16 de novembro de 2025
Politica

Dois Albertos poetas

Dois grandes poetas, hoje praticamente esquecidos, se chamaram Alberto e foram contemporâneos. Ambos fundadores da Academia Brasileira de Letras e ambos ligados a Campinas.

Em 1915, no “Centro de Ciências, Letras e Artes” da Cidade das Andorinhas, Alberto de Oliveira, a convite de Alberto Faria, foi passar alguns dias em Campinas. Foi recebido entusiasticamente na instituição nascida em 1901, pelo entusiasmo de Cesar Bierrenbach.

Alberto Faria era um factótum do Centro. Redator da Revista, nesta acumulava todas as funções: escolhia a matéria, solicitava colaboração, recolhia fotografias para os clichês, revia, paginava. Enfim, “fazia” a Revista.

Hospedou em sua casa, na Praça Bento Quirino, o poeta do “Por amor de uma lágrima”. Os Albertos eram muito diferentes. Alberto de Oliveira já se levantava da cama com os bigodes frisados. Sempre vestido, engravatado, ereto. Faria, ao contrário, trabalhava em desalinho, em mangas de camisa a soprar as cinzas do cigarro que caiam sobre o papel. Sempre de camisa aberta e de chinelos.

Sua sala de trabalho, na qual o outro Alberto se instalava, estirado numa espreguiçadeira, era modelo de desordem. Livros espalhados nas mesas e cadeiras ou encaixados uns sobre os outros nas estantes. A mesa ficava com espaço reduzidíssimo para escrever.

Quando D.Marocas, sua esposa, procurava colocar ordem na bagunça, ele ficava danado. O ambiente, no entanto, era do agrado de seu hóspede. Enquanto um fazia pesquisas linguísticas, o outro se engolfava em poesias e sonhos e conservava o ar de gigante em transe. Como se estivesse a receber a comunicação inspiradora de espíritos e poetas amorosos que vagassem pelo espaço.

O olhar de Alberto de Oliveira era plácido, como que eternamente fatigado. Falava pausadamente, escandindo as sílabas, como se estivesse a recitar. Linguagem naturalmente pura, sem ser rebuscada. Ideias claras. O tom da conversa ameno e franco.

Contraste com o Faria, de olhos miúdos e vívidos, a cortar os diálogos com explosões bravias. Parava para gesticular e vibrava golpes orais de um hipotético porrete. A sessão solene no Centro de Ciências, Letras e Artes, foi bem concorrida. Contou com a presença de Amadeu Amaral e Roberto Moreira, dentre outras figuras ilustres à época.

Belos os tempos em que numa cidade do interior, boa parte da sociedade elegante e culta se congregasse em torno de poetas, oradores e declamadores para exaltação da arte em suas mais puras expansões.

Dessa expressiva visita a Campinas, Pelágio Lobo recolheu um texto em que Alberto de Oliveira explicou a escolha de Cláudio Manuel da Costa, como seu patrono na Academia Brasileira de Letras.

Ele afirmava que escolheu o poeta, por quem nutria pequeno entusiasmo, porque não havia outros para escolher. A explicação textual diz:

“Por que tomei a Cláudio por patrono na Academia? Residia eu em Petrópolis quando a ideia de uma Academia Brasileira de Letras vingou aqui no Rio. Se não fui de todo indiferente, não a propugnei, nada fiz por ela. Um dia recebo, não sei bem se do Rodrigo Otávio, uma carta em que se me comunicava haver eu sido aceito ou aclamado sócio da nova instituição. Pedia-se na carta que eu escolhesse o meu patrono entre três a ou quatro nomes que me enviavam, resto de uma relação de glórias nacionais, cujos principais e mais altos representantes – como o ouro melhor da Gupiara, que dá logo na vista – já haviam por outros sócios sido catados. Dos três ou quatro nomes, o melhor era o de Cláudio Manuel da Costa; os outros, não me lembro bem quais, lhe eram todos somenos. Não hesitei. Fiquei-me com o poeta do Ribeirão do Carmo, quando, se em tempo pudera escolher, o meu patrono fora Gonzaga ou Basílio da Gama, Gonçalves Dias ou Azevedo, Castro Alves ou Fagundes Varela”.

Tanto não era o patrono de sua preferência, que acrescentou: “Cláudio, como de Lamartine (aliás sem razão) disse Álvares de Azevedo: “É monótono…como a noite. Como a lua no mar e o som das ondas. De toda a sua obra salvam-se, a meu ver, a Fábula do Ribeirão e alguns sonetos da centúria que nos deixou, e estes, ainda assim, têm todos a mesma toada. Mas não sei se Você estará de acordo comigo: não o está João Ribeiro, para quem os sonetos deste poeta, em todas as literaturas latinas, só têm superiores nos de Petrarca e Camões”.

São dois Albertos que merecem reverência e precisam ter suas memórias recuperadas.

 

 

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