Mauro Cid pede desligamento das Forças Armadas; outros 5 oficiais saíram após investigação do golpe
BRASÍLIA – Desde 8 de janeiro de 2023, data dos atos golpistas em Brasília, cinco oficiais superiores que viraram réus no Supremo Tribunal Federal (STF) deixaram as fileiras do Exército Brasileiro. Agora, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do então presidente Jair Bolsonaro, planejava fazer o mesmo.
A defesa de Cid comunicou nesta semana, no início do julgamento do núcleo central, que Cid pediu dispensa do Exército. O tenente-coronel não tem mais “condições psicológicas” de continuar a carreira militar, segundo argumentaram seus advogados perante o STF.
No QG do Exército, é dada como certo que o comandante-geral, general Tomás Paiva, vai aceitar o pedido de Cid. A decisão deve ser oficializada até o fim deste ano, o que fará com que Cid seja aposentado a partir de 2026.
Cid e outros que pediram baixa estavam afastados das funções, por determinação judicial de Alexandre de Moraes, ainda durante as investigações.
Segundo o Exército, Cid ainda não possui o tempo de serviço exigido para passar à reserva remunerada e ter direito a benefício integral, como os demais.
O tenente-coronel entrou em 1996 na Força Terrestre e somente completaria o tempo mínimo para pedir reserva em 2027, conforme previsto pela regra de transição criada na reforma de 2019.
Ele então pediu a chamada “quota compulsória”, uma espécie de saída antes da hora, determinada pelos comandantes ou voluntária.
Por meio da quota compulsória voluntária, um militar pode manifestar interesse ao Comando da Força de se desligar da carreira antecipadamente. Ele carrega consigo as gratificações acumuladas ao soldo, mas no fim passa a receber apenas proporcionalmente ao tempo de serviço cumprido. Por isso, Cid deve perder uma pequena fatia de sua remuneração atual – R$ 28,2 mil.
Anualmente, as Forças Armadas recebem diversas manifestações por escrito como essa, e cabe aos comandantes, após trâmites burocráticos internos que verificam se ele atende aos requisitos mínimos (entre eles ter 25 anos de serviço), autorizar ou não as baixas, à conveniência da Arma.
A quota existe para que o Exército, Marinha e Aeronáutica possam adequar a quantidade de vagas nos postos da hierarquia ao número de militares que serão promovidos. Por exemplo, se há hipoteticamente 150 capitães a serem promovidos ao posto acima e apenas 50 majores de saída, outros 100 devem entrar na quota compulsória.
O mecanismo está previsto no Estatuto dos Militares, sendo destinado a “assegurar a renovação, o equilíbrio, a regularidade de acesso e a adequação dos efetivos de cada Força Singular”. A lei prevê que os oficiais podem pedir a “inclusão voluntária na quota compulsória”.
Cid fez isso. Ele enviou o requerimento ao Exército em agosto, antecipadamente, já que o prazo para manifestar interesse de entrar na quota compulsória vai até outubro, segundo o Exército. A lista de oficiais indicados para a quota deve ser feita até 31 de janeiro. E a transferência em si para a reserva ocorre até março de 2026.
O colaborador que ajudou a Polícia Federal e o Ministério Público Federal a obter provas e detalhar a teia de eventos em troca de redução da pena não será o primeiro a deixar a Força Terrestre, desde o começo das investigações.
Originalmente, a Procuradoria-Geral da República denunciou 24 militares das Forças Armadas no contexto da trama do golpe. O Supremo Tribunal Federal acatou a denúncia contra todos, exceto o tenente-coronel da reserva do Cleverson Ney Magalhães e o general de Brigada Nilton Diniz Rodrigues, ambos do Exército. A Corte entendeu não haver indícios mínimos para processá-los.
Durante as investigações, a Polícia Federal capturou uma mensagem do tenente-coronel Cavaliere a Cid por meio da qual ele questionava se seria concedida a “saída compulsória” aos militares que desejassem “se desse tudo errado”.
Em depoimento posterior, ele esclareceu aos investigadores: “Existia uma angústia de muitos militares que não gostariam de ser comandados por Lula e que muitos manifestavam o interesse em exercer esse tipo de saída compulsória para não terem Lula como comandante supremo das Forças Armadas”.
Tenente-coronel do Exército e ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cesar Barbosa Cid é filho de um general 4 estrelas, Mauro Cesar Lourena Cid, e tinha uma carreira em ascenção até exercer a função do Palácio do Planalto, de onde virou o principal delator da investigação.
Antes de pedir para deixar a Força Terrestre antecipadamente, ele já havia se queixado de que sua carreira havia acabado. O delator já havia ficado fora de uma lista de promoções no ano passado e interpretou que ficou com a carreira comprometida por causa da delação premiada.
Conforme dados do Diário Oficial da União e do Portal da Transparência, os seguintes oficiais passaram para a reserva:
- Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira: general de Exército e ex-chefe do Comandante de Operações Terrestres (Coter) – reserva em 30/11/2023
- Sergio Ricardo Cavaliere de Medeiros: tenente-coronel – reserva em 31/08/2024
- Márcio Nunes de Resende Júnior: coronel do Exército – reserva em 31/12/2024
- Bernardo Romão Correa Netto: coronel e ex-comandante do 1º Batalhão de Forças Especiais – reserva em 31/01/2025
- Fabrício Moreira de Bastos: coronel do Exército – reserva em 31/05/2025
Réus militares que já eram da reserva antes da denúncia e das investigações:
- Jair Messias Bolsonaro: ex-presidente da República e capitão reformado do Exército, apontado como líder da organização criminosa.
- Walter Souza Braga Netto: general da reserva e ex-candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro.
- Augusto Heleno Ribeiro Pereira: general da reserva e ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional.
- Almir Garnier Santos: almirante de Esquadra da reserva e ex-comandante da Marinha.
- Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira: general de Exército da reserva, ex-comandante do Exército e ex-ministro da Defesa.
- Ailton Gonçalves Moraes Barros: capitão expulso do Exército.
- Angelo Martins Denicoli: major da reserva do Exército
- Marcelo Costa Câmara: coronel do Exército da reserva e ex-ajudante de ordens da Presidência
- Mario Fernandes: general da reserva do Exército e ex-secretário executivo da Secretaria Geral da Presidência
- Reginaldo Vieira de Abreu: coronel da reserva do Exército
Entre os que viraram réus, permanecem na ativa os seguintes militares:
- Giancarlo Gomes Rodrigues: subtenente do Exército
- Guilherme Marques Almeida: tenente-coronel do Exército
- Hélio Ferreira Lima: tenente-coronel do Exército
- Rafael Martins de Oliveira: coronel do Exército
- Rodrigo Bezerra de Azevedo: tenente-coronel do Exército
- Ronald Ferreira de Araujo Junior: tenente-coronel do Exército