17 de dezembro de 2025
Politica

MPs pagam supersalários e 80% das mulheres ganham menos que homens no mesmo cargo, mostra estudo

BRASÍLIA – Pesquisa conduzida pela Plataforma Justas identificou que 80% das promotoras e procuradoras de Justiça em exercício no País trabalham em MPs que pagam menos às mulheres do que aos homens nos mesmos cargos. Os dados mostram que o tratamento desigual às mulheres no Brasil se dá até mesmo entre quem ganha supersalários.

A sede do Ministério Público Federal.
A sede do Ministério Público Federal.

A pesquisa levou em consideração a média anual de rendimento líquido pago a cada membro ativo do MPF e dos MPs. Embora ganhem menos, mulheres de 15 dos 21 MPs estaduais analisados receberam vencimentos médios mensais acima do teto remuneratório do funcionalismo público, de R$ 46 mil. O número foi semelhante no MPF, onde 15 das 27 unidades da federação pagaram mais do que o permitido.

Os dados coletados pelos pesquisadores mostram que cada procuradora recebeu em média R$ 4,4 mil líquidos a menos que um procurador no mesmo cargo em um ano. Um terço das mulheres que integram o MPF teve média anual de rendimento líquido inferior a dos procuradores.

Dos 27 MPs Estaduais, apenas 21 foram analisados, pois os Estado do Ceará, do Mato Grosso do Sul, do Mato Grosso, de Rondônia, de Santa Cataria e de Sergipe não fornecem bases salariais estruturadas para realização de pesquisa.

A metodologia desenvolvida pela plataforma Justa consistiu em analisar 113.112 registros de remuneração dos membros dos MPs ao longo de 2024. Foram excluídos cerca de 4% desses registros por se tratarem de lançamentos capazes de gerar distorções, como de membros que não contabilizaram 12 meses de trabalho e/ou que mudaram de cargo durante o ano de 2024

Os pesquisadores também coletaram as listagens nominais de membros ativos de cada MP no mês de outubro de 2025, utilizando a publicação mais atual de cada Portal da Transparência, para aferir os dados censitários de homens e mulheres. A partir desse levantamento, foram identificados 12.734 promotores e procuradores dos 27 MPs estaduais e do MPF.

Os pesquisadores excluíram da análise 62 (0,5%) pessoas cujo gênero não foi possível ser identificado, 75 (0,6%) sobre os quais não existia a informação do cargo, 56 (0,4%) sobre os quais não existia informação da data de ingresso no MP e outras.

No ramo federal, as mulheres são apenas 30% da força de trabalho, enquanto que nos Estados elas correspondem a 41% dos promotores e procuradores. Atualmente não chega a um terço a participação de mulheres nos cargos do MPF. Elas são 29% dos procuradores federais, 32% dos procuradores regionais da República e 29% dos subprocuradores-gerais.

O atual procurador-geral da República, Paulo Gonet, mantém a tradição quase intocada de ter homens na cúpula do MPF. Em 134 anos de instituição, apenas uma mulher, Raquel Dodge, foi procuradora-geral, num universo de 44 líderes.

No ramo estadual, as mulheres são procuradoras-gerais de justiça somente no Piauí, em Santa Catarina e no Amazonas. O único MP com percentual de promotoras e procuradoras superior ao número de mulheres da população brasileira (51,5% de acordo com o IBGE) é o Rio de Janeiro, onde elas são 57% da força de trabalho.

Em 13 dos 21 MPs estaduais analisados, mais da metade das mulheres são impactadas por diferença salariais. Em locais como Alagoas, Piauí e Paraíba, todas as promotoras e procuradoras tiveram média anual de rendimento líquido total inferior à média dos homens nos mesmos cargos.

A diferença de tratamento é ainda maior entre promotoras e procuradoras estaduais. Segundo a pesquisa, 61% das promotoras tiveram rendimento médio anual inferior ao dos promotores, enquanto que entre as procuradoras esse número caiu para 41% ao final de 2024.

Outra face da pesquisa é o quanto em média as mulheres deixam de ganhar em um ano. No MP do Rio Grande do Norte, por exemplo, elas recebem em média R$ 16 mil a menos que os homens, o que se converte em R$ 195 mil a menos no final do ano para exercer as mesmas funções.

A diretora-executiva do Justa, Luciana Zaffalon, afirma que a pesquisa não conseguiu identificar o fato gerador da disparidade entre homens e mulheres. Ela afirma que cabe aos MPs e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) explicar o que provoca o tratamento diferenciado a homens e mulheres. O Estadão questionou o CNMP, mas não obteve respostas.

“Não existe nenhum fator que isoladamente seja o responsável por essa discrepância. O que a gente observa é que a média do rendimento líquido está sendo afetada. O porquê disso é justamente o que a gente busca propor que os Ministérios Públicos e o CNMP passem a encarar como uma pesquisa que requer uma resposta robusta, rápidas e fatores de correção que nos permita superar essa diferença”, afirmou.

Zaffalon afirma que o objetivo da pesquisa foi superar o “vazio informacional” dos MPs, que não produz dados sobre a presença de mulheres nos seus quadros e a remuneração delas.

“Quando a gente olha para as carreiras da elite do funcionalismo público, estamos falando de carreiras que concentram muito poder e muito recurso, mas, ainda assim, as mulheres dentro dessas carreiras sofrem os revezes de como esse. Ainda é um elemento de exclusão e diferenciação dentro do Estado”, disse.

 

 

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