Vazamentos seletivos expõem o roteiro repetido da novela Brasil
Os áudios divulgados esta semana pela Polícia Federal, revelando conversas íntimas entre Bolsonaro, familiares e aliados, são um roteiro antigo. Para os que não têm memória seletiva, está claro que esse capítulo não é original. O argumento já foi usado em 2016, quando o então juiz Sergio Moro divulgou conversas em áudio de Marisa Letícia com o filho, Fábio Luiz Lula da Silva, no qual, ao comentar um panelaço, ela disse desejar que “enfiassem as panelas no c…”.
Pouco mudou no Brasil desde esse episódio tosco da política do País. Agora, mais uma vez, o palavrão aparece em destaque, nas mensagens de Eduardo Bolsonaro ao pai, ao demonstrar indignação por ser chamado de imaturo pelo ex-presidente, em uma entrevista.

Há que se traçar um paralelo também nas conversas vazadas entre a então presidente Dilma Roussef e Lula, onde ficamos sabendo quem era “Bessias”, o atual ministro da Advocacia-Geral da União, Jorge Messias. Na época, ele foi o portador de um documento que transformava Lula em ministro da Casa Civil e que poderia ser usado “em caso de necessidade”.
A “estratégia” foi revelada após um desses vazamentos seletivos para entreter a população e servir a interesses de quem exerce o poder de fato. A nomeação de Lula como ministro acabou sendo impedida pelo mesmo STF que hoje parece estar mais próximo ao petista.
É patente que no Brasil tudo muda, mas nada muda. Faz inveja ao realismo fantástico de Gabriel García Marquez.
Mal digerimos um acontecimento, outro capítulo é escrito com personagens involuntários de um Big Brother insano. São ações devidamente arquitetadas, que precedem desfechos já óbvios.
A temporada Bolsonaro parece uma continuação da temporada anterior, que contava com a participação especial de Dilma e Moro. A ex-presidente hoje atua na China e o ex-juiz no Senado. Perderam relevância no enredo atual, mas seguem no elenco, para o caso de precisarem ser alçados ao palco principal novamente.
Lula foi resgatado da prisão e atualmente contracena no Planalto, sobretudo com Janja – aposta equivocada da escalação atual, que não alcançou a simpatia do público e anda meio apagada.
Seguindo a lógica pouco criativa do roteirista, a prisão voltará a ser palco de gravações, em breve. Algo que dará também muito destaque à novidade no elenco, Mchelle Bolsonaro, cuja atuação se concentra nos templos evangélicos, com muitas lágrimas e orações.
O problema é que todo esse entretenimento tem como efeito colateral piorar a vida dos brasileiros. Transformar o jogo do poder em novela atrapalha o desenvolvimento do País. E desta vez a história parece ter ido longe demais.
As tarifas impostas pelos Estados Unidos, pedidas pelo núcleo que grava em Washington, ameaçam empregos ligados ao comércio exterior. Ao mesmo tempo, a aplicação da Lei Magnitsky contra o ministro Alexandre de Moraes abre um flanco delicado, com potencial de atingir até o sistema bancário, que sempre atuou nos bastidores evitando exposição pública.
A vida real virou figurante de um enredo político onde vilões e mocinhos trocam de papel conforme a conveniência. Mas quem vive fora do script, tentando manter a rotina entre boletos e esperança, já começa a não ver graça alguma nessa encenação, afinal, filme repetido cansa.