Oráculo da política, Kassab é o único garantidor de um projeto de centro para o Brasil
Quem ouvia o jingle “Quem sabe, sabe, vota comigo, federal é Kassab, estadual é Rodrigo”, que ecoava no Estado de São Paulo, no final do século passado, talvez nunca fizesse ideia do que o candidato a deputado federal nessas eleições viria a se tornar.
Gilberto Kassab governou a mais importante cidade latino-americana, graças à sua capacidade de articulação política e criou a única força de centro do Brasil, que tem projeção real eleitoral, garante governabilidade e que tem um comando sólido e sem maiores polêmicas.
Com duas candidaturas presidenciais para 2026, em seu partido, o ex-prefeito paulistano, já foi fiel da balança para sustentar governos impopulares como o de Dilma e de Temer, onde exerceu papel de linha de frente, como ministro de Estado, e, hoje, possui três ministérios, sendo dois deles de grande relevância política e orçamentária, como o de Minas e Energia e o da Agricultura.
Forjado a administrar em crises, Kassab, pupilo do ex-presidenciável Guilherme Afif Domingos, iniciou sua carreira como vereador na cidade de São Paulo e em poucos anos já estava no centro da gestão pública, como secretário de Planejamento do governo mais impopular da capital paulistana, em meados dos anos 90.
No auge da crise política que envolvia a gestão Celso Pitta, que havia sido apresentado ao eleitor paulistano por Paulo Maluf, Kassab foi um dos responsáveis pelo “Reage, Pitta”, um movimento, que se não permitiu que o ex-prefeito conseguisse melhorar sua popularidade, pelo menos o fez conseguir encerrar um mandato, marcado por afastamentos judiciais e rompimento político com o seu padrinho. Desde então, Kassab foi se transformando em um dos grandes articuladores políticos do Brasil. Eleito deputado federal em 1998, Kassab levou apenas 6 anos para estar na posição que mudaria por completo seu tamanho na política brasileira.

Com o malufismo enfraquecido e a prefeita Marta Suplicy envolta em diversos casos polêmicos e com problemas de imagem pessoal, principalmente após seu divórcio com o até então senador Eduardo Suplicy, o ex-ministro da Saúde de Fernando Henrique Cardoso e presidenciável derrotado por Lula, em 2002, José Serra, foi o escolhido pelo PSDB para concorrer à Prefeitura de São Paulo.
Conhecido por seu temperamento mais difícil, Serra precisava de alguém que fizesse o link com o malufismo que estava órfão na cidade e que tivesse capacidade de articulação para atender as demandas locais, que não agradavam o estilo Serra de fazer política. Nesse momento, o jovem Kassab, ainda com seus 43 anos, é escolhido pela coligação PSDB-PFL-PPS para ocupar o posto de vice na chapa que viria a ser vitoriosa. Serra, que objetivava, o Palácio do Planalto, fez uma gestão de excelência nos dois anos que administrou São Paulo, algo que lhe permitiu saltar para o Palácio dos Bandeirantes e deixar no colo de Kassab a gestão da capital.
Estratégico, Kassab lança um programa que dá a sua cara ao mandato, a Lei Cidade Limpa e habilmente mantém a estrutura deixada por Serra, cumprindo o seu compromisso com o PSDB Paulista. A aprovação da gestão Serra/Kassab seguiu alta e segundo o Datafolha, em 2007, há um ano da eleição, Kassab viu dobrar sua aceitação, permitindo que sua reeleição fosse naturalmente viável. Entretanto, com mais uma crise para administrar, Kassab virou candidato tucano em 2008, mesmo sem o apoio formal do partido, que lançou Geraldo Alckmin, ex-governador do Estado, para enfrentá-lo.
Nesse ínterim, nasce um novo e marcante momento de sua trajetória, que é a sua relação com as estruturas partidárias. O seu partido, PFL, com imagem desgastada, sendo relembrado como o partido dos coronéis nordestinos, principalmente pela figura de Antônio Carlos Magalhães e tido como um inimigo voraz do lulismo/petismo, precisava se modernizar. Kassab vira um dos personagens mais importantes para defender uma nova identidade política e visual para o partido, fazendo com que ideologicamente em seu novo estatuto, o partido saísse do liberalismo econômico clássico e viesse mais ao centro e construiu a ponte entre a velha guarda pefelista e a nova geração que surgia. Foi responsável por fazer Rodrigo Maia, o primeiro presidente dessa nova força política que nascia, o Democratas.
Em 2008, Kassab se reelege prefeito pelo Democratas, garantindo a essa nova sigla a condução dos destinos de uma das máquinas públicas mais importantes do Brasil. No entanto, o projeto DEM não dá os resultados eleitorais e de imagem que se buscava. O partido diminuiu de tamanho, viu lideranças saírem e foi envolto em crises de corrupção como o mensalão do DEM, no Distrito Federal, que atingiu o governador Arruda. Importante contextualizar, que Lula estava em seu ápice de popularidade e preparando sua sucessão presidencial em cima da figura de Dilma Rousseff. Próximo desse projeto nacional, Kassab já não se sentia confortável na oposição e decide usar sua estrutura de prefeito de São Paulo para articular a criação do PSD – Partido Social Democrático.
O custo dessa operação do ponto de vista eleitoral foi alto. Kassab perdeu popularidade como prefeito, sendo acusado de largar a prefeitura para se dedicar exclusivamente aos seus interesses próprios como a criação do partido e terminou seu mandato apenas mais popular do que Celso Pitta. Já com o PSD montado em 2011, Kassab vira um aliado estratégico do PT, em nível nacional, dando governabilidade para Dilma Rousseff, mesmo fazendo enfrentamentos com o PT em níveis locais. Foi assim em 2012, quando apoiou José Serra para ser seu sucessor contra o vitorioso Fernando Haddad, do PT.
Essa posição de liberdade para composições não é bem aceita pela população, que espera muitas vezes da política um lado. No entanto, a lógica de construção de Kassab é pautada em valores vistos mais no parlamentarismo do que no presidencialismo. Os verdes alemães sempre apresentam, por exemplo, um projeto de alternativa para o país, entretanto, quando não são escolhidos, usam da sua força política para dar sustentabilidade e governabilidade aos eleitos, mesmo que tenham posições antagônicas a seus pensamentos. Busca-se a união por afinidade em alguns temas, superando os pontos que os separam.
Kassab tem feito isso com o PSD e chega a um ano da eleição, ocupando espaços importantes do governo federal, com ministros, que representam a capilaridade de seu partido, André de Paula, do Nordeste, Carlos Fávaro, do Centro-Oeste e Alexandre Silveira, do Sudeste, mas com duas possíveis forças para liderarem pelo menos em primeiro turno o seu projeto político: os governadores Ratinho Jr., do Paraná e Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul.
Com as brigas na federação União Progressista, tendo seus principais líderes envolvidos em polemicas e acusações de todos os lados, e que possui um candidato presidencial que não consegue sequer ter viabilidade politica interna, e com um MDB dividido em alas lulistas e bolsonaristas, o PSD parece ser o único garantidor de que em 2026 o centro poderá ter uma candidatura presidencial.
Perspicaz, Kassab entende que uma candidatura de seu partido jamais fechará portas para composições futuras. Quanto mais forte e respeitado, mais o PSD será procurado para compor. Kassab, sem mandato há mais de uma década, teria muita dificuldade em se eleger para qualquer cargo público, mas tem na sua capacidade de articulação e visão de longo alcance a alcunha de oráculo, que o faz ser ouvido e respeitado por lideranças da extrema direita à extrema esquerda.
