16 de agosto de 2025
Politica

O julgamento é de Bolsonaro – não da democracia

Em contextos altamente polarizados como o brasileiro, em que praticamente tudo é interpretado sob a lente das crenças e identidade de grupo, é difícil imaginar que decisões judiciais sejam percebidas como imparciais. Em geral, quando uma decisão da Judiça contraria as preferências de um cidadão, espera-se que sua confiança tanto no Judiciário quanto na democracia diminua.

A responsabilização judicial de líderes políticos, portanto, é frequentemente percebida como uma empreitada arriscada, com potencial de acirrar divisões e corroer a legitimidade institucional. Para os adversários do líder acusado, a decisão tende a ser lida como justa e necessária. Já seus apoiadores costumam interpretá-la como politicamente motivada.

Diversos estudos de opinião pública sustentam essa hipótese, ao mostrar que eleitores tendem a rejeitar instituições ou processos democráticos que atinjam seus líderes preferidos. Alguns pesquisadores chegaram a afirmar que “os eleitores são partidários antes de serem democratas”.

O ex-presidente Jair Bolsonaro ( PL) deixa a Polícia Federal em Brasília após prestar depoimento em um inquérito aberto a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) que vê indícios de que o ex-presidente tenha sido beneficiado diretamente pelas ações do filho.
O ex-presidente Jair Bolsonaro ( PL) deixa a Polícia Federal em Brasília após prestar depoimento em um inquérito aberto a pedido da Procuradoria-Geral da República (PGR) que vê indícios de que o ex-presidente tenha sido beneficiado diretamente pelas ações do filho.

No entanto, um estudo recente desafia essa suposição. Os pesquisadores Nicolás de la Cerda, Isabel Laterzo-Tingley e Ayelén Venegas conduziram um experimento natural com 2 mil eleitores brasileiros — incluindo apoiadores e não apoiadores de Jair Bolsonaro — durante o anúncio da denúncia da PGR contra o ex-presidente, em fevereiro de 2025. O timing do evento permitiu comparar atitudes em relação à democracia antes e depois do episódio.

Os resultados são reveladores: a responsabilização de Bolsonaro não reduziu o apoio à democracia entre seus eleitores. Mais do que isso, fortaleceu esse apoio entre aqueles que não votaram nele. Antes da acusação, 74% dos eleitores de Bolsonaro concordavam que a democracia é preferível a qualquer outra forma de governo, e 98% consideravam eleições livres e justas como importantes. Em resumo, não há evidência de que a denúncia tenham provocado reação antidemocrática em sua base eleitoral.

Como era de se esperar, entre os eleitores que não votaram em Bolsonaro, observou-se um aumento no apoio à democracia após o anúncio, especialmente em relação à valorização das eleições livres e justas e à importância de uma oposição forte.

A conclusão é clara: responsabilizar judicialmente líderes antidemocráticos não necessariamente polariza a sociedade. Pelo contrário, pode reforçar os valores democráticos. E, ao demonstrar que instituições são capazes de conter abusos sem comprometer sua legitimidade, também abre espaço para alternativas eleitorais à direita — livres do bolsonarismo — se tornem viáveis em 2026.

 

 

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