5 de novembro de 2025
Politica

PF diz que servidores da ANM movimentaram R$ 3 milhões e favoreceram indevidamente mineradora

BRASÍLIA E SÃO PAULO – A Polícia Federal identificou a existência de movimentações financeiras suspeitas no total de R$ 3 milhões nas contas de dois servidores da Agência Nacional de Mineração (ANM) e de seus familiares. Os recursos transitaram no mesmo período em que os funcionários atuaram para favorecer uma mineradora que explorou ilegalmente uma área tombada em Minas Gerais, na Serra do Curral.

PF cumpriu busca e apreensão na Agência Nacional de Mineração, em Brasília, para aoyrsr suspeitas de corrupção
PF cumpriu busca e apreensão na Agência Nacional de Mineração, em Brasília, para aoyrsr suspeitas de corrupção

Procurado pelo Estadão, o advogado Bruno Agostini, que atua na defesa dos dois, disse que se manifestará apenas nos autos do processo. Em seus depoimentos à PF, os servidores negaram o recebimento de pagamentos de mineradoras e afirmaram que suas ações se basearam em laudos técnicos.

Uma das suspeitas envolve o ex-gerente da ANM em Minas, Leandro César Ferreira de Carvalho, que foi preso no último mês de setembro na Operação Rejeito. A investigação foi enviada ao Supremo Tribunal Federal (STF) depois que a PF encontrou anotações com o nome dos senadores Carlos Viana (Podemos-MG) e Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

De acordo com a PF, a esposa de Leandro César recebeu depósitos de cerca de R$ 2 milhões em espécie em suas contas entre 2023 e 2025. Nesse período, ela pagou boletos em nome do marido. Em depoimento, ele disse usar dinheiro em espécie por “razões de segurança”. “Leandro confirmou que guarda dinheiro em espécie por razões de segurança e preferência pessoal, mencionando histórico de assalto e planejamento de viagem internacional”, diz trecho do seu termo de depoimento.

Ele negou ter atuado para favorecer a mineradora Empabra. “Reafirmou que nunca recebeu valores de empresas, que os atendimentos foram realizados conforme atribuições legais e que sua atuação sempre se pautou pela legalidade e boa-fé”, disse em seu depoimento.

A PF também apontou suspeitas sobre a atuação de outro servidor da ANM, Claudinei Oliveira Cruz. Segundo a investigação, ele movimentou R$ 1,1 milhão entre fevereiro de 2022 e fevereiro de 2023. Além disso, a esposa do servidor teria recebido R$ 121 mil em depósitos fracionados na sua conta.

Em seu depoimento, Claudinei negou o recebimento de valores de empresas do setor da mineração por meio de sua conta ou de sua esposa. “Questionado sobre possíveis irregularidades, como lavra fora da poligonal autorizada, ausência de estudos geotécnicos e degradação ambiental, o declarante sustentou que as ações foram pautadas em pareceres técnicos prévios da ANM, datados de 2019, e que não acompanhou continuamente a evolução da mina”, diz trecho do depoimento.

Para a Polícia Federal, essas movimentações financeiras apontam “indícios de possíveis contrapartidas ilícitas” recebidas pelos servidores.

Essas informações foram colhidas em um outro braço da investigação da PF sobre o esquema de mineração ilegal em Minas Gerais, que foi batizado de Operação Parcours, deflagrada em março deste ano, antes da Rejeito.

Como há conexão entre as duas investigações, a Parcours também foi enviada ao STF no início do mês.

Nessa apuração, a PF apontou que os dois servidores da ANM omitiram informações sobre a exploração ilegal de minério na Serra do Curral pela mineradora Empabra, o que permitiu que ela continuasse atuando ilegalmente.

“Fundadas suspeitas também recaem sobre as reiteradas condutas lesivas ao bem tombado por Leandro Cesar Ferreira de Carvalho e Claudinei Oliveira Cruz, servidores públicos da ANM, uma vez que manifestaram em processo da referida agência e nos processos judiciais relacionados à EMPABRA, de forma extraordinariamente contraditória aos fatos fartamente comprovados, expostos nos tópicos acima, omitindo a verdade e sonegando informações relevantes”, diz a PF.

A Empabra afirmou, em nota, que nada tem a dizer sobre as movimentações financeiras identificadas na conta de terceiros.

“É importante dizer que a Defesa desconhece qualquer referência ou documento que demonstre a existência de movimentações financeiras entre funcionários públicos, ou mesmo seus familiares, referentes a EMPABRA ou pessoas a ela relacionadas”, disse a empresa.

A investigação da Operação Rejeito também resultou na prisão de um diretor da ANM e de um ex-diretor do órgão.

Área ambientalmente devastada

A investigação diz que um grupo composto pelos empresários Lucas Kallas, Luis Fernando Franceschini e Bruno Luciano Henriques passou a comandar a exploração da Mina Corumi, dentro da Serra do Curral, por meio da empresa Empabra.

O local havia sido tombado e iria passar por um processo de recuperação ambiental exigido pelas autoridades públicas, o que envolvia a retirada de toneladas de finos de minério que estavam no local – o material havia sido extraído em décadas anteriores. Entretanto, a mineradora passou a explorar ilegalmente a extração de minério de ferro no local, de acordo com a PF.

“A empresa Empabra, após décadas explorando recursos minerais, quando instada pelos órgãos de controle a recuperar o meio ambiente degradado, utilizou de subterfúgios ilícitos para criar uma verdadeira mina profissional, em franco desrespeito aos órgãos de controle. Como consequência, após 16 (dezesseis) anos do PRAD (Plano de Recuperação Ambiental) firmado, a área encontra-se ambientalmente devastada”, diz a investigação.

De acordo com a PF, Leandro César atuou para induzir a Justiça Federal ao erro. A Prefeitura de Belo Horizonte interditou as atividades da Empabra na Mina Corumi em abril de 2024 após uma operação de fiscalização encontrar indícios de que havia exploração de minério no local.

A empresa contestou a decisão e recorreu à Justiça. No processo, a ANM, representada por Leandro, disse que a mineradora estava “apenas realizando a retirada das pilhas de minério previamente extraídas, conforme autorizado por ela e que não havia exploração não autorizada de minério no local”.

Após a manifestação, o juiz suspendeu a interdição determinada pela prefeitura e a Empabra voltou a operar na Mina Corumi.

Procurada, a defesa de Franceschini encaminhou posicionamento de seus advogados em nome da Empabra. “A EMPABRA relata que todas as atividades, emergenciais ou rotineiras, desenvolvidas na mina CORUMI sempre foram executadas com autorização dos órgãos competentes (federais, estaduais e municipais)”, informou a empresa.

“Por fim, a EMPABRA reafirma seu compromisso de concluir a recuperação ambiental da mina, com o fim de fechamento definitivo do empreendimento, seguindo o processo de obtenção de autorizações e sujeita às fiscalizações definidas em lei”, concluiu a empresa.

A defesa de Bruno Luciano disse que “como sócio indireto da Empabra no período de 2012 a 2017, Bruno Luciano não tomou parte da sua gestão, desconhecendo qualquer irregularidade no curso das atividades da companhia, circunstâncias que já foram devidamente esclarecidas no curso da investigação”.

Em nota, Lucas Kallas afirmou que seu nome foi “indevidamente incluído” na investigação. Leia a íntegra do posicionamento:

“O empresário Lucas Kallas esclarece que seu nome foi indevidamente incluído em documentos da investigação relacionada a fatos ocorridos entre 2023 e 2025 — oito anos após sua saída do quadro de investidores da Empabra, onde nunca exerceu função técnica, operacional ou de gestão.

De 2012 a 2017, quando vendeu sua participação minoritária na mineradora, as atividades da empresa foram regularmente fiscalizadas por órgãos federais, estaduais e municipais, sem apontamentos de irregularidades.

Diante da vinculação indevida e sem base material, o empresário adotou as medidas legais cabíveis para a retirada de seu nome da investigação e o reconhecimento formal de sua ausência de envolvimento nos fatos apurados.

Lucas Kallas ainda não se manifestou. No depoimento à polícia, ele afirmou que deixou a sociedade em 2017 e que até sua saída todas as operações estavam regulares, com fiscalização mensal do Ministério Público e da Secretaria de Meio Ambiente de Minas Gerais”.

 

 

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