A Princesa Isabel, a Lei Áurea e o papa Leão XIII
SEGUNDO relatos históricos, JOÃO MAURÍCIO WANDERLEY, o Barão de Cotegipe (1815-1889), importante político conservador, que exerceu no Segundo Reinado (1840-1889) a Presidência do Conselho de Ministros (cargo idêntico ao de Primeiro-Ministro) entre 1885 e 1888, líder da elite escravocrata (ele via a abolição do trabalho servil como uma ameaça econômica ao Império e sustentava que o escravizado era simples objeto, mera propriedade dos fazendeiros e senhores de terras, e que abolir a escravidão sem qualquer indenização financeira constituiria grave ofensa ao direito adquirido de tais proprietários), teria mantido com a Princesa Isabel (1846-1921), então Regente do Império (Dom Pedro II estava em tratamento de diabetes na Europa), por ocasião da assinatura da Lei Áurea (em 13 de maio de 1888), o seguinte diálogo:
“Então, Senhor Barão? Não lhe dizia eu que a abolição seria feita com festas e flores? Ganhei ou não ganhei a partida?” (Princesa Isabel)
“Vossa Alteza ganhou o jogo, redimiu uma raça, mas perdeu o trono!” (Barão de Cotegipe)
Diante dessa observação, a Princesa Isabel replicou-a nos seguintes termos:
“Mil tronos eu tivesse, mil tronos eu daria para libertar os escravos”
O projeto de lei que se converteu na “Lei Áurea” (Lei imperial n. 3.353, de 13/05/1888) foi iniciativa do gabinete conservador liderado por João Alfredo Correia de Oliveira (1835-1919), abolicionista, então Presidente do Conselho de Ministros, que havia sucedido, nessa condição, ao Barão de Cotegipe, escravocrata!
Essa proposição legislativa foi amplamente aprovada, registrando-se poucos votos contrários tanto na Câmara dos Deputados (apenas 9 Deputados a ela se opuseram ) quanto no Senado do Império (somente 5 Senadores se opuseram, liderados pelo Barão de Cotegipe).
A tramitação de referido projeto de lei foi rápida! Apresentado em 08 de maio de 1888, foi aprovado por ampla maioria parlamentar pelas duas Casas que compunham a Assembleia Geral do império e sancionado pela Princesa Isabel em 13 de maio de 1888, no Paço Imperial, com grande manifestação popular!
SEGUNDO registro constante do Arquivo Nacional, “A Lei nº 3.353, que ficou conhecida como “Lei Áurea”, com apenas 2 (dois) artigos, extinguiu a escravidão em todo o território do Brasil. Foi assinada em 13 de maio de 1888 pela princesa imperial regente Isabel.
Feita em pergaminho, com 54cm de altura e 40cm de largura, a Lei Áurea é decorada com iluminuras e guardada em um estojo verde. Sua importância mundial foi reconhecida em 2008, quando foi declarada patrimônio documental da humanidade no Programa Memória do Mundo da Unesco.”
O Papa Leão XIII, durante seu Pontificado (1878-1903), em reconhecimento ao relevantíssimo ato da Princesa Isabel, concedeu-lhe, em 29 de maio de 1888, a “Rosa de Ouro” (que lhe foi entregue em outubro de 1888), uma das mais importantes e significativas condecorações pontifícias!
Eis o teor da carta que o Sumo Pontífice encaminhou à Princesa Isabel:
“Leão XIII, Papa
À muita amada em Cristo Filha Nossa, Saúde e Benção Apostólica.
As preclaras virtudes que adornam Tua pessoa e as brilhantes demonstrações de singular dedicação que Nos deste a Nós e a esta Sé Apostólica, pareceu-nos merecer sem dúvida um testemunho particular e insigne de Nosso Apreço e paternal afeto para contigo.
Para te apresentarmos porém esse testemunho, nenhuma oportunidade mais favorável podia dar-se, conforme entendemos, do que a atual. Com efeito, novo esplendor acaba de realçar ainda mais os Teus louvores por ocasião da Lei que aí foi recentemente decretada e por Tua Alteza Imperial sancionada, relativa àqueles que, achando-se nesse Império Brasileiro, sujeitos à condição servil, adquiriram em virtude da mesma lei a dignidade e os direitos de homens livres.
Assim, pois, muito amada em Cristo Filha Nossa, Nós te enviamos de mimo a Rosa de Ouro que, ao pé do altar, consagramos com a prece apostólica e os demais ritos sagrados, consoante a usança antiga de Nossos Predecessores.
Por esta razão investimos do caráter de Nosso Delegado apostólico ao amado Filho Francisco Spolverini, Nosso Prelado Doméstico e Protonotário Apostólico, que exerce as funções de Internúncio e de Enviado extraordinário Nosso e desta Santa Sé, junto ao muito amado em Cristo Filho Nosso Pedro II Imperador do Brasil, e na ausência dele junto à Tua Alteza Imperial, com o fim de levar-Te a referida Rosa e de exercer o honrosíssimo ministério de fazer-Te a tradição dela, observando as sagradas cerimônias do estilo.
Nesse mimo, porém, que Te ofertamos, é desejo Nosso que Tua Alteza Imperial não olhe para o preço do objeto e seu valor, mas atenda aos mais sagrados mistérios por ele significados. Assim é que nessa flor e no esplendor do ouro se manifesta Jesus Cristo e sua suprema Majestade. É Ele que se denomina a flor do campo e o lírio dos vales. Na fragrância da mesma flor se exibe um símbolo do bom odor de Cristo, que ao longe reacendem todos os que cuidadosamente imitam as suas virtudes.
Daí é impossível que o aspecto deste mimo não inflame cada vez mais o Teu zelo em respeitar a religião e em trilhar a vereda árdua, sim, mas esplêndida da virtude.
No entanto, implorando toda a sorte de prosperidades e venturas para Ti, e todo o Império Brasileiro, muito afetuosamente no Senhor outorgamos a Benção Apostólica a Ti, muito amada em Cristo Filha Nossa, e à Tua Imperial Família.
Dado em Roma, junto a São Pedro, sob o anel do Pescador, no dia 29 de maio do ano de 1888, IIº no Nosso Pontificado.”