5 de outubro de 2025
Politica

Tirem o elefante da sala

Há um elefante no centro do plenário da Câmara dos Deputados. Todos o veem, todos falam dele nos corredores, mas, quando chega a hora de encarar a questão, alguns dos líderes desviam o olhar. O PL da Anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro voltou a ser adiado. Mais uma vez.

Na última semana, o presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), anunciou que a prioridade da pauta será a criação de uma comissão geral para discutir medidas de proteção a crianças e adolescentes no ambiente digital. Tema importante, legítimo, urgente. Mas também conveniente para empurrar para depois aquilo que incomoda, e que divide, Brasília.

Não é segredo que a decisão de adiar o debate sobre a anistia, e mais recentemente o fim do foro privilegiado, é uma resposta política à oposição. Ela pode ser interpretada como uma espécie de castigo pelo bloqueio da pauta na semana passada, quando deputados realizaram uma obstrução e um motim para pressionar pela votação imediata desses temas.

Pesquisa da Atlas apontou a divisão da proposta entre os brasileiros, com 51,2% sendo contrários a uma anistia “ampla, geral e irrestrita” aos eventos relacionados em 8 de janeiro, ante 46,9% que apoiam a anistia. A discussão, porém, não nasceu ontem. Quando o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) convocou seus apoiadores às ruas, em 26 de fevereiro de 2024, seu discurso de 15 minutos trouxe uma proposta que, em meio a tantos outros pontos, acabou repercutindo pouco: conceder anistia como forma de “tirar o elefante da sala”. A lógica era simples: encerrar um ciclo de processos e penas consideradas desproporcionais a centenas de pessoas comuns que participaram daquele evento e, com isso, destravar o debate nacional sobre economia, reformas e a agenda legislativa que o país precisa.

A ideia demorou meses para ganhar fôlego, mas acabou entrando no xadrez político da eleição para a presidência da Câmara, vencida por Motta. Em Brasília, apoios e votos circularam também com esse compromisso, mas ela não avançou no primeiro semestre. Pesquisa parlamentar do Ranking dos Políticos em fevereiro mostrou que naquele momento 50% dos deputados e 46,2% dos senadores eram favoráveis. Em outras palavras, não há certeza de qual lado venceria se o tema for levado à votação. Contudo, independentemente do mérito jurídico ou moral da proposta, uma coisa é certa: escondê-la não resolve nada. Se a Câmara aprovar, a pressão se desloca para o Senado e para o STF, que poderia responder acatando a sugestão do jurista e ex-presidente Michel Temer (MDB), de modular efeitos e calibrar sentenças. Se rejeitar, o assunto perde força e o país pode, enfim, seguir para outros debates, também urgentes e necessários.

O economista Frank Knight, em sua teoria da incerteza, diferenciava risco de incerteza: o risco pode ser mensurado, calculado, administrado; a incerteza, não. Ela corrói decisões, distorce expectativas e imobiliza a ação. Ao adiar indefinidamente a deliberação sobre a anistia, o Congresso não apenas posterga um voto, mas instala esse tipo de incerteza paralisante no centro da política, mantendo o clima de tensão, paralisando parte da agenda e alimentando o ressentimento político. E, como Knight já alertava, é nesse vácuo que o custo invisível de nada decidir se torna mais alto do que o de qualquer escolha concreta.

 

 

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