Governo Lula acumula repasses a ONGs contestados em órgãos de controle; relembre
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acumula repasses a organizações não governamentais (ONGs) contestados em órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU). O governo Lula nega favorecimento ou vinculação política na distribuição dos recursos.
Desde o início do terceiro mandato de Lula, o governo federal assinou oito convênios com uma ONG ligada ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, berço político do petista. Somados, os contratos acumulam R$ 19,1 milhões. Embora sediada na Grande São Paulo, a ONG ligada ao PT recebeu R$ 15,8 milhões em um contrato para a remoção de lixo de uma terra yanomami em Roraima.

Vinte dias após o caso ser informado pelo Estadão, o TCU determinou a suspensão dos repasses. A ONG segue como beneficiária de outros contratos do governo federal, como um pagamento de R$ 400 mil, oriundos de emenda parlamentar, para que a entidade ministre um “curso de democracia” sobre a conjuntura política do País.
Além dos contratos com a ONG do sindicato do ABC, o Estadão mostrou que um programa do Ministério da Cultura beneficiou ONGs ligadas a assessores do próprio ministério e a militantes do PT. Em dois anos, serão repassados R$ 58,8 milhões para os “comitês de cultura”, como são chamados os núcleos criados pela iniciativa. Após a reportagem, o TCU passou a auditar os contratos dos comitês.
Além do contrato com a Unisol para a limpeza da terra yanomami, o Ministério do Trabalho e Emprego, do petista Luiz Marinho, realizou uma fiscalização que apontou para “várias irregularidades financeiras” cometidas em um contrato da pasta com uma ONG do Amazonas gerida por uma dirigente do PT. O termo era destinado à capacitação de jovens na região de Manaus. Além de não cumprir com o objeto contratado, o Ministério do Trabalho identificou problemas na prestação de contas realizada pela ONG.
Contrato para limpeza de terra yanomami
O Ministério do Trabalho contratou, por R$ 15,8 milhões, uma ONG ligada ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, a Unisol (Central de Cooperativas e Empreendimentos Solidários do Brasil), para realizar a limpeza de lixo de uma terra yanomami em Roraima.
O convênio com a entidade foi celebrado por meio de uma secretaria da pasta gerida por Gilberto Carvalho, ex-ministro de Lula e um dos mais importantes conselheiros do petista e do partido.

Dez ONGs se apresentaram para a disputa do convênio, das quais duas foram selecionadas. A entidade escolhida além da Unisol, a CEA (Centro de Estudos e Assessoria), é gerida por um militante do PT.
Em medida cautelar, o ministro do TCU Benjamin Zymler atendeu a um pedido do senador Jorge Seif (PL-SC) e suspendeu os repasses do governo federal à Unisol, além de bloquear as contas vinculadas ao convênio.
‘Curso de democracia’ após ‘golpe’ contra Dilma
Outros programas desenvolvidos pela Unisol com dinheiro público possuem afinidade com a agenda ideológica do PT. Um exemplo é uma ação celebrada em parceria com o Ministério dos Direitos Humanos, segundo a qual a entidade promoverá um “curso de democracia” sobre o cenário político do País após o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT).
Ao especificar o programa, a ONG chamou a deposição da petista de “golpe”. O “curso de democracia” possui previsão de formar 300 alunos por meio de seminários e debates.
‘Comitês de cultura’ beneficiam militantes do PT e funcionários do Ministério
O Programa Nacional de Comitês de Cultura (PNCC), da pasta gerida por Margareth Menezes, propõe a contratação de ONGs do setor cultural em todas as unidades da federação. Cabe às contratadas a promoção de atividades culturais nos territórios. A escolha das ONGs, no entanto, tem beneficiado aliados do governo federal.
No Distrito Federal, por exemplo, a ONG contemplada para liderar o comitê foi a Associação Artística Mapati. Até janeiro de 2023, o historiador Yuri Soares Franco era dirigente da organização. Ele renunciou às funções na ONG semanas antes de ser nomeado para um cargo no governo federal. Uma vez nomeado para o cargo no Ministério da Cultura, a pasta beneficiou a ONG da qual Franco foi dirigente com o contrato do comitê.
No Amazonas, a entidade escolhida foi o Instituto de Articulação de Juventude da Amazônia (Iaja). Após a celebração do convênio com a pasta, um dirigente do Iaja, o gestor público Ruan Octávio da Silva Rodrigues, foi nomeado para um cargo no ministério. O Iaja foi fundado em 2012 por Anne Moura, dirigente petista.
Após a reportagem, o TCU passou a auditar os contratos dos comitês de cultura. A Corte abriu cinco auditorias para fiscalizar o possível uso político e eleitoral da estrutura pública. As representações foram protocoladas por parlamentares da oposição ao governo no Congresso e tramitam sob a relatoria do ministro Augusto Nardes.
‘Irregularidades financeiras’ em contrato no Amazonas
O Iaja, escolhido como gestor do “comitê de cultura” do Amazonas, tem um contrato com o Ministério do Trabalho contestado por uma fiscalização da própria pasta de Luiz Marinho. Além de não cumprir com o objeto contratual, a entidade fez subcontratações com cláusulas genéricas, que impedem a fiscalização dos serviços prestados à ONG.

É o caso de uma subcontratação de R$ 614,6 mil por serviços de consultoria. Além da cotação acima do valor de mercado, a fiscalização atestou que o contrato foi celebrado de forma genérica, com a indicação de que os serviços prestados pela consultoria envolvem “organização acadêmica, materiais didáticos e recursos humanos”.
Também foram identificadas irregularidades na subcontratação de uma empresa para obras de “manutenção e adequação” na sede da ONG. Para comprovar as melhorias contratadas por R$ 35 mil, o Iaja só apresentou fotos. Segundo a fiscalização, o material apresentado foi insuficiente para acompanhar a execução do serviço prestado.
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