1 de julho de 2025
Politica

Delegado que ganha R$ 28 mil e fez ambulante perder a perna com um tiro pede justiça gratuita

O Ministério Público de Pernambuco denunciou o delegado da Polícia Civil Luiz Alberto Braga de Queiroz por tentativa de homicídio. Ele atirou no ambulante Emmanuel Pedro Apory, de 26 anos, que teve a perna direita amputada. O crime aconteceu em uma festa no Forte dos Remédios, em Fernando de Noronha, no mês passado.

O advogado Ricardo Queiroz, que representa o delegado, alega que “a conduta se amolda perfeitamente aos requisitos legais da legítima defesa” e que a repercussão do caso foi “desarrazoada”.

Com salário base de R$ 28 mil, Queiroz pediu gratuidade na Justiça, alegando que deixou de receber gratificações “de chefia ou adjunto de unidade”, auxílio combustível e programa de jornada extra remunerada.

A defesa questiona o afastamento cautelar do delegado por 120 dias. A medida, na avaliação do advogado Queiroz, visa “dar uma resposta política aos moradores da Ilha, sendo, portanto, ilegítimo e desproporcional”.

“É hostil e covarde afastar um delegado que tanto serviço prestou à sociedade pernambucana por questões meramente políticas, sem amparo legal”, protesta a defesa.

Luiz Alberto Braga de Queiroz atirou em Emmanuel Pedro Apory durante uma festa em Fernando de Noronha.
Luiz Alberto Braga de Queiroz atirou em Emmanuel Pedro Apory durante uma festa em Fernando de Noronha.

‘Olhares efusivos’

O tiro do delegado foi registrado por câmeras de segurança. As filmagens mostram o momento em que o delegado saca uma arma para Apory, na saída do banheiro, e o empurra em direção a uma parede. Em seguida, ele dá um tapa no peito do ambulante, que revida com outro tapa e um empurrão. Neste momento, Queiroz dispara e atinge a perna do rapaz, que tenta deixar o local com dificuldade.

O delegado se afastou em uma viatura da Polícia Civil, sem prestar socorro à vítima do seu disparo.

A discussão teria sido motivada por ciúme. Em depoimento, o delegado declarou que o ambulante estava “constrangendo” sua namorada, a nutricionista Thamires Cavalcanti de Lima Silva, “com olhares efusivos, insinuantes e desrespeitosos”.

Amigos do casal que estavam na festa disseram em depoimento à Polícia Civil que em nenhum momento presenciaram “qualquer situação anômala ou incômoda”. Também narraram que o ambulante estava distante do grupo.

Para o Ministério Público, a versão do delegado “não se sustenta quando confrontada com todas as declarações, fotos e filmagens”. O órgão concluiu que não há provas de “aproximação, assédio, incômodo, importunação, perturbação ou constrangimento”.

Thamires e Apory trocaram telefones dias antes, em uma academia. Uma amiga da nutricionista e o dono da academia presenciaram a interação. Os relatos são semelhantes. Os dois narraram que Thamires contou que estava com a agenda de consultas aberta e o ambulante manifestou interesse em marcar um atendimento.

Os investigadores encontraram apenas uma mensagem do ambulante para a nutricionista: “Oii. Emanuel aqui, da academia”.

O promotor de Justiça Fernando Cavalcanti Mattos pede a condenação do delegado por tentativa de homicídio com duas qualificadoras – motivo fútil (ciúmes) e recurso que dificultou a defesa da vítima (superioridade de armas). As qualificadoras são circunstâncias que agravam a pena em caso de condenação.

‘Truculento’

Segundo a denúncia, “sucumbindo a um infundado sentimento devastador de ciúme que não deixou transparecer”, o delegado tentou “intimidar e desmoralizar” o ambulante para provocar uma agressão e, com isso, poder justificar o ataque, que já estaria premeditado, como uma reação em legítima defesa.

O Ministério Público afirma ainda que Queiroz foi “truculento, violento e agressivo” por “estar muitíssimo bem armado”, embora o ambulante fosse um “jovem atlético e de maior estatura”.

“Cai por terra qualquer argumento de legítima defesa sucessiva posto que, no confronto, a disparidade dos meios de defesa sempre deixaram a vítima Emmanuel Apory em absoluta e flagrante desvantagem, tanto que devastadora para sua vida foi o resultado final da criminosa, premeditada, insana e homicida investida perpetrada pelo delegado”, diz um trecho da denúncia.

Além da condenação, o Ministério Público defende a perda definitiva do cargo do delegado ao final do processo. A Promotoria de Fernando de Noronha também pediu a suspensão e recolhimento de todas as suas armas.

Por se tratar de um crime doloso contra a vida, o julgamento ocorrerá no Tribunal do Júri.

Em nota, os advogados Anderson Flexa e Jethro Ferreira, que representam o ambulante, afirmaram que esperam um desfecho “o mais rápido possível”. “Não se trata apenas de uma agressão física, trata-se da destruição de um futuro.”

Os advogados disseram também que a denúncia “é a reafirmação de que nenhum cidadão está acima da lei, nem mesmo quem deveria garanti-la”.

Luiz Alberto Braga de Queiroz está afastado das funções desde que atirou em Apory por decisão da Secretaria de Defesa Social de Pernambuco.

O delegado entrou com uma ação para tentar retornar ao cargo. Ele alega que o afastamento foi “ato meramente político, sem qualquer conclusão definitiva ou indício robusto que justifique medida extrema de restrição funcional”.

 

 

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