14 de outubro de 2025
Politica

Quarentena das carreiras de Estado é garantia de isonomia e pilar da confiança nas instituições

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em sessão realizada em 25 de março de 2008, declarou por unanimidade que é vedado aos advogados investidos provisoriamente na função de julgadores exercer a advocacia perante a Corte que integraram pelo período de três anos após o término da investidura.

A decisão atendeu a pedido da Associação Brasileira dos Magistrados, Procuradores e Promotores Eleitorais (Abramppe), nos autos do processo 2007.100.00.014.851, e reafirmou a aplicação do artigo 95, parágrafo único, inciso V, da Constituição Federal, que veda ao juiz exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou.

A proposta de eliminar a quarentena aplicada aos advogados que ocuparam cargos judicantes — seja nos tribunais eleitorais, seja no CNJ ou em demais conselhos – reacende um debate essencial sobre isonomia e ética pública.

A decisão do Conselho, ao impor o intervalo de três anos para que esses profissionais voltem a advogar perante o órgão de que fizeram parte, representou uma medida de equilíbrio – não de restrição. O entendimento consolidado foi de que a quarentena se aplica ao tribunal eleitoral do qual o advogado se afastou, garantindo o necessário distanciamento ético sem impor limitações desproporcionais à advocacia.

O tema voltou à pauta nacional recentemente, com a tramitação de propostas legislativas que pretendem alterar ou suprimir a quarentena de juízes eleitorais e de outras carreiras de Estado. A discussão evidencia um ponto central: sem quarentena, não há garantia de isonomia nem proteção efetiva à imparcialidade das instituições.

A questão ultrapassa o campo eleitoral e alcança também os conselhos que exercem poder de julgamento, como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), onde a preservação da independência institucional é igualmente indispensável.

Quando um advogado passa a exercer função de juiz, ainda que temporariamente, adquire acesso privilegiado a informações, rotinas internas e relações próprias da magistratura. Permitir o retorno imediato à advocacia diante do mesmo tribunal cria uma desigualdade concreta em relação aos colegas que nunca ocuparam posição semelhante. A paridade de armas, princípio que sustenta a equidade processual, fica vulnerável.

A quarentena existe justamente para corrigir essa distorção. Ela impede que o ex-julgador utilize, consciente ou não, o prestígio e as conexões obtidas durante o exercício da função em benefício de causas privadas. O intervalo de três anos é o que assegura o necessário distanciamento entre o papel de quem julga e o de quem defende.

Defender a supressão dessa regra é ignorar o espírito do artigo 95, parágrafo único, inciso V, da Constituição Federal, que busca proteger não apenas a imagem da Justiça, mas também a igualdade entre os próprios profissionais do Direito.

Durante o período em que integram tribunais eleitorais, os advogados investidos nessas funções são, de fato, juízes – e, por isso, devem submeter-se às mesmas limitações éticas e institucionais após o término do mandato. O CNJ, ao reafirmar essa compreensão, cumpriu sua missão constitucional de zelar pela autonomia do Judiciário e pela preservação de sua credibilidade.

O ministro Edson Fachin, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), já destacou que é preciso resguardar as prerrogativas da magistratura para que o país tenha instituições fortes.

Essa observação reforça o cerne da discussão: ao enfraquecer regras que protegem a independência e a ética do exercício judicial, como a quarentena, não se amplia a liberdade profissional; fragiliza-se a estrutura institucional que sustenta a Justiça. Preservar a quarentena é, portanto, preservar o próprio equilíbrio entre os poderes e a confiança da sociedade no sistema jurídico.

A quarentena não representa privilégio nem punição – é uma garantia institucional. Ela reafirma que todos os atores do sistema de Justiça, independentemente do cargo ou função, estão sujeitos aos mesmos princípios republicanos de impessoalidade, isonomia e responsabilidade pública.

Em tempos de descrença nas instituições, preservar a quarentena é reafirmar o compromisso com uma Justiça imparcial, igualitária e digna da confiança da sociedade.

 

 

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