Governo Lula tem responsabilidade fiscal ‘à la carte’
Na terceira tentativa de tapar buracos causados pela falta de receita no Orçamento, o governo busca agora alternativas à MP alternativa ao aumento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), que o Congresso deixou caducar há duas semanas.
Na segunda-feira, 20, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, chegou a dizer que sairia naquele dia mesmo a “solução para o Orçamento” do ano que vem. Hoje é quinta-feira, 23, e ainda não temos os tais projetos que seriam enviados naquele dia mesmo ao Congresso Nacional.

Em suas falas, Haddad e outros integrantes da equipe econômica pregam a necessidade de aumentar a arrecadação e cortar despesas em prol do equilíbrio fiscal. Falam em cumprir a meta de resultado primário, o arcabouço, e todas as regras.
Acontece que a responsabilidade fiscal do governo Luiz Inácio Lula da Silva tem sido “à la carte”. Na hora de pressionar pela aprovação de aumento de impostos, ministros e líderes governistas pedem a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) no cardápio. Mas, como mostram reportagens recentes publicadas pela Broadcast, a prudência às vezes fica de lado, ao gosto do freguês.
A repórter Flávia Said contou que o governo ignorou alertas feitos pelo Ministério do Planejamento ao sancionar o projeto de lei que criou o programa “Agora Tem Especialistas”, que visa reduzir as filas do Sistema Único de Saúde (SUS). O programa, louvável, será uma das vitrines eleitorais de Lula na campanha de reeleição do ano que vem.
Documentos aos quais a Broadcast teve acesso mostraram que os técnicos recomendaram veto a despesas incluídas no programa durante a tramitação no Congresso Nacional por não haver previsão de receita, como prevê a LRF. A recomendação foi devidamente ignorada e o popular programa foi sancionado por Lula com pompa.
Outro ponto em que o governo resolveu ignorar seus técnicos foi em relação ao debate sobre mirar o cumprimento do piso ou do centro da meta fiscal. Lembrando: a meta de superávit primário que o governo precisa atingir no fim do ano é de déficit zero, podendo flutuar até 0,25% do PIB, para cima ou para baixo.
O tema se tornou uma briga que opõe equipe econômica e o Tribunal de Contas da União (TCU). O time de Haddad dizendo que basta ir gerindo os recursos ao longo do ano com o objetivo de entregar o piso da meta no fim do período. A corte de contas discorda e entende que é necessário congelar gastos visando entregar o centro da meta.
Mas, como também mostraram os repórteres Mateus Maia e Cícero Cotrim, técnicos da Secretaria de Orçamento Federal (SOF) do Ministério do Planejamento e Orçamento (MPO) defenderam que o governo deveria contingenciar despesas mirando o centro – e não o piso – da meta fiscal. A conclusão está em uma nota técnica, que foi, inclusive, utilizada na auditoria do TCU.
Importante ressaltar que também aqui há um importante impacto eleitoral. Seguir as recomendações dos técnicos do Planejamento e do TCU significaria congelar mais de R$ 30 bilhões do Orçamento no ano que vem. Ou seja, deixar Lula sem dinheiro em caixa no ano em que tentará a reeleição.
Para coroar o método “à la carte”, o Senado aprovou nesta quarta-feira, 22, um projeto que permite ao governo tirar das regras fiscais despesas com projetos de defesa nacional. São R$ 5 bilhões por ano. Mais um furo no arcabouço e na meta, em um projeto que teve relatoria e apoio do governo e em mais um episódio de responsabilidade fiscal, “pero no mucho”.
