12 de novembro de 2025
Politica

STJ reconhece união estável entre duas mulheres após 30 anos de relação

Uma recente decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou o compromisso do Judiciário brasileiro com a ampliação do conceito de família e com a efetivação dos direitos fundamentais ligados à dignidade e à igualdade. A Terceira Turma da Corte, sob relatoria da ministra Nancy Andrighi, reconheceu a existência de união estável entre duas mulheres que mantiveram um relacionamento por cerca de 30 anos no interior de Goiás, mesmo sem o tornar público.

Tradicionalmente, o artigo 1.723 do Código Civil estabelece que a união estável se caracteriza pela convivência pública, contínua, duradoura e com o objetivo de constituição de família. Em tese, a ausência de notoriedade da relação impediria seu reconhecimento jurídico. Entretanto, o STJ entendeu que, em determinadas circunstâncias sociais, a exigência de publicidade deve ser relativizada, quando o sigilo decorre da discriminação e intolerância ainda enfrentadas por casais homoafetivos.

Em seu voto, a ministra Nancy Andrighi destacou que a falta de publicidade não resultou de desinteresse em constituir família, mas sim de uma estratégia de autopreservação diante do contexto de preconceito. A relatora fundamentou sua decisão nos princípios da dignidade da pessoa humana, da isonomia e da liberdade individual, ressaltando que o direito à intimidade e à vida privada também integra o rol de garantias constitucionais que devem ser observadas na análise das relações afetivas.

O acórdão reforça que o direito de constituir família não pode depender da aceitação social nem exigir comportamentos públicos que exponham pessoas à violência simbólica ou à exclusão. Assim, o tribunal consolidou o entendimento de que a afetividade e a intenção de construir uma vida em comum prevalecem sobre a aparência social da relação.

Com a decisão, o casal passa a ter reconhecidos direitos patrimoniais e sucessórios, equiparando-se às demais uniões estáveis heteroafetivas. O precedente reafirma a jurisprudência inaugurada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011, que equiparou as uniões homoafetivas às heterossexuais, e reforça o papel do STJ na concretização da igualdade substancial no campo do Direito de Família.

Além de seu alcance jurídico, o julgamento carrega profundo significado social e simbólico, ao reconhecer a legitimidade de vínculos afetivos historicamente marginalizados. Trata-se de mais um passo relevante na proteção jurídica da diversidade familiar, valorizando a autonomia das pessoas na escolha de seus afetos e projetos de vida, sem que precisem se submeter a padrões tradicionais ou à exposição pública de sua intimidade.

A decisão evidencia que o Direito de Família contemporâneo caminha para acolher, com sensibilidade e realismo, as múltiplas formas de convivência que compõem a sociedade brasileira. O STJ reafirma, assim, que a função do Direito não é impor modelos, mas garantir liberdade e igualdade no exercício de constituir família.

 

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *