31 de outubro de 2025
Politica

Por que Fachin esperou dois dias para falar sobre operação no Rio

Dois dias depois da megaoperação policial que resultou em mais de cem mortos no Rio de Janeiro, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, fez um pronunciamento rápido no plenário da Corte em solidariedade às famílias. Nesta quinta-feira, 30, recomendou que a Corte trate o assunto com discrição e sobriedade – duas palavras que marcam o estilo Fachin de comando.

“Em relação às circunstâncias que dizem respeito à tragédia ocorrida na cidade e no estado do Rio de Janeiro, todos os integrantes deste tribunal acompanham com a devida atenção, com a plena solidariedade aos familiares das vítimas e, ao mesmo tempo, com a discrição e sobriedade que são necessárias em momentos de tragédias graves como essa dedicar a elas a nossa atividade concreta e no lugar devido as melhores preocupações”, disse ao fim da sessão de hoje.

O presidente do STF, Edson Fachin, preferiu não se manifestar publicamente sobre a operação policial no Rio de Janeiro
O presidente do STF, Edson Fachin, preferiu não se manifestar publicamente sobre a operação policial no Rio de Janeiro

Para dar um caráter colegiado e institucional às decisões e manifestações do tribunal, Fachin não queria falar publicamente sobre a operação, mesmo abalado com a forma como ela foi conduzida, segundo contou uma pessoa próxima do ministro.

De acordo com uma fonte do tribunal, Fachin conversou ontem com os colegas sobre a conveniência de dar uma declaração em plenário sobre o assunto. A maioria dos ministros teria concordado com a posição dele de não fazer um pronunciamento. A atuação do STF seria vista nos próximos passos da chamada ADPF das favelas, o processo que restringiu as operações policiais no Rio em nome da segurança da população.

Na noite de terça-feira, 28, após interpretação de uma regra do Regimento Interno do STF, o ministro Alexandre de Moraes tornou-se relator provisório do processo. A relatoria permanente será do substituto de Luís Roberto Barroso no tribunal, que ainda não foi anunciado.

Moraes determinou que o governador do Rio, Cláudio Castro, explicasse a operação. Na estratégia de Fachin de retirar o STF dos holofotes sem deixar a Corte à margem das decisões importantes, o ideal seria mesmo não se manifestar, mas mostrar a posição do tribunal por meio de decisões judiciais.

Ontem, dia que Fachin completou um mês na presidência, ele se deparou com a dificuldade que terá para atingir uma de suas metas no cargo: despersonalizar a Corte. Ele não conseguiu conter os ministros mais falantes. Antes da sessão de ontem, Flávio Dino, que foi ministro da Justiça antes de chegar ao Supremo, comentou a operação em um evento.

“Por que que está esse caos lá? Porque as facções criminosas estão ultracapitalizadas, certo? E elas se capitalizam como? Só vendendo droga? Não, é dentro do mercado formal. Foi-se o tempo em que as facções criminosas no Brasil viviam apenas de mercado ilegal”, afirmou.

No plenário, voltou ao assunto. Chamou a operação de “circunstância tensa e trágica” e disse que o tribunal não poderia “legitimar o vale-tudo, com corpos estendidos e jogados no meio da mata”.

Gilmar Mendes também opinou ontem: “A toda hora vivemos situações de graves ações policiais que causam danos às pessoas ou mesmo a morte de várias pessoas, como acabamos de ver nesse lamentável episódio do Rio de Janeiro”.

Como os colegas quebraram o silêncio sobre a situação, não restou outra opção a Fachin a não ser dar também uma declaração sobre o Rio – ainda que com dois dias de atraso.

Hoje, por uma série de fatores, Moraes, Mendes e Dino personalizam a imagem da Corte. Eles costumam dar mais declarações públicas, tomam decisões judiciais em temas impactantes e têm interlocução com a política. Estão, aliás, no grupo de ministros com maior contato com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Fachin não costuma falar com a imprensa nem aparecer em eventos sociais. A intenção do ministro é mudar o perfil de comando do Supremo. Prefere que as declarações fiquem a cargo da política. Enquanto isso, as decisões judiciais falariam pelo STF. Mas iniciativas individuais dos ministros mostram quem nem todos estão na mesma página.

 

 

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