CGU vê possível conflito de interesses de Rui Costa em obra com verbas do PAC, mas caso é arquivado
A Controladoria-Geral da União (CGU) constatou possíveis irregularidades do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa, no uso de verbas do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para obras nos municípios Ipiaú e Itagibá, no interior da Bahia. Na região, o chefe da pasta teria uma fazenda, mas registrada em nome de uma aliada local. A Comissão de Ética Pública (CEP) da Presidência, contudo, arquivou o processo. Procurado por meio de sua assessoria, o ministro preferiu não se manifestar.

Em agosto do ano passado, a CGU recebeu uma denúncia e identificou “situações que podem configurar, em tese, conflito de interesses ou infração ao Código de Conduta da Alta Administração”, mas não levou a investigação adiante devido à falta de competência legal do órgão para apurar fatos em que há ministros de Estado envolvidos. Por isso, remeteu a ação à CEP, que a engavetou.
O conselheiro Georghio Alessandro Tomelin, relator do processo, entendeu que a acusação ultrapassa as atribuições do colegiado, pois exigiria uma auditoria sobre atos administrativos. “A apuração dessas supostas infrações, por sua vez, exige aprofundadas investigações e exame de extenso material, incompatíveis com investigações na seara ética, em linha de atuação que extrapola a competência da CEP e adentra na seara da auditoria”, disse na decisão, acatada pelos demais integrantes da comissão.
Assim, o processo teve fim sem que qualquer um dos órgãos avaliasse os fatos descritos na denúncia. A existência da fazenda atribuída a Rui Costa foi revelada pelo UOL. Com área estimada em 100 hectares, a propriedade pertence à Mendonça Agropecuária, firma da prefeita de Ipiaú, Maria Mendonça (PP), aliada do ministro, que governou a Bahia por oito anos. Segundo o UOL, moradores da cidade dizem que a fazenda é de Rui Costa.
Foi nesse ponto em que a CEP se apoiou para não levar adiante a denúncia. O parecer de Tomelin justifica o arquivamento na suposta falta de aparato do grupo para realizar investigações que possam indicar se a propriedade de fato pertence a Rui Costa e se os critérios de alocação de recursos do PAC eram adequados.
Também alega vedação legal para apurar “ilícitos de cunho penal e de improbidade administrativa”.
“Nesse ponto, em relação à alegação de que o interessado seria o verdadeiro proprietário da fazenda mencionada na denúncia, supostamente registrada em nome de terceiros com vistas a ocultar desvio de finalidade na aplicação de verbas públicas, há de se destacar que a instância ética não possui um bureau de investigação nos moldes da autoridade policial para aferir a veracidade de tal fato”, disse.
Além dos investimentos federais, o governo da Bahia, hoje comandado pelo sucessor de Costa, Jerônimo Rodrigues (PT), vai bancar uma obra de pavimentação, já em curso, que dará acesso à fazenda ao custo de R$ 11 milhões.
Rui Costa entrou em conflito direto com Vinícius Marques de Carvalho, ministro que comanda a CGU, após acusar o órgão de ter sido leniente ao não avisar a cúpula do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva sobre os descontos associativos indevidos em benefícios do INSS.
O chefe da Casa Civil atualmente tenta atrair para si os holofotes e tem viajado para encontrar empresários e captar investimentos para o PAC.
Conforme mostrou o Estadão, a Comissão de Ética adota, sob Lula, critérios mais rígidos em processos aos quais integrantes da gestão de Jair Bolsonaro respondem. Em pelo menos um caso, aplicou sanções por acusações com possíveis repercussões penais antes mesmo de a Justiça se manifestar.
Em dezembro do ano passado, o deputado federal Ricardo Salles (PL-SP), ex-ministro do Meio Ambiente, sofreu punição de “censura ética”, uma reprimenda oficial que fica registrada como uma mancha no currículo de agentes públicos.
Segundo o colegiado, ele atuou em benefício de madeireiros ilegais quando esteve à frente da pasta. A denúncia está relacionada às investigações da operação “Akuanduba”, deflagrada em 2021 pela Polícia Federal e que tem o parlamentar como um dos alvos.
O ex-superintendente da PF no Amazonas Alexandre Saraiva foi afastado do cargo semanas antes do início da força-tarefa e acusou Salles de agir para obstruir as investigações, que miravam o comércio ilegal de madeira.
O processo ainda está em curso na Justiça Federal do Pará, onde o deputado responde por facilitar a prática de contrabando ou descaminho e por dificultar ação fiscalizadora do Poder Público em questões ambientais.