Crise chega à Defesa: governo alega falta de recursos e cancela exercícios militares com EUA
O governo brasileiro decidiu cancelar as operações de treinamento conjunto com militares americanos que seriam feitas em setembro e outubro em solo brasileiro. A medida atinge as operações Formosa e Core. A primeiro devia ocorrer no Planalto Central. A segunda, na região da caatinga.

A decisão foi tomada após reunião entre o ministro da Defesa José Múcio Monteiro Filho e os comandantes das Forças Armadas, quase um mês depois de o Southern Com americano cancelar um evento que envolvia Forças Aérea Brasileira (FAB) e o US Space Command, a força aeroespacial americana. Diante do risco de novos atritos em razão dos exercícios, a decisão foi cancelar todos, ainda que outras nações participassem dos eventos.
A alegação oficial é que se trata de economia. Os parcos recursos da Defesa em um ano cujas finanças públicas já estariam comprometidas para atender a outras emergências, como os gastos extras provocados pelo tarifaço imposto pelo presidente americano Donald Trump, estariam entre os motivos. Mas no caso da Operação Formosa, o deslocamento de 2.000 fuzileiros navais e de seus meios da sede do Corpo de Fuzileiros, no Rio de Janeiro, para Goiás está mantido. Trata-se, portanto, de manter a parte mais custosa da operação.

Ela foi acostada em outra operação de treinamento, só que coordenada pelo Ministério da Defesa: a Operação Atlas, que envolverá ainda efetivos do Exército e da Força Aérea em um exercício que pretende verificar a interoperabilidade das Forças Armadas em um ambiente em que se busca cada vez mais testar a prontidão e as capacidades logísticas diante de instabilidades geopolíticas, como as que envolvem a Venezuela.
Só a segunda fase da Operação Formosa foi suspensa. É ela que contaria coma presença confirmada de uma dezena de nações – os Estados Unidos foram convidados, mas não haviam confirmado a participação. No ano passado, os americanos enviaram um efetivo de 62 militares. A China, que fora convidada e enviara um efetivo com 33 fuzileiros em 2024 para a operação, já havia dito que não mandaria ninguém neste ano.
Os franceses já haviam confirmado a participação neste ano com um efetivo de 82 homens. Seria a primeira vez da 9.ª Brigada do Exército francês, a força anfíbia daquele país, participaria da operação. Também deviam estar presentes com efetivos a Bolívia, o Paraguai, o Equador e a Namíbia. E iam enviar observadores as marinhas da Grã-Bretanha e do Chile. O exercício estava previsto para setembro.

A decisão brasileira ocorreu em um momento em que a tensão entre Brasil e Estados Unidos aumentou em razão de disputas comerciais iniciadas pelo tarifaço americano e pelas sanções do presidente americano, Donald Trump, contra ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) em razão do processo por tentativa de golpe contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Em nota oficial, a Marinha informou ao Estadão que a decisão de cancelar o exercício “decorre da prioridade atribuída à Operação Atlas – Armas Combinadas, exercício conjunto das Forças Armadas brasileiras que contará com ampla mobilização logística, deslocamento estratégico de meios e emprego de tropas em larga escala”.
De acordo com a Força Naval, o problema seria orçamentário. “Diante da amplitude operacional e recursos orçamentários necessários à Operação Atlas, a Marinha do Brasil cancelou a edição de 2025 da Operação Formosa, reafirmando seu compromisso com a integração das Forças Armadas e a preparação conjunta para a defesa dos interesses nacionais”.
Já a Operação Core deveria envolver efetivos do Comando Militar do Nordeste e do Southern Com, o comando Sul dos Estados Unidos, a exemplo do que ocorre desde 2019. No ano passado, ela envolveu o treinamento de militares brasileiros e americanos na Amazônia.
O Exército ainda não confirmou o cancelamento da operação, mas o Estadão apurou que ela terá o mesmo destino da Formosa. Razões orçamentárias serão alegadas também nesse caso para a sua não realização. O gasto previsto era de R$ 30 milhões.
Outra ação que entrou como justificativa para o cancelamento da Formosa foi a Operação COP-30. Caberá ao Ministério da Defesa cuidar de parte da segurança dos chefes de Estado e autoridades envolvidas na conferência do clima das Nações Unidas. Procurado, o ministro José Múcio não se manifestou.