Conheça como é a cela para onde Bolsonaro deve ir na Papudinha; veja vídeo
BRASÍLIA – Condenado a 27 e três meses de prisão por liderar uma organização criminosa em uma tentativa de golpe de Estado, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) deve trocar em breve a prisão domiciliar na sua casa de aproximadamente 400 metros quadrados, no condomínio Solar de Brasília, por uma cela de cerca de 24 metros quadrados na carceragem do 19.º Batalhão da Polícia Militar do Distrito Federal (PMDF), a Papudinha.
O Estadão obteve informações exclusivas com uma autoridade ligada à PMDF sobre as especificações da possível cela em que Bolsonaro ficará preso, caso o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determine a sua prisão em regime fechado na Papudinha.
A reportagem também ouviu agentes públicos que atuam no sistema carcerário do Distrito Federal sobre as condições às quais o ex-presidente será submetido. Conforme apurado pelo Estadão, a Papudinha não possui celas individuais. Os locais acomodam geralmente mais de um detento em uma espécie de “alojamento”. Mas, por se tratar de um ex-presidente, é esperado que ele não divida a acomodação com outros presos.

O 19.º BPM conta atualmente com cerca de 50 detentos. Não está descartada a possibilidade de a carceragem, a cela ou alguma outra área do Batalhão passar por reformas para receber Bolsonaro. A unidade é administrada pela PMDF e não está submetida ao mesmo funcionamento imposto pela Secretaria de Administração Penitenciária do DF no Complexo da Papuda.
Procurada, a Secretaria não forneceu detalhes sobre a possível cela de Bolsonaro e afirmou que “as unidades penais têm celas distintas com dimensões distintas podendo comportar o mínimo de 3 custodiados”.
“De acordo com o princípio constitucional da impessoalidade, a Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape/DF) cumpre integralmente as determinações do Poder Judiciário e realiza a alocação dos custodiados com base em critérios técnicos, considerando aspectos como idade, fatores de vulnerabilidade e outras circunstâncias relevantes específicas de cada caso”, disse em nota.
‘Regalias’
A possível cela de Bolsonaro no Batalhão conta com uma “comodidade” disponível apenas aos presos idosos ou com necessidades especiais em todo o Complexo Penitenciário da Papuda: chuveiro com água quente.

São proibidos eletrodomésticos nas celas da Papuda, mas existe uma exceção: os presos podem ter uma televisão, desde que o item seja doado pelas famílias. A mesma regra é aplicada pela PMDF na Papudinha, que ainda permite um frigobar no local de detenção. Além da área de descanso e do banheiro com água quente, Bolsonaro ainda contará com uma lavanderia, um pequeno depósito e uma copa em seu alojamento.
O ex-presidente terá aproximadamente 12 metros quadrados de área para se locomover durante o banho de sol. Atualmente, nas demais unidades da Papuda, os presos têm direito a duas horas de banho de sol. A exceção são os idosos, cujo período pode ser estendido para até oito horas.
A regra, contudo, não se aplica necessariamente ao 19.º BPM, onde a administração é feita pela PM em vez da Secretaria de Administração Penitenciária. O Estadão questionou a PMDF, mas não teve resposta.
O defensor público Felipe Zucchini, que atua em processos envolvendo presos na Papuda, aponta que o modelo de visita e banho de sol aplicado no Complexo Penitenciário iguala todos os presos, independentemente do tipo pena, ao Regime Disciplinar Diferenciado (RDD) – a forma de reclusão mais rígida do sistema prisional, que é aplicada, por exemplo, a líderes de facções.
A regra das duas horas de banho de sol também vale para o tempo de visita, que só ocorre a cada 15 dias e com direito a apenas dois visitantes. A lei de execuções penais só estipula regras de visitação e banho de sol para os presos do RDD, o que permitiria ao governo do DF estender o tempo de convívio dos detentos que cumprem penas em outros regimes.
“Se na exceção da exceção (RDD) são duas horas, o raciocínio básico é que para os demais (presos) tem que ser mais que duas horas (de banho de sol). O regime prisional do Distrito Federal, com duas horas de banho de sol e visita, e apenas dois visitantes, está equiparado ao Regime Disciplinar Diferenciado. Isso significa que nas outras 22 horas é ociosidade em uma cela com oito camas e 20 pessoas”, afirmou.
Zucchini afirma, contudo, que Bolsonaro deve ter tratamento diferenciado por um conjunto de fatores, como ser um ex-presidente, idoso, com possíveis visitas de autoridades e ainda a possibilidade de ficar detido em uma unidade sob responsabilidade da PM, onde as regras podem variar. Ele cita, por exemplo, que o ex-presidente deve ter um colchão mais grosso, portanto mais confortável, do que os disponibilizados para os demais detentos na Papuda.
“Uma sala de estado maior no Batalhão talvez tenha peculiaridades diferentes. É possível que seja permitido o ingresso de outro tipo de alimentação e que conte com um frigobar, por exemplo. Como a regra do sistema é a escassez absoluta de espaço, de tempo de sol e de posse de itens de higiene e alimentação, existem inúmeras regalias, que podem parecer minucias, mas que, certamente, serão aplicadas ao ex-presidente”, afirmou.

Imagens áreas mostram que a Papudinha conta com um campo de futebol. O Estadão visitou os arredores do Batalhão na última sexta-feira, 14, e identificou uma área de futevôlei utilizada por policiais. Porém, não foi possível verificar se os presos utilizam essas estruturas, ou se são restritas aos agentes da PM.
A Papudinha ainda conta com um heliponto, que pode ser utilizado em casos de emergência envolvendo o ex-presidente. Um dos principais argumentos suscitados por aliados de Bolsonaro para evitar a sua prisão no Complexo Penitenciário são os recorrentes problemas de saúde que ele enfrenta em decorrência da facada que levou durante a eleição de 2018.
A vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão (PP), chegou a afirmar que a Papuda não teria condições de receber Bolsonaro. Já o governador Ibaneis Rocha (MDB) suavizou a declaração da aliada e disse que cumprirá a ordem de prender o ex-presidente na unidade federativa sem questionar a decisão da Justiça.
Todas as unidades do Complexo Penitenciário da Papuda contam com uma Unidade Básica de Saúde (UBS). O Estadão questionou a PMDF se a Papudinha também possui essa estrutura, mas não houve resposta.
O Centro de Internamento e Reeducação (CIR), onde fica a ala especial de idosos e pessoas com deficiência, conta com dois médicos à disposição. A Papudinha fica a menos de três minutos de distância do CIR, caso Bolsonaro necessite de atendimento emergencial. Além disso, a regra do sistema prisional autoriza os presos a se tratarem com especialistas, realizarem exames e serem tratados em caráter de emergência fora da prisão, quando necessário e mediante escolta.
O CIR foi citado com um dos possíveis destinos de Bolsonaro por contar com uma estrutura médica de atenção aos presos com comorbidades e idosos, mas a Papudinha tem sido apontada como o provável destino por possuir acomodações mais compatíveis com um ex-presidente. Um relatório produzido pela Defensoria Pública do Distrito Federal neste mês apontou más condições e superlotação na ala de idosos do CIR.
Prisão dos policiais
Em contrapartida, a Papudinha abriga menos presidiários e conta com a estrutura típica de um Batalhão da PM. O perfil dos detentos é formado majoritariamente por policiais e presos especiais.
O ex-ministro da Justiça Anderson Torres ficou preso preventivamente por quatros meses no Batalhão durante a fase de investigação da tentativa de golpe de Estado. Torres foi condenado a 24 anos de prisão na ação penal do golpe e pode retornar à carceragem.
O 19.º BPM também manteve presos integrantes da antiga cúpula da PMDF, que são suspeitos de omissão e conivência com os atos golpistas do 8 de Janeiro. Os oficiais estão soltos e aguardam julgamento pelo STF.
A Papudinha passou a ser apontada nos bastidores do STF como provável destino de Bolsonaro após a chefe de gabinete de Moraes e uma juíza da Vara de Execuções Penais do DF visitar o local e outras unidades do Complexo da Papuda na semana passada.
Pelas contas de criminalistas a ordem de prisão de Bolsonaro deve sair antes do fim do ano, levando em consideração os prazos processuais e a possibilidade de novos recursos serem apresentados, julgados e rejeitados pela Primeira Turma do STF.
