Ninguém se indigna de verdade com vazamentos de áudios da família Bolsonaro
A reação de quase todos frente aos últimos vazamentos de áudios da família Bolsonaro & Cia – com o requinte de ofensas, agressões e palavrões – é uma comprovação da máxima do filósofo Friedrich Nietzsche, segundo a qual nenhuma indignação moral, sobretudo na política, é verdadeira. Esconde sempre autointeresses e disputas pelo poder.
Ora, há exatos dez anos, o Brasil vivia uma temporada de vazamento de áudios que atingia o coração do petismo. O então ex-presidente Lula e seus familiares, a presidente de turno, Dilma Rousseff, sofriam com as investidas do ainda juiz Sergio Moro e da operação Lava Jato. Recordem-se do “Bessias”, do “tchau querida”, de uma ligação em que Dilma e Lula articulavam a ida do ex-presidente para a Casa Civil, em 2016, para tentar salvar um governo em chamas? As gravações se revelaram ilegais, mas fizeram o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, impedir a posse de Lula. À época, Gilmar se tornou herói da direita.

A reação do petismo contra aquela enxurrada de áudios era comparável à do bolsonarismo de hoje. Condenar os “vazamentos seletivos”, questionar a “legalidade” da publicização do material, afirmar que a nossa justiça estava aparelhada por interesses políticos e, no limite, atacar o Supremo Tribunal Federal. Mais exaltado, o então deputado federal do PT, Wadih Damous, defendeu o fechamento do STF. À época, Moro era para a direita o que Alexandre de Moraes era para a esquerda, um herói.
Enquanto o jornalismo faz o seu papel, tornar público os intestinos do poder, a militância comemora ou reclama – a depender de seu posicionamento político. Nietzsche seria contraditado se aparecesse um pessoal que se indignou com os vazamentos dessa década e da década passada. Mas essa turma ainda não deu as caras. O filósofo, se vivesse hoje, saberia que ninguém sairia imune de um vazamento das mensagens de seu celular – ele não acreditava em santos.