Moratória da Soja: interferência de Dino em ação do Cade gera insegurança jurídica, diz presidente
Presidente do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), Gustavo Augusto avalia que a interferência do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), na investigação do órgão sobre a Moratória da Soja gera insegurança jurídica. Em entrevista à Coluna do Estadão, ele criticou em especial o fato de não haver prazo para o STF concluir o julgamento e, consequentemente, não saber quando a apuração da suspeita de cartel de empresários do setor poderá ser retomada.
“A gente não pode deixar os principais executivos de todas as empresas com uma pecha de que estão envolvidos em uma atividade ilícita ou criminosa sem dar um retorno disso”, afirmou o presidente do Cade.
No último dia 5, Dino determinou a suspensão nacional de todos os processos que discutem a Moratória da Soja na Justiça e no Cade. A liminar vale até o julgamento definitivo da ação no Supremo sobre a constitucionalidade de lei estadual relacionada a incentivos fiscais a empresas que integram a moratória.
“Parar uma investigação sem uma data de retorno vai gerar mais insegurança jurídica. Principalmente já com a quantidade de prova que já temos. Elas estão aqui, precisam ser analisadas”, declarou o presidente do Cade, que deve recorrer da decisão do magistrado.
Independentemente de o STF declarar a Moratória da Soja constitucional ou não, o órgão presidido por Gustavo Augusto investiga possíveis ilegalidades cometidas por empresários, acusados de formação de cartel, e já divulgou até mesmo uma lista de suspeitos.
Na avaliação dele, travar os processos até 1º de janeiro seria um prazo adequado. “Com a decisão do Supremo, ele (Flávio Dino) suspendeu a investigação até o julgamento final da Ação Direta de Constitucionalidade. Pode levar anos. A gente vai deixar essas pessoas acusadas de cartel por 4 anos, 5 anos?”, disse.
Entenda a moratória da soja
Nesta quarta-feira, 5, Dino determinou a suspensão nacional de todos os processos que discutem a validade da Moratória da Soja na Justiça e no Cade. A decisão atendeu a um pedido da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). O magistrado argumentou que há “litigiosidade exagerada” no caso. A liminar vale até o julgamento definitivo da ação, que é relatada no Supremo por Dino.
A Moratória da Soja é um pacto multissetorial firmado entre setor privado (tradings e compradores de grãos), organizações não governamentais e órgãos do governo, que prevê a não comercialização, o não financiamento ou a aquisição de soja produzida em áreas desmatadas na Amazônia após 22 de julho de 2008, data da aprovação do Código Florestal Brasileiro.
O pacto firmado em 2006 proíbe a compra de soja cultivada em áreas do bioma Amazônia desmatadas após julho de 2008, mesmo quando o desmatamento ocorrer dentro dos limites estabelecidos pelo Código Florestal, que permite a supressão de até 20% da vegetação em propriedades no bioma.
A moratória gera discordância há anos entre produtores e tradings. Sojicultores elevaram o tom contra o pacto no último ano, com apoio de parlamentares, pedindo a suspensão da prática pela indústria e alegando que o acordo fere o Código Florestal Brasileiro e que tem indícios de prática de cartel. As indústrias processadoras e exportadoras de soja, porém, negam tais práticas.
O acordo é alvo de processo administrativo no âmbito do Cade sob investigação de cartel. No fim de setembro, o colegiado decidiu suspender a moratória da soja preventivamente a partir de 1º janeiro de 2026, enquanto o processo é julgado no órgão antitruste. Já no STF tramitam quatro ações diretas de inconstitucionalidade contra leis estaduais que retiram incentivos de empresas signatárias da Moratória da Soja.

