28 de agosto de 2025
Politica

Bolsonaro se isola a uma semana do julgamento e vê crise aumentar por acesso e sucessão em 2026

BRASÍLIA — O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) chega a uma semana de seu julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) isolado de seus principais aliados, sem controle de sua comunicação e envolvido numa troca de fogo entre dois grupos com visões conflitantes sobre a melhor forma de protegê-lo — e sobre quem deve ser o nome a sucedê-lo.

Bolsonaro está em prisão domiciliar, desde 4 de agosto, por descumprir as medidas cautelares determinadas em 18 de julho pelo ministro Alexandre de Moraes. Naquela data, a Corte havia imposto a ele uma tornozeleira eletrônica, a proibição do uso de redes sociais e a obrigação de recolhimento noturno, entre outras medidas.

Jair Bolsonaro após ter sido alvo de medidas cautelares impostas pelo STF
Jair Bolsonaro após ter sido alvo de medidas cautelares impostas pelo STF

A Primeira Turma do STF inicia na semana que vem, em 2 de setembro, o julgamento da ação penal que tem como réus Bolsonaro e sete ex-integrantes de seu governo. Eles compõem o chamado “núcleo crucial” dos acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por tentativa de golpe de Estado.

O “novo entorno” de Bolsonaro está no centro das insatisfações dos aliados que foram alijados de seu convívio por diferentes motivos. Em maio, um de seus mais fiéis escudeiros, o advogado Fabio Wajngarten, foi demitido do PL após se indispor com a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Na semana passada, o pastor Silas Malafaia, um dos conselheiros de acesso mais íntimo ao ex-presidente, foi impedido de se comunicar com Bolsonaro após ser alvo de medidas cautelares impostas por Moares. Ele agora é investigado por suposta participação em crimes de coação no curso do processo.

Em março, o terceiro filho do ex-presidente, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), deixou o Brasil para viver nos Estados Unidos, onde atua para impor sanções contra o STF junto à Casa Branca, e cogita não mais voltar. O comunicador Paulo Figueiredo, braço-direito de Eduardo no exterior, por sua vez, é réu na ação que investiga a tentativa de golpe e não deve voltar tão cedo ao Brasil também.

O afastamento de Wajngarten é considerado crítico por pessoas próximas do ex-presidente, porque ele era o responsável por manter Bolsonaro exposto na mídia, fazendo ponte com veículos e articulando entrevistas, conversas e artigos de opinião em nome do aliado.

Já Malafaia tem sido o principal organizador das manifestações de rua a favor de Bolsonaro — neste ano foram cinco, entre São Paulo, Rio e Brasília, que reuniram ao todo 117,2 mil pessoas, segundo levantamento de pesquisadores da USP.

Interlocutores desse grupo, que trabalha para fortalecer Eduardo como sucessor de seu pai na Presidência da República, reclamam que as pessoas hoje com acesso a Bolsonaro fazem pouco para defender a sua imagem. As críticas recaem, acima de tudo, sobre Michelle e dirigentes do PL.

Bolsonaro tem passado os seus dias no condomínio Solar de Brasília, no bairro do Jardim Botânico, com Michelle e pessoas de sua confiança, como o irmão Eduardo Torres. Nesta terça-feira, 26, pela manhã, seu outro irmão, Diego Torres, assessor especial no gabinete de Tarcísio, aproveitou a vinda do governador à capital federal — e o acesso irrestrito da família ao ex-presidente concedido pela Justiça — e foi vê-lo.

Pelo menos uma das visitas a Bolsonaro gerou mal-estar. Michelle chegou a desmentir o deputado federal Luciano Zucco (PL-RS) após ele afirmar, em vídeo, que faria um churrasco durante visita ao ex-presidente. Zucco é um dos líderes da tropa de choque bolsonarista na Câmara.

“Solicito a colaboração dos próximos visitantes autorizados para que compreendam e respeitem a sensibilidade do momento, abstendo-se de atitudes que possam deturpar a finalidade da visita ou prejudicar a imagem do presidente Jair Bolsonaro”, afirmou a ex-primeira-dama em nota.

Dois episódios recentes irritaram bolsonaristas que cobram uma defesa mais enfática do PL a respeito de seu líder mais popular. Após a prisão domiciliar ser decretada a Bolsonaro, Valdemar publicou uma nota curta em que afirmava: “ESTOU INCONFORMADO!!!!! O QUE MAIS POSSO DIZER?”. A manifestação enfureceu parlamentares, que esperavam uma defesa mais enfática do ex-presidente e críticas a Moraes.

Na última semana, outros dois tropeços de Valdemar viraram assunto nos grupos bolsonaristas. Ele disse que Tarcísio vai se filiar ao PL caso seja candidato a presidente em 2026 e comparou Bolsonaro ao líder revolucionário Che Guevara. A grita foi tamanha que ele teve de se explicar.

Os filhos de Bolsonaro e seus antigos aliados têm a percepção de que, enquanto o ex-presidente está preso e quase incomunicável, Tarcísio de Freitas (Republicanos), os dirigentes do Centrão e agentes do mercado têm se movimentado para deixar o governador de São Paulo bem posicionado no grid de largada para a eleição de 2026.

Um evento realizado na noite desta segunda-feira, 25, em Brasília, reforçou esse sentimento. Na comemoração de 20 anos do Republicanos, o presidente nacional Marcos Pereira levantou a bola de Tarcísio ao sugerir, diante de uma plateia de milhares de pessoas e dirigentes de PL, MDB e PSD, que o governador pode ser o nome da legenda para se candidatar ao Planalto no ano que vem.

Tarcísio, por sua vez, discursou falando de temas nacionais. Do palco, ele criticou o governo Lula, fez acenos a conservadores e empresários e defendeu uma eventual aprovação da anistia no Congresso, sem, no entanto, usar esse termo — ele falou em “pacificação” via Legislativo.

Nesta segunda-feira, o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) se queixou de um levantamento eleitoral feito pela Paraná Pesquisas com cenários para 2026 em que não constava o nome de Eduardo — como mais um sinal da desconfiança a respeito de movimentações pelas costas da família.

Eduardo, por sua vez, fez uma publicação criticando as articulações que ele enxerga serem pró-Tarcísio. Para ele, “quanto mais próximo do julgamento de Bolsonaro, mais pessoas têm falado sobre substituí-lo na corrida presidencial”.

As reviravoltas do 15 de julho

A ofensa de Eduardo Bolsonaro ao seu pai, numa troca de mensagens em 15 de julho exposta pela Polícia Federal (PF), precedeu uma reaproximação com o pastor Silas Malafaia que tem ajudado a família a unificar o discurso na defesa do ex-presidente.

O anúncio feito no começo de julho pelo presidente americano, Donald Trump, de que seu governo imporia tarifas de 50% sobre os produtos brasileiros, ajudou a colocar “fogo no parque” dos bolsonaristas. Isso porque Eduardo, um dos artífices das sanções contra o Brasil, vinha defendendo que apenas uma anistia “ampla, geral e irrestrita” no Congresso Nacional seria a solução para lidar com os impostos, enquanto Tarcísio passou a tentar debelar a crise via negociação com a Embaixada dos Estados Unidos.

O embate entre Eduardo e Tarcísio se tornou público e motivou uma força-tarefa entre Valdemar e os senadores Rogério Marinho (PL-RN) e Ciro Nogueira (PP-PI), que se reuniram em 15 de julho para discutir como apagar o incêndio. Eles então acionaram Jair e Flávio Bolsonaro, senador pelo PL do Rio, para intermediar uma pacificação entre os dois.

Na entrevista que deu ao site Poder360, às 16h, Bolsonaro já refletia o apelo feito pelos seus aliados. Ele disse que seu filho “não é favorável à medida aqui no Brasil” e que “ninguém está vibrando com a taxação”. Também afirmou que estava tudo pacificado entre Eduardo e Tarcísio, e que o filho “não é tão maduro, talhado para a política”.

O comentário sobre a maturidade enfureceu Eduardo, como mostrou o Estadão à época. Após a entrevista, o deputado escreveu ao pai: “Eu ia deixar de lado a histório [sic] do Tarcísio, mas graças aos elogios que você fez a mim no Poder 360 estou pensando em dar uma porrada nele, para ver se vc aprender. VTNC SEU INGRATO DO C……”. A mensagem, obtida da apreensão do celular do ex-presidente, foi revelada no relatório final em que a PF indiciou pai e filho por coação para impedir o julgamento da ação do golpe.

Pessoas próximas à família relatam que, naquela tarde, Eduardo ligou para Wajngarten se queixando da entrevista do pai, que rebaixava a sua articulação no exterior e fortalecia Tarcísio para 2026. O advogado então fez contato com Malafaia, um dos poucos aliados com ascendência sobre Bolsonaro, para botar panos quentes na crise. O deputado e o pastor, que vinha criticando publicamente as atitudes do filho do ex-presidente, reataram a relação numa ligação com a presença de Wajngarten e Figueiredo.

Às 18h39 daquele dia, Malafaia enviou um áudio a Bolsonaro, cujo teor foi exposto pela PF: “Presidente, você me desculpa. Você podia até defender Tarcívio. Agora, você queimar seu garoto, aí não. Isso é um erro estratégico, de alto grau. Você não tinha que bater no rapaz. Olha o trabalho que o cara está fazendo junto a autoridades, falando com os principais assessores de Donald Trump… Aí você errou, mas errou feio”.

A conversa fez Bolsonaro mudar o tom de novo em relação aos papéis do deputado federal e do governador paulista na crise. Na entrevista que deu à CNN Brasil na mesma noite, o ex-presidente passou a defender Eduardo e criticar Tarcísio, sobre quem tinha dito pouco antes que não tinha críticas.

O episódio, além de ter causado uma guinada na comunicação de Bolsonaro sobre Eduardo e Tarcísio, levou a uma nova aliança com Malafaia. Apesar de mensagens do pastor criticando Eduardo terem sido expostas pela PF, o deputado gravou um vídeo manifestando apoio a Malafaia, que ele enxerga como um aliado na articulação contra Tarcísio.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *