18 de setembro de 2025
Politica

É hora de caçar o rei

A execução do ex-delegado Ruy Ferraz Fontes não foi só uma tragédia, foi um recado sangrento de que o crime organizado não tem medo do Estado. E qual a nossa resposta? A de sempre. Uma caçada cinematográfica para prender os pistoleiros. É bom para as manchetes, aplaca a raiva momentânea, mas no jogo de verdade, não muda o placar. É a eterna mania de enxugar gelo.

Delegado Ruy Ferraz Fontes, executado no dia 15 de setembro, em Praia Grande (SP)
Delegado Ruy Ferraz Fontes, executado no dia 15 de setembro, em Praia Grande (SP)

A verdade é que cada “soldado” do crime preso ou morto é substituído antes mesmo de o corpo esfriar. Para as facções, que hoje operam com a frieza e a profissionalização de uma multinacional, essa gente é descartável. Enquanto comemoramos a queda de um peão, o generalato do crime está rindo em seus condomínios de luxo, fechando o caixa e planejando o próximo ataque.

E aqui entra a parte que beira o inacreditável. São Paulo, o estado mais rico da nação, a locomotiva do Brasil, trata seus policiais como mão de obra barata. É quase uma piada de mau gosto. Como podemos exigir uma guerra sem tréguas contra um inimigo bilionário, pagando a quem está na linha de frente um dos piores salários do país? A polícia e a perícia que ajudaram a identificar suspeitos de matar o Dr. Ruy são as mesmas que lidam com o maior volume de trabalho do Brasil, com gente sobrecarregada e equipamentos que já deveriam ter sido aposentados há muito tempo. Estamos obrigando nossos profissionais a realizarem milagres.

É hora de virar o jogo. E somente se vira o jogo parando de mirar no soldado e passando a caçar o rei. O rei, nesse tabuleiro, é o dinheiro. É preciso sufocar as facções onde realmente dói: no bolso. Cortar o fluxo de caixa que compra armas, que corrompe agentes públicos e que financia execuções de cinema. A guerra de verdade não é uma troca de tiros; é uma batalha travada com inteligência, com monitoramentos telemáticos, quebras de sigilo bancário e o rastreamento de laranjas.

Isso significa dar à polícia o que ela realmente precisa: cérebros, não só músculos. Significa criar uma força-tarefa de analistas, contadores e especialistas em tecnologia para seguir o rastro do dinheiro. Significa equipar o perito criminal com o que há de mais moderno para que ele entregue a prova que vai prender não só quem puxou o gatilho, mas quem pagou por ele. E significa pagar um salário que faça um policial sentir orgulho e segurança, não a vontade de aposentar ou mudar de carreira.

A morte de Ruy Fontes não pode ser apenas mais um número na estatística. Ou ela se torna o basta definitivo para essa estratégia falida, ou teremos que nos acostumar a ver o crime ditar as regras. Continuar trocando tiro com o varejo enquanto o atacado prospera não é só ineficiente, é burrice. A verdadeira coragem não está em prometer vingança, mas em ter a inteligência para mudar a estratégia e atacar o inimigo onde ele é mais forte e vulnerável: o seu império financeiro.

 

 

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