Tensão de Tarcísio com família Bolsonaro cresce, mas aliados negam qualquer risco de ruptura
SÃO PAULO – A tensão entre o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), e a família do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) está cada vez mais evidente após desdobramentos do tarifaço e do julgamento contra o capitão reformado. Apesar de críticas contundentes ao governador por parte do “núcleo duro” do bolsonarismo, o entorno de Tarcísio afirma não temer retaliações ou um possível rompimento entre o governador e o ex-presidente.
Um aliado próximo à família Bolsonaro afirmou ao Estadão/Broadcast que o recuo de Tarcísio em culpar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pelas sobretaxas impostas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi a segunda vez que o governador teria “pisado na bola” com o clã. A primeira, segundo ele, ocorreu em 2023, quando Tarcísio declarou apoio a 95% da reforma tributária proposta pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Outro problema do governador na visão dos bolsonaristas ouvidos é o seu perfil contemporizador, de quem quer “agradar a todos”. Para ele, as tentativas de conciliação de Tarcísio configuram um caso de “emenda que sai pior que o soneto” e ocorrem por conta de um “excesso de autoconfiança” promovido pela elite financeira e setores econômicos que o exaltam.
O caso mais expressivo, segundo eles, é de Tarcísio não criticar publicamente o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). De acordo com a ala, o comportamento do chefe do Executivo paulista pode “minar o seu futuro” dentro do bolsonarismo e até rifá-lo como eventual candidato de Bolsonaro a presidente, futuramente.
Para o deputado estadual Gil Diniz (PL), há o sentimento de “ausência” do governador no enfrentamento a Moraes diante do julgamento por tentativa de golpe de Bolsonaro, que afirma ser vítima de perseguição política. “Sinto falta dele, como uma autoridade pública, de criticar nominalmente as ações de Moraes. Não vejo por que o ministro é alguém que não pode ser sequer criticado”, diz.
A visão do campo político foi explicitada em publicação do vereador pelo Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro (PL), na rede social X, que comparou os “governadores democráticos” a “ratos”. Tarcísio foi indagado sobre isso na segunda-feira, 18, mas decidiu não comentar. O deputado federal licenciado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) também já criticou Tarcísio abertamente por conta do republicano demonstrar preocupação em relação ao tarifaço e não contestar Moraes, e depois recuou.
Diniz também pontua que sente falta de um possível diálogo que Tarcísio poderia ter com o filho “03” do ex-presidente, que possui certo poder de articulação na Casa Branca de Trump. Ele relembra que o ex-integrante da Câmara dos Deputados foi o mais votado do País nas eleições de 2018 e que apoiou o atual governador de São Paulo em 2022.
“Muitos não acreditavam no potencial do Tarcísio, o Eduardo estava ali. Foi um dos principais cabos eleitorais do Tarcísio aqui em São Paulo”, disse o deputado. “Não vejo por que não usar essa posição estratégica que o Eduardo tem, inclusive podendo usar o Eduardo no próprio governo do Estado.”
Diniz considera que Tarcísio poderia nomear o parlamentar como secretário de governo, a fim de evitar a cassação de seu mandato por faltas injustificadas – a exemplo do que teria sido ventilado pelo governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). O deputado estadual avalia que Tarcísio mantém tal distância por cálculo político, com intuito de preservar a sua gestão de retaliações do STF.
Responsável por mobilizar as manifestações em defesa do ex-presidente, o pastor Silas Malafaia afirmou ao Estadão/Broadcast que, se Tarcísio não se posicionar mais enfaticamente sobre Moraes, poderá passar a ter “dificuldades” dentro do espectro político. Ele salienta que “falta atitude” ao governador, e que isso pode fazer com que o republicano “sofra danos” e perca apoio.
“Todas as manifestações que o Tarcísio foi, e eu estou em todas porque as coordeno, você não vê uma palavra do Tarcísio contra o STF e Alexandre de Moraes”, disse o pastor. “O que é que o Tarcísio faz? Fala ‘volta, Bolsonaro’ e diz ‘foi o melhor presidente’. Ok, mas cadê uma palavra crítica? Não tem. Em nenhuma manifestação. Não tem, mas está chegando a hora.”
Apesar de abordar a insatisfação que possui – inclusive, sobre o fato de o governador de São Paulo não ter participado do ato do dia 03 de agosto por causa de uma cirurgia que poderia ser adiada, segundo ele -, Malafaia ponderou que não é “inimigo” de Tarcísio, e possui um relacionamento com o governador. “Eu mandei uma mensagem para ele na semana do evento (ato do dia 3 de agosto), disse: ‘Aguardo você na Paulista’. Eu mandei a mensagem para o governador de São Paulo. Ele respondeu? Não. Não me respondeu. Mas recebeu a mensagem e leu. Tá certo? Entendi”, relatou.
Entorno de Tarcísio não vê ameaças
Um aliado próximo ao chefe do Executivo paulista afirmou à reportagem que, apesar das críticas vindas do campo bolsonarista, não há preocupação dentro do governo estadual. Segundo ele, “não há outro nome” no cenário político capaz de ameaçar Tarcísio ou enfraquecê-lo em âmbito nacional, caso o governador decida disputar a Presidência da República. Um nome relembrado por ele, o do influenciador e ex-candidato à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, é visto como carta fora do baralho por conta de sua inelegibilidade declarada pelo Tribunal Regional Estadual (TRE).
Internamente, houve desânimo e acuamento num primeiro momento, mas a questão parece ter sido relevada. Ainda de acordo com esse interlocutor, as manifestações de Eduardo Bolsonaro refletem uma “disputa de poder” e dão voz a tensões já conhecidas. A relação entre Tarcísio e Eduardo “nunca foi fácil”, mas o governador sempre “soube administrar”.
A decisão de Tarcísio de procurar o encarregado de Negócios dos EUA, Gabriel Escobar, e sinalizar disposição para negociar diretamente com Estados norte-americanos foi considerada um acerto, tanto por auxiliares próximos quanto por parlamentares bolsonaristas na Assembleia Legislativa.
Além de Gil Diniz, o deputado Tenente Coimbra (PL) também elogiou a iniciativa do governador. “No núcleo duro, do qual faço parte, não houve questionamentos ou críticas. O tarifaço terá impacto, e precisamos trabalhar para minimizá-lo”, afirmou.