1 de dezembro de 2025
Politica

O novo marco legal contra facções criminosas: avanços, riscos e os desafios constitucionais

O Brasil atravessa um momento decisivo na construção de instrumentos mais robustos para enfrentar facções criminosas. O conjunto formado pelo PL 5.582/2025, pela Lei 15.245/2025 (já em vigor) e pela chamada PEC da Segurança configura um novo arcabouço que pode reorganizar profundamente a atuação do Estado contra o crime organizado. Para compreender seu alcance real, é preciso observar o pacote como um sistema — com efeitos penais, constitucionais e institucionais interdependentes.

1. PL 5.582/2025: o eixo estruturante

Aprovado na Câmara dos Deputados e agora sob análise no Senado, o PL tornou-se o núcleo do novo modelo. Entre seus principais pontos:

a) Tipificação de “facção criminosa”

O projeto cria uma categoria jurídica própria, aplicável a organizações ultraviolentas, milícias privadas ou grupos paramilitares que controlam territórios ou exploram atividades ilícitas mediante coação. A inovação diferencia esses grupos da organização criminosa genérica da Lei 12.850/2013 e busca responder à escalada do domínio territorial exercido por facções.

b) Aumento de penas

Lideranças, financiadores, operadores logísticos, integrantes que utilizem armas de uso restrito ou que aliciem menores estarão sujeitos a punições mais severas — com possibilidade de aumento de pena de até dois terços em hipóteses qualificadas.

c) Restrições a benefícios penais

Em determinados casos, o patamar mínimo para progressão de regime sobe de 50% para 75%. Há limitações adicionais a regime semiaberto, liberdade condicional e outros benefícios, na tentativa de reduzir a influência de facções a partir do sistema prisional.

d) Estrangulamento financeiro

O PL aprofunda mecanismos de bloqueio, apreensão e destinação de bens, mirando diretamente a base econômica que sustenta o poder dessas organizações.

e) Integração de inteligência

A criação do Banco Nacional de Facções Criminosas, reunindo dados do sistema penitenciário, investigações e forças policiais, pretende fortalecer estratégias nacionais de inteligência e mitigar fragmentações históricas.

2. Lei 15.245/2025: efeitos já em curso

Enquanto o PL aguarda deliberação final, a Lei 15.245/2025 já promoveu alterações relevantes na Lei 12.850/2013, entre elas:

  • reforço à proteção de agentes ameaçados;
  • atualização das regras de colaboração premiada;
  • criminalização de novas formas de interferência em investigações;
  • fortalecimento das operações especiais.

Como o texto do PL ainda pode sofrer ajustes no Senado, será necessário compatibilizar esses dispositivos ao marco legal em construção.

3. PEC da Segurança: o alicerce constitucional

A Proposta de Emenda Constitucional busca enfrentar uma fragilidade histórica: a falta de coordenação entre União, Estados e Municípios. A aprovação da PEC poderá:

  • delimitar com mais nitidez as competências federativas;
  • instituir mecanismos permanentes de cooperação obrigatória;
  • oferecer sustentação constitucional a políticas nacionais de segurança.

Sem um eixo constitucional sólido, as ações permanecem fragmentadas — e facções, que dependem dessas brechas, tendem a se fortalecer.

4. Pontos de atenção

Apesar dos avanços, alguns aspectos merecem debate apurado:

  • Amplitude do conceito de facção – há risco de interpretações expansivas, que poderiam atingir grupos não equiparados às organizações que o projeto deseja combater.
  • Divergências políticas – governo federal e relatoria divergem sobre o grau de rigidez do modelo.
  • Direitos fundamentais – especialistas alertam para a necessidade de assegurar proporcionalidade das penas e individualização da responsabilidade penal.

5. Efeitos práticos esperados

Se mantido o escopo atual do PL, a expectativa é de:

  • punições mais rígidas a lideranças e financiadores;
  • maior capacidade estatal de bloquear fluxos financeiros ilícitos;
  • endurecimento das regras de progressão de regime;
  • avanço na integração de dados e inteligência policial.

6. O que acompanhar nas próximas semanas

Alguns pontos serão determinantes:

  • eventuais ajustes promovidos pelo Senado;
  • posicionamentos do Ministério Público, STF e STJ (inclusive eventuais ADIs);
  • tramitação da PEC da Segurança;
  • compatibilização entre a Lei 15.245/2025 e o futuro marco legal.

7. Conclusão: firmeza com equilíbrio constitucional

O país necessita de respostas mais firmes diante do avanço e da sofisticação das facções criminosas. Contudo, firmeza não se confunde com improvisação ou desrespeito à Constituição. Um marco eficaz deve combinar:

  • clareza jurídica,
  • integração federativa,
  • proporcionalidade penal,
  • inteligência institucional,
  • e salvaguarda dos direitos fundamentais.

A segurança pública exige rigor, mas não autoritarismo. O desafio é construir um sistema forte o suficiente para enfrentar o crime organizado e, ao mesmo tempo, fiel aos pilares constitucionais que sustentam o Estado Democrático de Direito.

 

 

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