Esquerda sofre na América Latina, mas eleição no Brasil segue em aberto
A ausência da esquerda no segundo turno presidencial da Bolívia alimenta a narrativa de um avanço da direita na América Latina. O resultado se soma a cenários adversos para governos progressistas no Chile e na Colômbia, onde a oposição lidera as pesquisas eleitorais. A análise dos dados de opinião pública, contudo, sugere que a situação brasileira possui dinâmicas próprias que impedem uma transposição automática desse cenário para 2026.
Na Bolívia, a derrota do Movimento ao Socialismo (MAS) teve duas causas principais. Primeiro, a baixíssima performance do governo de Luis Arce, com aprovação popular inferior a 10%. Segundo, o conflito aberto entre Arce e o ex-presidente Evo Morales, que fragmentou o campo progressista. Nesse ambiente, o centrista Rodrigo Paz, com certo status de outsider, capitalizou o descontentamento geral e avançou para a disputa final.

O padrão se repete em outros países. No Chile, o presidente Gabriel Boric tem baixos índices de aprovação, enquanto figuras da direita lideram as intenções de voto. Na Colômbia, o desgaste do governo de Gustavo Petro também fortalece a oposição como favorita.
Interpretar esses fenômenos como uma inevitável guinada ideológica do continente, porém, é uma conclusão equivocada. O que une os casos da Bolívia, Chile e Colômbia é a alta rejeição a governos com baixa performance em áreas cruciais. É um voto de protesto contra o incumbente, um movimento pendular que no passado favoreceu a própria esquerda na chamada “Onda Rosa”.
É neste ponto fundamental que o Brasil se distingue. Diferentemente de seus pares regionais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sustenta um patamar de aprovação competitivo, superior a 40% segundo a média das pesquisas de popularidade. Esse capital político, muito superior aos números de Arce, confere a Lula uma condição de partida para a reeleição muito mais sólida.
Isso não imuniza o cenário brasileiro da insatisfação popular. Segundo pesquisa Ipsos, 69% dos brasileiros veem a sociedade como deteriorada, um aumento de 7 pontos percentuais desde 2023, e atrás apenas de Alemanha, África do Sul e Hungria na comparação global. Além disso, 62% dos brasileiros percebem o País em declínio, um avanço de 9 pontos percentuais em relação à última pesquisa. Há, portanto, uma demanda latente por representantes que questionem o sistema, ainda que o espaço para que um candidato com esse apelo seja, hoje, mais limitado do que no contexto boliviano.
A oposição brasileira, portanto, erraria ao contar com uma onda internacional para impulsionar seus candidatos. A eleição de 2026 será decidida primariamente pela avaliação que os brasileiros farão do governo, da economia, e dos serviços públicos. Além disso, faria bem à oposição investir em nomes com aura de novidade, que possam se beneficiar mais claramente do sentimento antissistema. De todo modo, a disputa será muito competitiva, e os índices de aprovação atuais conferem a vantagem, neste momento, a Lula.