Crescemos mais quando lemos algo divergente das nossas ideias
Nas redes sociais, para se informar, a gente gosta de seguir a nossa turma. Os artistas preferidos, os veículos de imprensa com os quais temos alguma identificação, os políticos com quem concordamos. É uma situação diferente do que ocorria há poucos anos, quando os principais órgãos de mídia possuíam um quase monopólio de informação.
Hoje, praticamente cada pessoa é um veículo de imprensa isolado, com câmera e tudo. São muitos criando conteúdo para muitos, na cacofonia dos grupos de WhatsApp.

Se, de um lado, há uma democratização do produto de informação, como notícias e análises, por outro, cada pessoa cerca-se a tal ponto por suas preferências, que começa a agir com agressividade e intolerância cada vez que vê seu círculo de conforto ameaçado.
Aconteceu, por exemplo, nos votos dos ministros do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes e Luiz Fux, envolvendo a acusação contra o ex-presidente Jair Bolsonaro de ter tramado um golpe de Estado. As pessoas, de um lado ou de outro, quando recebiam pontos de vista discordantes, foram rápidas em adjetivar os juízes: “canalha”, “bandido”, “ditador”, “vendido” e coisas piores. Talvez uma minoria tenha parado para analisar os argumentos de um ou de outro.
Caso semelhante, agora em escala global, envolveu o assassinato do militante político americano Charlie Kirk. Para muita gente, as ideias de Kirk, mesmo que conhecidas superficialmente, eram argumentos necessários para que o sujeito merecesse morrer. E isso inclui gente que por princípio é contra a pena de morte. Esse tem sido o mundo de hoje. Certezas sensíveis demais e abertura ao outro de menos. Quem não está do meu lado é no mínimo um herege.
Por trás disso tudo, há uma espécie de intolerância estrutural que nos leva de volta à infância. Mimados por um mundo informacional que escolhemos, não queremos mais ser contrariados com os ruídos do mundo exterior. Queremos o tempo todo viver num conforto eterno de reiteração das nossas ideias. A questão é que essa posição, algo inerte, nos deixará sempre no mesmo lugar.
Fux, Moraes, Kirk, Lula, Bolsonaro, Gleisi Hoffmann, Guilherme Boulos e tantos outros estão sempre a emitir opiniões que podem nos contrariar. Que tal fazer o mais complicado? Resistir ao impulso de ofendê-los e tentar ver onde estão os erros, os furos, ou mesmo os efeitos colaterais indesejados de suas ideias? Ou, num passo além, ter a abertura para admitir que algo possa fazer sentido do ponto de vista do local na sociedade onde estão?
Ou seja, fazer uma opinião da qual você discorda de maneira veemente se tornar uma espécie de escada para aprimorar suas próprias ideias. Quando alguém tem certeza de que está do lado certo e os demais, do lado errado, isso costuma se tornar um subsídio para o cometimento de ações violentas. Principalmente no sentido de pisar em quem está no terreno tido como adversário. É o que tem ocorrido, na prática, no Brasil e no mundo.
Mesmo nas coisas mais importantes para nós, não estamos exatamente corretos ou mesmo equivocados. Talvez estejamos presos em determinado enfoque e nada mais. Visões maniqueístas e fechadas de fenômenos complexos só prejudicam diálogos, acordos e uma compreensão mais profunda do que realmente possa ser a solução dos problemas brasileiros e mundiais.