Austeridade fiscal, caminho obrigatório para ordem e progresso
Quando se aproximam as eleições, o brasileiro se pergunta se é possível ter um país melhor em condições de vida para todos os cidadãos. É o que se deseja. O problema é que, na hora de escolher o futuro presidente, o eleitor é bombardeado por uma avalanche de publicidade governamental e de promessas no horário eleitoral gratuito e, sem condições de fazer uma análise técnica da situação do país, acaba envolvido em narrativas e retóricas que, sabidamente, não refletem a realidade e, na maioria das vezes, não se realizarão. Esse cenário remete ao filósofo Sigmund Freud, segundo o qual “as massas nunca tiveram sede da verdade, elas querem ilusão e não vivem sem elas”.
Agora, a um ano do pleito, uma análise mais profunda da situação nacional revela que nas últimas décadas o país enveredou por um caminho muito perigoso. É inadmissível que os governos nacionais continuem querendo amenizar o fracasso de gestões transferindo a culpa a governos anteriores. Lembremos que desde 2000, o Brasil foi governado por diferentes gestores de ideologias diversas (2 anos de PSBD, 16,4 anos de PT, 2,3 anos de PMDB, e 4 anos de PL), e que seguem postulando o mesmo cargo nas próximas eleições.
O fato de o Brasil estar entre as 10 maiores economias do planeta não esconde que ainda enfrenta problemas gravíssimos, em especial o empobrecimento da maioria da população. Segundo o Banco Mundial, em 2010, a renda anual per capita do brasileiro era de US$ 11.391. Em 2024, fechou em US$ 10.234, perda de 10,15% em 14 anos. Nesse mesmo período o PIB mundial cresceu 64%, mostrando que o Brasil ficou para trás.
Pior ainda foi o resultado primário. Em 2022, o país registrou superávit primário de R$ 55 bilhões, o correspondente a 0,60% do PIB. Depois disso, a situação se inverteu. A partir de 2023, em todos os anos se registrou déficit primário: de R$ 229 bilhões naquele ano, ou 2,10% do PIB; de R$ 11 bilhões (0,10% do PIB) em 2024, e para 2025 a previsão é de déficit de R$ 75 bilhões (0,60% do PIB), sem contar as exclusões não recomendadas pela TCU, estimadas em outros R$90bilhões.
Sem controle de gastos, a dúvida pública da União só aumenta. Em 2022 (governo anterior), era de R$ 5,95 trilhões (59,8% do PIB) e agora deverá atingir o recorde de R$ 8,00 trilhões em 2025, equivalente a 65,0% do PIB, segundo as previsões.
Com a dívida pública da União crescendo à razão de R$ 1,0 trilhão/ano, o custo para a nação também se eleva muito em razão da consequente alta da taxa de juros. Os juros da dívida pública que consumiram R$ 700 bilhões em 2022, graças à taxa Selic de 11,75% de acordo com as estimativas, devem atingir R$ 1,12 trilhão em 2025, com a taxa Selic em 15,00% devido ao descontrole gerncial e teimosia em não cortar gastos. A conta sobra para o contribuinte. Nesses últimos três anos, a carga tributária passou de 30,3% do PIB em 2022, devendo fechar 2025 com algo próximo entre 34,0% e 34,5%, ou seja, elevação assustadora de 3,2 pontos percentuais. E querem mais.
Paradoxalmente, o brasileiro vem pagando mais impostos, porém não vê sua vida melhorar. As desigualdades permanecem. Mais de um terço da população (35,60%) tem renda bruta mensal de até um salário-mínimo (R$ 1.518,00), enquanto outros 21,60% dos brasileiros vivem com renda entre 1 e 2 salários-mínimos (de R$ 1.518,00 até R$ 3.036,00). E 22,80% da população ganham entre 2 e 2,3 salários-mínimos por mês, ou seja, entre R$ 3.036,00 e R$ 3.500,00. Em resumo, 90% dos brasileiros vivem com renda mensal bruta de até R$ 3.500,00.
Há ainda outros indicadores sociais mostrando que o Brasil não garante qualidade de vida de seu povo. Em 2022, o país ocupava a 73ª posição no mundo em Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e caiu para a 84ª colocação em 2024. No coeficiente de Gini, que mede a desigualdade na distribuição de renda, está em 53º lugar entre 58 países. No Índice de Retorno de Bem-Estar à Sociedade (IRBES), que analisa a relação entre a carga tributária e o retorno em qualidade de vida à população, o Brasil é o último colocado entre as 30 nações que compõem o ranking. Também é pífio o desempenho brasileiro na educação, a nível mundial. O Pisa, mostra que ficamos em 53º lugar em leitura; 65º em matemática, e 53º em ciências. No Índice de Percepção da Corrupção, o país ocupa hoje sua pior colocação na história: caiu 35 posições e está na 107ª posição. Quando o assunto é violência urbana, somos campeões mundiais em número absoluto de homicídios intencionais, um título vergonhoso.
A máquina pública é gigante e ineficiente. Consome anualmente cerca de R$ 1,7 trilhão por ano ou quase 13,5% do PIB (Estadão 07.09.25), mais do que a média (9,3%) dos 38 países da OCDE, mesmo possuindo quase metade do número de servidores. Esse paradoxo encontra explicação nos privilégios e penduricalhos nos salários. A remuneração média dos ocupantes do topo da pirâmide do funcionalismo do governo federal é 67% maior que a média paga pelo setor privado. E mesmo entre os poderes há diferenças: se comparado com o Executivo, o Poder Legislativo paga 63% a mais, e o Judiciário tem remuneração média 263% maior.
Para 2026, o orçamento da União prevê gastos de R$ 219,80 bilhões em programas sociais, incluindo Bolsa Família, BPC, Pé de Meia, auxílio-gás, farmácia popular e FIES. São programas importantes e necessários, porém sem porta de saída. Consomem 1,64% do PIB, mais do que a União investirá em educação (1,02% do PIB), em segurança pública (0,03%) e em habitação (0,04% do PIB). Para essas áreas essenciais, o Orçamento 2026 garantirá R$ 391,60 bilhões, ou 6,00% do total, ante 3,37% dos programas sociais.
Os investimentos poderiam ser bem maiores se o país não tivesse de pagar R$ 1,12 trilhão de juros sobre as dívidas públicas (7,76% do PIB), além de R$ 455 bilhões (3,40% do PIB) em déficits previdenciários. Nessa conta entram mais de R$ 600 bilhões (cerca de 5,00% do PIB) em gastos tributários da União – renúncias fiscais – , dinheiro que o governo deixa de arrecadar (muitas das vezes sem prazo de vigência nem decrescente ao longo do tempo). Por tudo isso, o valor para investimento previsto será de pífios R$ 83 bilhões, ou 0,62% do PIB. Pouco demais para um país que precisa de muito investimento em infraestrutura para atender minimamente sua população de 213,4 milhões de pessoas.
Embora venha aumentando a carga tributária e com previsão de arrecadação recorde em 2026 e 2027, amarga o maior déficit nominal e a mais alta dívida pública. Esses resultados reprovam todos os governos das últimas décadas, revelando que o país se ressente de um plano de metas e de maior controle dos privilégios e da corrupção, exigindo mais verdades e menos narrativas, e reclamando urgentemente maior austeridade fiscal.
A história registra, infelizmente, que, desde 1990, dos seis presidentes da República eleitos ou que depois assumiram o cargo, apenas dois (Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso) encerraram seus mandatos sem nenhum arranhão na esfera penal. Outros dois sofreram impeachment e os demais enfrentaram problemas na Justiça. No mesmo período, quatro ex-presidentes da Câmara dos Deputados foram presos, situação que mostra bem a deterioração ética dos políticos brasileiros.
O diagnóstico da situação nacional não é bom, face gestão inadequada e inexistência de plano de metas ou plano de governo. Há, porém, caminhos para que essa situação seja revertida e o país reencontre o rumo do desenvolvimento com justiça social. Para isso será necessário que o presidente cumpra as obrigações contidas no arcabouço fiscal já aprovado, especialmente a de acabar com o déficit e gerar superávit primário, o que facilitaria a redução da inflação – hoje entre 4,8% e 5,1% -, levando-a para perto do centro da meta de 3% ao ano.
Outro exemplo: se o governo reduzir em apenas 1,5 ponto percentual as despesas primárias, que já foram de 14,7% do PIB no governo de FHC e hoje ultrapassam 19% do PIB, o déficit primário de 0,60% do PIB passará a superávit de 0,90% do PIB. Atrelado à redução de privilégios, penduricalhos e desperdícios, isso contribuiria para a redução das despesas acima de R$ 180 bilhões/ano, sem traumas e sinalizando a investidores, analistas, instituições financeiras, empresários e à mídia, a disposição política de inaugurar uma nova era, a era da austeridade fiscal.
É possível economizar ainda mais. Basta o Executivo enviar ao Congresso Nacional um programa de redução dos gastos tributários da União, em cumprimento ao já determinado pela Emenda Constitucional nº 109, de 2021, que estabeleceu o teto de gastos em 2% do PIB, hoje cerca de R$ 250 bilhões/ano. Esse teto é ignorado e hoje gasta-se mais de 5,5% do PIB. Se houvesse a redução de apenas metade do estabelecido pela EC nº 109, o país economizaria mais R$ 220 bilhões por ano.
Além disso, com superávit de 4,0% a 4,5% do PIB (de R$ 500 a R$ 560 bilhões/ano), seria possível trazer a inflação para o centro da meta (3% ao ano) e, com isso, estabilizar a dívida pública da União (hoje de 70% do PIB) e do governo geral, de 80% do PIB, criando-se as condições para a redução da taxa real Selic de 9,5% a.a. para 6% a.a. descontada a inflação de 3% ou 3,5% (nominal de 15% para 11%). O resultado seria redução dos juros e economia de cerca de R$ 300 bilhões anuais. Com todas essas medidas, seria facilmente possível economizar mais de R$ 800 bilhões/ano. Não é pouca coisa.
Permitiria ampliar em 50% todos os programas sociais existentes, reforçar o SUS e ainda implantar o ensino obrigatório em tempo integral, capacitar e remunerar melhor os professores, melhorar a vigilância das fronteiras, portos e aeroportos para evitar a entrada de armas e drogas que alimentam as facções criminosas, e ainda realizar grandes investimentos em infraestrutura. Seria um passo fundamental para reduzir o custo Brasil e gerar valor adicionado em nossa pauta de comércio exterior.
É urgente o governo entender que praticar Austeridade Fiscal é o maior Programa Social em benefício da população, a maior e melhor fonte de recurso já disponível para manutenção e ampliação dos tão necessários Programas Sociais para correção das inaceitáveis e injustas desigualdades sociais e regionais do país, tudo sem nenhum aumento de tributo e sem culpar ninguém. Sem dar concretude a essas duas palavras, nunca atingiremos as outras duas que são o lema da nação: ordem e progresso.
