eram aplicadas para amenizar dores intensas sem encostar nas feridas. Vilma levou a proposta à Baixada Santista, atuando em hospitais como a Santa Casa de Santos e o Hospital Ana Costa. Posteriormente, já como docente da Universidade Anhembi Morumbi, coordenou ações semelhantes em hospitais da Beneficência Portuguesa, onde alunas do curso de Estética atuavam como voluntárias nos setores de oncologia e maternidade. “Os alunos que participam dessas ações desenvolvem um olhar mais humano e uma sensibilidade que não se ensina apenas em sala de aula”, destaca Vilma.
No interior paulista, a esteticista Vanessa Menezes também tem promovido essa transformação. Após iniciar seu trabalho no Hospital das Clínicas de Botucatu, ela passou a atuar com estética paliativa em São Manuel, levando afeto, dignidade e alívio a pacientes em fase avançada de doenças. “Na estética paliativa, o foco não está na aparência, mas na escuta, no acolhimento e na reconstrução da autoestima em um corpo fragilizado”, explica.
As evidências científicas reforçam o impacto da massagem hospitalar: estudos indicam que a prática pode ajudar a reduzir sintomas como dor, náusea, fadiga e ansiedade, sendo uma aliada importante no cuidado integral, especialmente em pacientes com câncer.
Na FMU (Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas), como coordenadora do curso de Estética e Cosmética, decidi levar essa experiência para dentro da formação acadêmica. Fui voluntária por dois anos e vivi momentos que mudaram minha forma de ver o cuidado. Essa vivência transforma os alunos e toca também quem está sendo tocado. Hoje, o projeto é liderado pela professora Fabiana Tejeda, que acompanha alunos em atendimentos voluntários no Hospital Beneficência Portuguesa. As massagens são oferecidas a pacientes oncológicos, em cuidados paliativos, e também a acompanhantes em UTIs pediátricas. “Não estamos apenas oferecendo uma massagem, mas um coração que pulsa a cada gesto. Ser voluntária é me doar com alma, fé e um amor que não cabe em palavras”, diz Fabiana.
O que começou como um gesto isolado tornou-se uma rede silenciosa e potente de profissionais da saúde, da estética e do bem-estar. Uma rede que se expande, que acolhe com mãos firmes e corações atentos. E que lembra, todos os dias, que cuidar também é tocar. E que, muitas vezes, o maior alívio está justamente naquilo que não precisa ser dito — mas sentido.